quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Reação do Brasil à espionagem foi 'emocional'

Reação do Brasil à espionagem foi 'emocional'

Autor(es): Jamil Chade
O Estado de S. Paulo - 06/12/2013
 

Para Tim Berners-Lee, criador da web, obrigar empresas a instalar servidores no País não é prático" e pode atrapalhar Marco Civil

O criador da internet, sir Tim Berners-Lee, critica a proposta do governo de Dilma Rousseff de obrigar empresas da web a instalar seus servidores no Brasil. Em uma coletiva de imprensa ontem em Genebra, o britânico foi categórico: "trata-se apenas de uma reação emocional do Brasil. Na prática, não terá qualquer impacto". Ele saiu em defesa de ativistas como Edward Snowden e outros que revelaram informações de como o governo americano está usando sua criação que cumpre 20 anos para monitorar milhões de pessoas. Mas insiste que a saída não é o que sugere o Brasil.
Em meados de novembro, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, garantiu que o governo não recuaria da proposta de obrigar as empresas de internet a instalar seus servidores no país, mesmo depois de críticas de especialistas do setor e da oposição de gigantes como Google ou Facebook.
A proposta foi incluída no texto do Marco Civil da internet, projeto de lei que vai regular a web no País, como forma de endurecer o controle do governo sobre a possibilidade de espionagem e garantir que empresas forneçam informações à Justiça brasileira, se solicitado.
"Isso não ajuda", disse o britânico, em resposta ao Estado. "Não é prático e não é a forma de resolver o problema da espionagem", declarou. "Essa estratégia não será eficiente e não vai parar a espionagem", insistiu.
Berners-Lee explicou que a opção do governo não vai funcionar por dois motivos. "O primeiro é técnico. Vai ser mais difícil operar redes sociais se cada um dos países exigir agora que servidores estejam em seus países. O segundo motivo é que a web tem como sua fortaleza justamente o fato de não ter uma nação. É mais que ser internacional. A web não tem nação e nacionalizar servidores não vai funcionar", declarou.
O britânico ainda alerta que a introdução desse debate no Brasil pode acabar retardando a aprovação do Marco Civil. "O que eu recomendo é retirar isso (exigência sobre servidores) e não enfraquecer o Marco, que é bom", disse. Há poucas semanas, a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, insistiu que os dados que circulam no Brasil não devem ser armazenados em outros países, "sem controle da nação brasileira".
Espionagem O britânico, apear de criticar a proposta brasileira., não deixou ainda de elogiar o Brasil por "liderar o debate no mundo" no que se refere à web e sua proteção.
Para ele, mais preocupante que a espionagem em si é o fato de que um sistema "praticamente sem controle" foi criado para essa atividade em massa.
"O que assusta não é que a espionagem está ocorrendo, mas que existe um sistema onde não existem responsáveis. É verdade que precisamos da polícia para patrulhar a internet. O cybercrime é um problema real. Mas o problema é que esse sistema de espionagem foi criado sem o conhecimento público e sem controles", alertou. "Não há ninguém por trás desse sistema garantindo que nossos valores sejam protegidos", insistiu.
O criador da web também saiu em defesa de pessoas como Snowden, que revelaram informações secretas de como esse sistema funcionava. "O sistema precisa de freios e controles. Eles não existem e o que existe fracassou. Vamos construir novos sistemas. Mas, quando eles fracassarem., precisaremos ainda de ativistas que sairão para salvar a sociedade", insistiu.
Para ele, Snowden precisa ter um "reconhecimento internacional" pelo que fez. "Talvez não um prêmio Nobel. Mac uma anistia e que existam países que declarem que tais pessoas serão protegidas se um dia o sistema fracassar de novo em nos proteger", defendeu.
Para Lembrar
Guarda de dados gera polêmica
A proposta de localizar a guarda de dados de brasileiros no País foi materializada pelo governo em texto reformulado do Marco Civil da Internet - projeto com princípios de uso da internet no Brasil que tem sua votação adiada desde o fim de 2012. Após os escândalos de espionagem, a pedido da presidente Dilma Rousseff o relator incluiu artigo no texto que estabelecia que a guarda de dados em data centers no Brasil seria implementada pelo Executivo, por meio de Decreto, deixando assim detalhes dessa regulamentação para outro momento. Ainda assim, a votação do projeto continuou a ser adiada na Câmara e acabou ficando para 2014. O relator Alessandro Molon (PT-RJ) chegou a considerar a possibilidade de o artigo ser votado em separado, mas disse que trabalharia pela sua aprovação.
O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, saiu em defesa do artigo dos data centers e disse que, embora soubesse que a medida não faria diminuir os riscos de vigilância, ao menos faria com que as empresas estrangeiras de internet cumprissem leis nacionais.

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