Nelson Mandela - 1918 2013 - Peregrinação à África do Sul
O Estado de S. Paulo - 09/12/2013 |
No
primeiro de sete dias de cerimônias oficiais de despedida a Nelson
Mandela, a África do Sul lotou templos de todas as religiões. O país se
prepara para receber 53 chefes de Estado e de governo que confirmaram
presença em uma jornada de homenagens que começarão com uma multidão de
80 mil pessoas reunidas no estádio Soccer City, amanhã, em Joanesburgo.
Cerimônia
tão concorrida na história recente só a do papa João Paulo II, que está
em processo de canonização pela Igreja Católica. No funeral do
Pontífice, em 2005, compareceram cinco reis, seis rainhas, 70
presidentes e primeiros-ministros e 2 milhões de fiéis.
Para
o último adeus a Mandela, que morreu aos 95 anos na quinta-feira por
complicações decorrentes de problemas pulmonares, a presidente Dilma
Rousseff levará uma comitiva de peso. Pela primeira vez em um evento
internacional, participarão todos os presidentes do Brasil vivos. Eles
haviam se encontrado na posse dos integrantes da Comissão da Verdade, em
maio de 2012, em Brasília. Embarcam juntos, hoje, ao meio-dia, no Rio.
Antes, Dilma participa de um evento com o ex-presidente americano Bill
Clinton, que também viaja para a África.
Enquanto
os líderes se preparam para se deslocar ao país que viveu quase cinco
décadas sob o regime oficial de segregação racial, o apartheid, e foi
redemocratizado em 1994, quando o partido de Mandela, o Congresso
Nacional Africano (CNA) foi eleito com 62% dos votos e desde então está
no poder, a África do Sul reza. Ontem, por cerca de três horas, uma
multidão orou e cantou em um dos locais mais simbólicos da resistência
ao apartheid, a igreja Regina Mundi, em Soweto. Na Regina Mundi, Mandela
é lembrado em um mural na entrada, ao lado de vidraças com buracos de
bala com quase 40 anos de idade, ainda preservados. Para lá correram
jovens perseguidos pela polícia na revolta do Soweto, em1976.
Com
apenas 7% da população, a Igreja Católica é uma das maiores e mais
organizadas da África do Sul, dada sua fragmentação religiosa.
Orgulhosamente
africana, a Regina Mundi faz suas missas em línguas tradicionais, como
zulu e soto, faladas pela maioria da população negra de Joanesburgo. O
inglês é secundário. Os vitrais têm imagens de negros ao lado de
passagens bíblicas, e o quadro principal ao lado do altar mostra Maria e
o menino Jesus de pele escura. A Bíblia exposta é em zulu. Em tom
messiânico, o padre Sebastian Rossouw referiu-se a Mandela como "luz
maior, a luz de Deus".
Mandela,
mesmo sem ser católico, tinha relação próxima com o local. Em 1997, já
como presidente, deixou-se filmar lá dançando com os braços dobrados
junto ao corpo, no que ficou popularizado como "Madiba dance". Foi na
Regina Mundi que ocorreram as audiências da Comissão de Verdade e
Reconciliação após o apartheid, modelo para todas as outras (inclusive a
brasileira).
Em
todo o país, catedrais, igrejas de bairro, sinagogas, mesquitas e
locais de culto religioso em geral prepararam algo diferente para a
tradicional celebração de domingo, o primeiro desde a morte de Mandela. O
atual presidente sul-africano, Jacob Zuma, compareceu a um serviço
metodista – a Igreja à qual a família Mandela pertence – na periferia de
Joanesburgo com Winnie, ex-mulher do também Prêmio Nobel da Paz de
1993.
–
Quando nossa luta (contra o apartheid) terminou, ele pregou e praticou a
reconciliação para que os que haviam se enfrentado se perdoassem e se
convertessem em uma nação – lembrou Zuma diante de mil pessoas.
A
confluência de líderes de Estado reunidos já gera polêmicas. Ontem, um
jornal conservador iraniano, o Kayhan, que representa a ala mais dura do
regime iraniano, advertiu neste domingo para a "armadilha" de uma
eventual participação do presidente Hassan Rouhani no funeral, onde o
líder do Irã poderia se encontrar com Barack Obama. Teerã ainda não
anunciou quem será o representante do país. Mandela fez duas visitas ao
Irã, em 1992 e 1999.
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