AÇÃO DA PETROBRAS SOFRE MAIOR QUEDA DESDE 2008
PETROBRAS DESABA 10,37% |
O Globo - 03/12/2013 |
Queda é a maior em 5 anos e empresa perde R$ 24 bi. Para governo, houve ataque especulativo
João Sorima Neto, Bruno Villas Bôas, Danilo Fariello, Ronaldo D"Ercole e Lucianne Carneiro
O
reajuste de gasolina e diesel abaixo do esperado e as incertezas quanto
à política de preços da Petrobras foram mal recebidos pelo mercado
financeiro. As ações da estatal tiveram a maior queda diária desde 12 de
novembro de 2008, auge da crise econômica internacional. Os papéis
ordinários (com voto) desabaram 10,37%, a R$ 16,42, a maior baixa do
pregão. As ações preferenciais recuaram 9,20%, a R$ 17,36, a segunda
maior desvalorização. Em apenas um dia, a Petrobras perdeu R$ 24 bilhões
em valor de mercado, o que a fez cair duas posições no ranking de
maiores petroleiras da Bloomberg, superada pela russa Gazprome pela
China Petroleum. O desempenho da petrolífera levou a Bovespa ao menor
patamar em três meses, com queda de 2,36%, aos 51.244 pontos.
Em
Nova York, os recibos de ações de papéis ordinários da petrolífera (as
ADRs) caíram 10,92%, a US$ 14,20, na maior queda desde de dezembro de
2008. Na avaliação do governo, a Petrobras passou o dia de ontem sob
ataque especulativo, com analistas traçando o pior cenário possível para
a empresa. Fontes do governo reconhecem, no entanto, que o comunicado
sobre a política de preços não foi claro. Nos bastidores, chegou-se a
discutir até mesmo a divulgação de um novo fato relevante, mais enfático
sobre a metodologia, mesmo sem a existência de gatilhos automáticos. A
hipótese foi descartada.
Em
vez disso, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, presidente do Conselho
de Administração da Petrobras, saiu em defesa da metodologia, o que não
conteve a queda das ações. De acordo com Mantega, de novembro de 2011
até agora, os preços de gasolina e diesel foram reajustados em cerca de
30%, enquanto a inflação acumulou alta de 15%. Em evento com
empresários, em São Paulo, ele lembrou que o governo usou a Contribuição
de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que incidia sobre os
combustíveis, para que parte do aumento não chegasse às bombas. Dessa
vez, o ministro calcula que o impacto para o consumidor seja de até 2,5%
nos postos.
—
O problema é que a inflação não pode ficar em segundo plano — disse
Mantega, após ouvir críticas de dirigentes do setor sucroalcooleiro
sobre o impacto negativo das intervenções para a competitividade do
etanol, como o presidente da Cosan, Rubens Ometto Silveira Mello, que
classificou os subsídios como "maléficos" para a economia e para a
Petrobras.
Mantega
acenou com a hipótese de retornar com a cobrança da Cide, mas somente
quando a inflação permitir. Perguntado sobre a queda das ações da
estatal, Mantega desconversou:
— Não vi o mercado hoje, as ações de empresas flutuam e não tenho nada a comentar sobre isso.
IMPACTO NO LUCRO E BALANÇO FRÁGIL
Na
avaliação de fontes do governo, a concessão de um novo reajuste no
preço dos combustíveis, no início de 2014, mostraria ao mercado que é
real a meta de "alcançar, em prazo compatível, a convergência dos preços
no Brasil com as referências internacionais" Segundo um interlocutor,
há um reconhecimento que o aumento anunciado na sexta-feira não elimina,
integralmente, a defasagem de preços. Além disso, no próximo ano, com o
impacto na inflação partindo do zero haverá uma margem maior para novo
reajuste, como ocorreu em janeiro deste ano.
Para
analistas de mercado, no entanto, a queda de braço entre Mantega e a
presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, travada desde o fim de
outubro — quando a estatal apresentou sua proposta de reajuste
automático — trouxe mais incerteza para a companhia. Ontem, após um
período de suposto afastamento, Graça e a presidente Dilma Rousseff se
abraçaram durante assinatura do contrato para exploração da área de
libra, no pré-sal.
—
Foram duas pancadas na empresa: um reajuste menor que o previsto e a
antecipação do modelo que, na verdade, não mudou nada do que já
tínhamos. Ficou a impressão que a Petrobras tentou forçar um modelo que
queria, ao divulgar o reajuste automático, e que o governo veio com um
"espera lá, quem manda sou eu" — afirma Marcelo Varejão, analista da
Socopa Corretora.
Em
relatório, o Credit Suisse rebaixou a recomendação para os papéis da
empresa para underperform (abaixo da média do mercado). "Aumentos
tímidos nos preços e uma metodologia de precificação opaca deterioram a
percepção sobre a governança corporativa, enfraquecem a posição de uma
equipe de gestão forte e técnica, têm um significativo impacto nos
lucros e deixam o balanço financeiro extremamente frágil em meio a um
2014 cheio de incertezas" escreveram os analistas Vinicius Canheu e
Andre Sobreira.
—
Esse controle oficial de preços não faz sentido, subsidiar a gasolina
não tem sentido. O governo precisa ter coragem de resolver e não é a
conta-gotas — disse Carlos Langoni, diretor do Centro de Economia
Mundial da Fundação Getúlio Vargas e ex-presidente do Banco Central, em
seminário no Rio.
Para
Marcus Sequeira, analista do Deutsche Bank, com a rejeição do governo à
proposta da Petrobras para a política de preços, "a produção doméstica
de petróleo deve ser agora o principal fator para o comportamento das
ações nos próximos meses".
A
queda das ações ordinárias se intensificou na fase final do pregão.
Segundo a BM&FBovespa, os papéis não entraram em leilão (prática
comum para estabilizar o preço quando uma ação desaba). A ação atingiu a
mínima do dia quando a Bolsa já estava no chamado "call de fechamento".
EFEITO SOBRE A AVALIAÇÃO DA EMPRESA
A
polêmica em tomo da política de preços trouxe de volta discussões sobre
o rating (nota de crédito) da Petrobras. A perspectiva da nota da
estatal está negativa na avaliação da agência de classificação de risco
Standard & Poor"s (S&P), que a classifica como grau de
investimento. A nota da estatal acompanha a avaliação dos títulos
soberanos do Brasil, que estão em perspectiva negativa desde junho. Os
títulos de longo prazo da Petrobras em moeda estrangeira na agência são
classificados como "BBB" o mesmo do Brasil, degrau considerado grau de
investimento.
A
presidente da S&P, Regina Nunes, afirmou ontem que a empresa teria
apresentado um desempenho melhor sem a interferência do governo nos
preços dos combustíveis. Mas ponderou que a estatal também tem
benefícios por ter o governo como controlador, como o apoio a seu
programa de investimentos.
—
Claramente a Petrobras teria uma maior margem se tivesse repassado os
preços, mas por outro lado ela tem uma série de apoios do governo para
fazer seus investimentos — resumiu.
No mercado de câmbio, o dólar comercial fechou em alta de 0,77%, a R$ 2,355, a maior cotação em três meses.
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