BRASILEIRO NUNCA DEVEU TANTO AOS BANCOS: R$ 1,2 TRILHÃO
DÍVIDA DE BRASILEIRO NOS BANCOS É DE R$ 1,2 TRI |
Correio Braziliense - 02/12/2013 |
Mesmo se fosse usado integralmente para
pagar as dívidas, o 13º salário não seria suficiente. Os brasileiros
chegam ao fim de 2013 devendo — somente aos bancos — um total de pouco
mais de R$ 1,2 trilhão, o maior saldo da história, segundo dados do
Banco Central (BC). O montante equivale a oito vezes a quantia que será
injetada na economia brasileira neste ano com o benefício natalino, cuja
primeira parcela caiu na conta dos trabalhadores na última sexta-feira.
Ceia, presentes e viagens poderão até ser mantidos, mas o aperto nunca
foi tão grande.
A
situação das finanças domésticas se complica porque, com base nos
números do BC sobre as operações de crédito, os consumidores têm
mergulhado nas dívidas mais caras do mercado. O saldo devedor do cheque
especial, por exemplo, é o maior já registrado, com alta acumulada de
20,9% no ano. Os débitos com o cartão de crédito na modalidade rotativa —
quando se quita apenas o valor mínimo da fatura — cresceram 6,2% nos 10
primeiros meses, mais do que os pagamentos à vista com cartão, nos
quais não incidem juros, com alta de 5,1%.
O
ano não foi fácil para os brasileiros. A inflação se manteve
persistente e bem acima do centro da meta do governo, de 4,5%. A cada
ida ao supermercado, um novo espanto diante dos reajustes, sempre
minimizados pela equipe econômica. Não bastasse, a expectativa para o
início de 2014 é de mais alta dos preços, além dos gastos extras do
período, como pagamento de impostos e matrícula escolar. A escalada da
taxa básica de juros — que na última semana chegou a 10% ao ano,
voltando à casa dos dois dígitos — encarecerá o crédito e poderá
acelerar o inchaço das dívidas.
A
soma do que os brasileiros devem às instituições financeiras
representa, hoje, mais de um quarto (25,8%) do Produto Interno Bruto
(PIB), também a maior proporção já identificada pelo BC. "Para diminuir o
peso das dívidas, o consumidor foi obrigado a ficar mais seletivo e
cuidadoso. Quem conseguiu limpar o nome não vai querer virar o ano no
vermelho de novo", acredita o economista da Confederação Nacional do
Comércio (CNC) Fabio Bentes.
Nos
últimos anos, com a ausência de projetos estruturantes no país, o
consumo das famílias foi o que garantiu o crescimento econômico. O
aumento da renda e do nível de emprego da população fizeram o governo
estimular a fartura do crédito e, consequentemente, uma corrida às
compras. A euforia deu resultado. Mas, no entender de analistas, esse
modelo de desenvolvimento — que acabou abafando a falta de projetos
sólidos — se esgotou.
Superação
Com o poder de compra estrangulado pela inflação e pelas dívidas, muitos brasileiros que iniciaram o ano na lista de maus pagadores deram a volta por cima e dizem ter aprendido a lição. Decidiram neste fim de 2013 não só diminuir o consumo, mas também estão mais dispostos a poupar. "Parece que há, de fato, uma maior conscientização. Mas não basta. As famílias precisam de uma "faxina financeira" e mudar hábitos", pondera o educador financeiro Reinaldo Domingos.
O
auxiliar de cozinha Sidney Araújo da Silva, 34 anos, passou vários
Natais "comendo e se divertindo na casa dos outros", como relembra ele.
As dívidas com cartão de crédito e celular torravam o dinheiro da ceia.
Desta vez, metade do 13º está reservado para garantir a festa da
família, mesmo sem muita pompa. "Quem quiser esbanjar que esbanje. Vou
cuidar das minhas contas para entrar em 2014 tranquilo", afirma.
A
outra metade do salário extra, acrescenta Silva, será usada para ajudar
a pagar as parcelas de uma televisão de plasma comprada recentemente —
dividida em 12 vezes — e do novo aparelho de celular, que deve ser
quitado em abril do ano que vem. Sem revelar para ninguém o quanto tem
guardado, o morador de Planaltina defende a importância de poupar. "Se
depender só do salário, o cara fica enrolado. Se o patrão atrasar o
pagamento é problema. E se os bancos entrarem em greve?", provoca.
O
medo de afundar em dívidas levou muitos brasileiros a abrirem mão de
extravagâncias. É por isso, acreditam analistas, que, apesar do
endividamento recorde das famílias — 63,2%, de acordo com levantamento
mais recente da CNC —, a inadimplência tem recuado. "As pessoas gastam o
que não têm. Estou cansado de pegar passageiro com salário de R$ 20 mil
por mês, mas que quer viajar todo fim de semana, comprar tudo, e aí
depois reclama", opina o taxista João Rodrigues, 64.
A
casa própria segue como sonho e prioridade para a maioria dos
brasileiros. A aposentada Ana Carvalho, 72, não se incomodou em
comprometer um terço da renda com um financiamento imobiliário iniciado
neste ano. Para compensar o arrocho programado, ela optará por presentes
mais baratos para os filhos e netos no Natal. "Vou gastar menos, para
juntar mais dinheiro e antecipar parcelas. Quero usar até o 13º para
ajudar a diminuir o montante."
Esgotamento
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgará amanhã o resultado do PIB do terceiro trimestre. Os números voltarão a mostrar que o consumo deixou de ser a principal mola propulsora da economia brasileira. O mercado aposta em recessão do indicador em 0,3%. "O consumo estagnou mesmo, chegou ao seu esgotamento. É algo que preocupa. Agora, ele terá de dar lugar à poupança", comenta o ex-diretor do BC e presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal, Carlos Eduardo de Freitas. |
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