segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Papa aprova decreto que pode antecipar escolha de seu sucessor

Papa aprova decreto que pode antecipar escolha de seu sucessor

25/02/2013

Thais Leitão*
Repórter da Agência Brasil

  O papa Bento XVI aprovou hoje (25) um decreto que possibilita a antecipação do conclave que vai eleger seu sucessor. Segundo informou o Vaticano, no documento, o pontífice lembra que o prazo normal para a realização de um conclave é no mínimo 15 dias e no máximo 20, após o início da Sé vacante, período que começa com a morte ou renúncia de um pontífice. Com isso, o processo de escolha do novo papa deveria começar entre 15 e 20 de março, como informou o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, no dia 13 deste mês.
"Deixo aos cardeais a possibilidade de antecipar o início do conclave, uma vez que todos estejam presente, ou o adiamento, em caso de motivos graves, da eleição por alguns dias", disse o papa no decreto divulgado hoje.
O papa Bento XVI anunciou no último dia 11 que deixará o pontificado na próxima quinta-feira (28) em razão da idade avançada.
Devem participar do conclave que vai eleger o novo papa 115 cardeais. Hoje (25), o cardeal Keith O'Brien, homem mais importante na hierarquia da Igreja Católica na Grã-Bretanha, apresentou seu pedido de renúncia, após de ter seu nome envolvido em um escândalo ocorrido há três décadas.
O alemão Joseph Ratzinger, 85 anos, assumiu o comando da Igreja Católica em 19 de abril de 2005, após a morte de João Paulo II. Aos 78 anos, Ratzinger foi um dos cardeais mais idosos a ser eleito papa e sua renúncia é a primeira de um pontífice na era moderna. O último chefe da Igreja Católica a renunciar foi Gregório XII, no século 15 (1406-1415).

*Com informações da agência pública de notícias de Portugal, Lusa // Edição: Juliana Andrade

Raúl Castro é reeleito e confirma transição política em Cuba

Raúl Castro é reeleito e confirma transição política em Cuba

25/02/2013 
 
Leandra Felipe
Correspondente da Agência Brasil/EBC

Bogotá - O líder cubano, Raúl Castro, teve seu nome ratificado nesse domingo (24) como presidente pela oitava legislatura da Assembleia Nacional do Poder Popular de Cuba. Reeleito para mais cinco anos, ele confirmou, em discurso aos parlamentares, que o país passará por uma transição política. Aos 81 anos, Castro disse que deve deixar o poder ao terminar o segundo mandato.
Além da promessa de deixar o poder após esse período, o presidente reeleito informou que os mandatos de autoridades cubanas terão limite até dez anos. Ele disse que o novo mandato não será utilizado para “restaurar o capitalismo em Cuba”, mas reconheceu que o país precisa de mudanças para consertar erros cometidos no passado.
“Temos o dever de corrigir os erros que cometemos nessas cinco décadas de construção do socialismo em Cuba”. Raúl Castro acrescentou que os “ajustes” terão limites. O planejamento, e não o mercado, será o traço definitivo da economia e não se permitirá a concentração da propriedade. Mais claro que isso, nem água”, ressaltou o líder cubano.
Ele disse ainda que seu governo continuará a implementar gradualmente as mudanças iniciadas no plano econômico, político e social. Segundo Castro, créditos e subsídios serão eliminados e as funções partidárias (do Partido Comunista) e de governo serão separadas. "O partido deve dirigir e controlar, e não interferir nas atividades de governo em qualquer nível", comentou. O tema será discutido na Conferência Nacional do Partido Comunista no ano que vem.
Diante dos parlamentares, Raúl Castro também falou sobre a importância da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e dos possíveis obstáculos para a sua consolidação. “Sabemos que a Celac enfrentará obstáculos derivados da injusta e insustentável ordem internacional. Temos que buscar a unidade dentro da diversidade”, destacou.
Cuba assumiu a presidência da Celac no último mês de janeiro, durante a Cúpula da Comunidade em Santigo, no Chile. A ilha sediará e organizará a próxima reunião da Celac em 2014.
A Assembleia Nacional também elegeu Miguel Díaz Canel, 53 anos, como vice-presidente do Conselho de Estado e do Conselho de Ministros. Com perfil mais jovem, ele é uma aposta de analistas políticos como “possível” sucessor de Castro.
Raúl Castro foi eleito pelos parlamentares cubanos pela primeira vez em 2008, para substituir o irmão Fidel, que presidiu a ilha por quatro décadas. A eleição também foi marcada pela presença de Fidel no Congresso. Aos 86 anos, o líder raramente é visto em público e não aparecia diante dos parlamentares desde 2006, quando passou o poder ao irmão de forma temporária.

Com informações da TV Estatal Telesur e da BBC Brasil
Edição: Graça Adjuto

Cuba abre espaço para a era pós-Castro

Cuba abre espaço para a era pós-Castro

Passagem de bastão em Cuba
Autor(es): Bernardo Barbosa
O Globo - 25/02/2013
 
Reeleito, Raúl Castro promete espaço para nova geração e garante que sai em 2018

Havana "Revolução é sentido do momento histórico, é mudar tudo o que deve ser mudado." A frase cunhada por Fidel Castro em 1º de maio de 2000 foi usada por seu irmão, Raúl Castro, para encerrar um discurso no qual deixou claro que Cuba será comandada por uma nova geração quando seu segundo e último mandato de cinco anos, para o qual foi reeleito ontem pelo Parlamento local, chegar ao fim em 2018. Diante dos irmãos Castro, Miguel Díaz-Canel, de 52 anos, foi escolhido como primeiro vice-presidente do Conselho de Ministros e desponta como o nome mais forte desta Cuba que, pela primeira vez desde a revolução que instituiu o comunismo na ilha, em 1959, será liderada por nomes que não pegaram em armas - ou mesmo nascidos depois da revolução, como Díaz-Canel.
- Este será o último mandato (...). Esta decisão (a escolha de Díaz-Canel) representa um passo definitivo na configuração da direção futura do país, mediante a transferência paulatina e ordenada dos principais cargos às novas gerações - disse Raúl no Parlamento. - Díaz-Canel não é um forasteiro.
Raúl fez questão de citar ponto a ponto os mais de 30 anos de trajetória do novo primeiro vice-presidente no Partido Comunista de Cuba (PCC). Até ontem, o engenheiro eletrônico Díaz-Canel era um dos cinco vice-presidentes cubanos, posição que assumiu em março de 2012. Antes, em 2009, foi nomeado ministro da Educação Superior. Sua trajetória no PCC teve início em 1993, e em 2003 passou a fazer parte da direção da legenda a convite do próprio Raúl. O novo número 2 do regime cubano também foi o enviado de Havana à aliada Venezuela para a simbólica posse do quarto mandato de Hugo Chávez no dia 10 de janeiro.
"Sociedade menos igualitária, mas mais justa"
Díaz-Canel substitui um dos revolucionários originais e um dos principais nomes do comunismo cubano, José Ramón Machado Ventura, 82 anos, que será agora vice-presidente. Visto com frequência como o braço-direito de Raúl Castro, Machado Ventura é um ideólogo comunista linha-dura que ajudou a fundar o PCC. Segundo o presidente cubano, o ex-primeiro vice-presidente teve a iniciativa de oferecer seu cargo "em favor da promoção da nova geração".
Outra escolha que indica mudanças no castrismo é a de Esteban Lazo, de 68 anos, como presidente da Assembleia Nacional (Parlamento). Lazo é da segunda geração de políticos cubanos e substitui o revolucionário Ricardo Alarcón, de 75 anos, que comandava o Legislativo desde 1993.
Com o discurso de ontem, Raúl Castro reforçou o lado político do processo de reformas em Cuba iniciado por ele em 2008, quando assumiu a Presidência, mas que até agora foi mais dedicado à economia do país, em crise. Entre as principais mudanças, o aumento do número de atividades que podem ser exercidas por autônomos e o anúncio do corte de 500 mil postos do funcionalismo público até 2015 - 250 mil já foram extintos em 2011 e 2012, diz o regime.
- Temos definido pelo Partido o rumo para atualizar o modelo econômico cubano e alcançar uma sociedade socialista próspera e sustentável, uma sociedade menos igualitária, mas mais justa - afirmou Raúl, prometendo mais consultas populares.
Prova de que as reformas citadas por Raúl têm mais a ver com mudanças dentro do PCC e do regime que com uma possível abertura política foi a repressão a atividades de dissidentes ontem. Um protesto organizado pela organização dissidente Damas de Branco, formada por mulheres parentes de ativistas presos, com a presença de quase 60 pessoas, terminou com a maior parte dos presentes detida durante quase todo dia. Segundo Julia Estrella Aramburo, uma das integrantes do grupo, dois estrangeiros, entre eles um brasileiro, também foram presos e liberados - ao GLOBO, o Ministério das Relações Exteriores disse não ter recebido informações sobre o caso. Nomes de peso da oposição cubana, como Guillermo Fariñas e Angel Moya, também passaram o domingo presos. Em seu discurso, Raúl Castro se mostrou mais preocupado com o fortalecimento e a renovação dos quadros do PCC nos próximos cinco anos:
- Devemos agir de maneira previdente, a fim de evitar que se repita a situação de não contar com suficiente reserva de quadros preparados para ocupar os postos superiores do país.
Até agora, além da limitação de mandatos consecutivos em cargos estatais (no máximo dois períodos de cinco anos), a outra medida reformista que até agora teve grande impacto político foi a extinção do chamado "visto de saída", ocorrida no mês passado. Mas o presidente cubano não deixou margem para dúvidas quanto à velocidade de possíveis mudanças:
- Àqueles que dentro ou fora do país, com boas ou más intenções, nos incentivam a ir mais rápido, dizemos que continuaremos sem pressa, mas sem pausa.

Venezuela entra em clima de campanha

Venezuela entra em clima de campanha

Sem certeza sobre Chávez, oposição e governo acirram campanha antecipada
Autor(es): Roberto Lameirinhas
O Estado de S. Paulo - 25/02/2013
 
As recentes informações que sugerem uma piora no estado de saúde do presidente venezuelano, Hugo Chávez, acabaram precipitando a campanha para sua sucessão. Líderes da oposição intensificaram a pressão sobre a aliança Mesa da Unidade Democrática (MUD) para que defina rapidamente um candidato.
No mesmo sentido, o vice-presidente, Nicolás Maduro, designado por Chávez como seu sucessor, passa a ocupar cada vez mais os espaços da mídia em inaugurações e solenidades oficiais - na maioria das vezes, emulando gestos e repetindo frases que sempre caracterizaram o líder bolivariano.
Embora o governador do Estado de Miranda e candidato presidencial derrotado por Chávez em 7 de outubro, Henrique Capriles, se perfile como o nome natural da MUD, o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, cobrou, durante um ato político no sábado à tarde, uma decisão definitiva da aliança opositora.
Em meio a gritos de "onde está Capriles" dos cerca de 300 manifestantes reunidos na Praça Brion de Chacaíto, Ledezma defendeu, sem mencionar nomes, uma rápida definição da candidatura opositora.
O prefeito advertiu seus companheiros da oposição de que o sigilo e a escassez de informações sobre o estado de saúde de Chávez é parte de um "plano militar" para surpreender os antichavistas e encontrá-los ainda desorganizados no momento em que, finalmente, ficar definida a necessidade de uma nova eleição. "Antes que se eleja o sucessor de Bento XVI, teremos de contar com um candidato", disse. "Precisamos estar preparados para, se houver eleições, cortar seus bigodes", acrescentou, referindo-se a Maduro.
A Constituição venezuelana prevê a convocação de eleições para o prazo de 30 dias a partir da declaração de incapacidade de Chávez para exercer a presidência.
Por seu lado, Maduro tem intensificado suas aparições na mídia oficial, inaugurando obras e presidindo solenidades. O vice-presidente, a quem Chávez entregou a "espada de Bolívar" na emocionante despedida de 8 dezembro - antes de partir para Cuba para a mais recente cirurgia para combater o câncer na região pélvica -, adotou de vez o gestual e a retórica do líder bolivariano.
"O chavismo manobra com uma série de pesquisas de opinião elaborada pelo instituo Hinterlaces, que mostra um apoio popular ainda significativo para o governo", declarou ao Estado o consultor de política da empresa EcoLatina, Miguel Mendoza.
"Com a comoção causada por uma eventual ausência de Chávez, Maduro teria boas chances de manter o chavismo no poder por mais um mandato. Ao mesmo tempo, a oposição tem uma delicada equação para resolver: articular a organização de uma campanha eleitoral, contornando suas óbvias divisões internas, sem parecer um grupo de políticos oportunistas ante a doença de um líder popular."
Durante o ato político da oposição, Ledezma ironizou as declarações de Maduro de que conversou com Chávez por cinco horas no sábado. O vice-presidente mencionou a conversa com o líder um dia depois de dois ministros, o das Comunicações e Informação, Ernesto Villegas, e o chanceler, Elías Jaua, terem informado sobre a persistência da insuficiência respiratória, que ampliou a apreensão de seus aliados.

G-20 AVALIA BARRAR ENTRADA DE CORRUPTOS NOS PAÍSES-MEMBROS

G-20 AVALIA BARRAR ENTRADA DE CORRUPTOS NOS PAÍSES-MEMBROS

G-20 AVALIA BARRAR ENTRADA DE CORRUPTOS NOS PAÍSES-MEMBROS, MAS BRASIL RESISTE
Autor(es): Alana Rizzo
O Estado de S. Paulo - 25/02/2013
 
O Grupo dos 20 (G-20) estuda uma proposta para barrar a cir­culação de corruptos e corrup­tores nos seus países-membros a partir da negativa de vis­tos e de refugio. A proposta, en­cabeçada pelos Estados Uni­dos, é vista com reticências no governo brasileiro.
O Estado teve acesso a docu­mentos que relatam a falta de consenso dentro do governo em apresentar uma manifesta­ção sobre o tema, apesar da pres­são internacional. Desde o ano passado, membros da Controladoria-Geral da União (GGU), do Ministério das Relações Exte­riores, da Advocacia-Geral da União (AGU) e do Ministério da Justiça estão envolvidos no de­bate, considerado "sensível", "polêmico" e "difícil". As autori­dades brasileiras não conse­guem definir quem seria afeta­do pela medida.
Em 2012, os chefes de Estado ratificaram o compromisso de criar instrumentos para barrar a entrada de enquadrados nesse crime em seus territórios. Em ju­nho, o grupo apresentará o pri­meiro relatório sobre a implanta­ção da medida.
O Brasil quer parâmetros so­bre quem se enquadraria no ter­mo "corrupto" e quem sofreria as penalidades. Não há entendi­mento, entre as autoridades lo­cais, sobre se a norma valeria ape­nas para condenados ou tam­bém para aqueles que não foram julgados. Discute-se, ainda, no âmbito do G-20 que a punição deveria se estender a familiares e associados dos corruptos, o que contraria a Constituição bra­sileira. Também pesa nas discus­sões governamentais a tradição do País de não restringir acesso ao seu território. Os defensores da proposta, no entanto, susten­tam que a negação de vistos e o controle migratório impedem que o corrupto gaste o dinheiro fruto do ilícito fora de seu país.
A medida teria reciprocidade e afetaria o universo de corrup­tos brasileiros que tentassem en­trar nos países do G-20. Dados do Ministério Público Federal re­velam que mais de 5 mil inquéri­tos foram abertos nos últimos anos para investigar práticas de corrupção no País. Cerca de 700 pessoas cumprem pena hoje no Brasil por esse crime.
No Supremo Tribunal Fede­ral, há 17 inquéritos e ações pe­nais contra parlamentares, e so­mente a Procuradoria Regional da República da 1.a Região denun­ciou cerca de 250 prefeitos nos últimos dois anos por esse cri­me. No julgamento do mensalão, concluído no final do ano passado, 20 dos 25 condenados foram sentenciados a penas por corrupção ativa ou passiva - en­tre eles o ex-ministro José Dirceu, o deputado federal José Genoino e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.
Em pauta. Oficialmente, o go­verno nega qualquer tentativa de atrasar a proposta e afirma que o assunto está ainda em dis­cussão. O Brasil tem até o próxi­mo ano para debater o assunto, que ganhou força depois de os Estados Unidos alterarem sua le­gislação - autorizando a autori­dade alfandegária a barrar a en­trada de corruptos, familiares e pessoas associadas.
O tema também avança no Ca­nadá, onde um projeto de lei criando restrições para o acesso ao território de pessoas corrup­tas já foi apresentado.
"A discussão existe e, por se tratar de um assunto sensível, es­tá andando surpreendentemen­te bem. Estamos no ponto de de­finir a forma e operacionalizá-la. O Brasil já se comprometeu a analisar casos de corrupção co­mo um critério na hora de con­cessão de vistos ou na entrada de estrangeiros em seu território. O que não vamos é abrir mão da soberania do País de decidir", afirma Hamilton Fernando Cota Cruz, assessor especial da CGU, responsável por coordenar as ações brasileiras sobre o tema no G-20. "Uma medida como es­sa é de grande inovação e ela tem o respaldo e a força dos líderes políticos das 20 maiores econo­mias do mundo, que assinaram a proposta. Não tem força de lei, mas tem força política."
Para o G-20, a corrupção amea­ça a integridade dos mercados, destrói a confiança da sociedade e distorce alocações de recursos. O grupo anticorrupção tem re­presentantes de todos os países e a Espanha como observadora.
Polêmica. "Muito mais eficaz do que barrar a entrada de cor­ruptos nos países é a punição efetiva de quem é corrupto e do corruptor", avalia Rodrigo Vitó­ria, coordenador da unidade de Governança e Justiça do Escritó­rio das Nações Unidas sobre Drogas e Crime.
Para ele, a medida esbarra em princípios constitucionais, co­mo a presunção da inocência, e também na demora na validação de sentenças internacionais pe­lo Judiciário. "O cenário brasilei­ro está melhorando, mas ainda temos uma cultura de permissividade com a corrupção. A medi­da constrange, mas não é a me­lhor", avalia.

Floresta Amazônica será toda mapeada

Floresta Amazônica será toda mapeada

Florestas brasileiras serão mapeadas
Autor(es): ÉTORE MEDEIROS
Correio Braziliense - 25/02/2013
 

O último inventário ocorreu entre as décadas de 1970 e 1980. Agora a preocupação é com o desmatamento, a biodiversidade e as espécies em extinção. Os demais biomas também estão no projeto

A partir deste ano, a biodiversidade do país começa a ser monitorada de perto com a criação do Inventário Floresta Nacional. Os biomas serão analisados e revisitados a cada cinco anos. Para especialista, o conhecimento é a maior arma contra a devastação

A Floresta Amazônica passará por um minucioso mapeamento no segundo semestre deste ano na realização do Inventário Floresta Nacional (IFN). A iniciativa do Ministério do Meio Ambiente (MMA) pretende reunir, até 2016, informações de cerca de 22 mil pontos amostrais de todos os biomas brasileiros — cerrado, mata atlântica, pantanal e caatinga, além da Amazônia. A intenção é que as áreas sejam revisitadas a cada cinco anos e monitoradas de acordo com a evolução dos recursos florestais existentes, contribuindo assim para elaboração de políticas de uso e conservação das matas.

Apesar de ser um país reconhecido e admirado mundialmente pela extensa biodiversidade, um inventário das florestas no Brasil só foi feito uma vez, entre as décadas de 1970 e 1980, ainda assim, mapeando somente os recursos madeireiros disponíveis, seguindo uma tendência mundial que buscava alternativas energéticas para a crise do petróleo. Para o diretor do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), Joberto Veloso , no século 21, o foco é outro. “O inventário de hoje está voltado para a obtenção de dados como desmatamento, degradação, usos e funções das florestas, biodiversidade e espécies em extinção”, define Veloso.

Para fazer os registros em cada um dos 22 mil pontos de estudo, os profissionais contratados seguirão um manual elaborado pelo SFB, que determina a medição da altura e espessura dos troncos de árvores, coleta de amostras de cada espécie vegetal e do solo. Também serão realizadas entrevistas com moradores próximos às áreas pesquisadas.

Enquanto o SFB centralizará e consolidará os dados obtidos em campo, as amostras das plantas vão para diferentes herbários, responsáveis pelo trabalho de reconhecimento das espécies. Para controlar o uso da metodologia adotada, o inventário prevê parceria com universidades e institutos regionais, que farão uma segunda medição de cerca de 10% dos pontos, para efeito comparativo.

De acordo com Heron Martins, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), conhecer a floresta é fundamental para preservar os seus potenciais. “O principal inimigo das florestas é o desconhecimento, que diminui o valor da floresta em pé, e ela passa a valer mais como tora de madeira. Com o inventário, ficará mais fácil evitar a construção de grandes obras, como estradas e usinas hidroelétricas, em áreas de importância biológica”, afirma Martins, destacando que não é preciso esperar pelo inventário para preservar as florestas. “O asfaltamento de uma grande rodovia, como a BR-163, torna diversas áreas acessíveis, e quando não há a presença do Estado, para fiscalizar, é mais fácil que outros atores cheguem, descumpram as leis e provoquem o desmatamento”, comenta o pesquisador.

Piloto
O Distrito Federal e Santa Catarina tiveram as florestas mapeadas de forma piloto, ao longo dos dois últimos anos, para a avaliação da metodologia criada pelo SFB. Na capital do país, os primeiros resultados devem sair no primeiro semestre de 2013, enquanto os de Santa Catarina começaram a ser publicados durante o 63º Congresso Nacional de Botânica, em novembro de 2012. Na ocasião, foi celebrada a descoberta de uma nova espécie de bromélia.

O Herbário Dr. Roberto Miguel Klein, da Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB), em Santa Catarina, é um exemplo dos benefícios que o IFN poderá trazer. “O herbário pulou de 10 mil para 35 mil registros, e hoje conta com mais de 40 mil plantas, totalizando mais de quatro mil espécies distintas”, comemora o curador, o professor André Luís de Gasper.

O professor pondera, entretanto, que o novo material será inútil sem a formação de taxonomistas — especialistas em identificação de espécies —, sem a manutenção e atualização dos sistemas informatizados e do material oriundo das florestas. “Equipar os herbários e garantir que acidentes como os do Instituto Butantã, da Universidade de São Paulo, não aconteçam são fundamentais para a proteção deste tesouro”, alerta Gasper. Em 2010, um incêndio comprometeu parte do coleção de mais de 70 mil serpentes e quase 500 mil aranhas e escorpiões.

Além do mapeamento e coleta, o IFN também analisará cerca de cinco mil pontos em todo o território nacional, por meio de imagens de satélites. Ao serem cruzadas com os dados obtidos em solo, as informações permitirão a formação de um panorama vasto e inédito das florestas brasileiras. “A repetição do inventário a cada cinco anos possibilitará a criação de séries temporais, que mostrarão tendências dentro das florestas. Assim poderemos analisar os resultados de políticas que deram certo ou as que precisam ser implementadas”, conclui Veloso.

Acesso por rodovia
O Programa de Aceleração de Crescimento (PAC2) tem atualmente 5.279km de rodovias em obras de pavimentação ou construção, de acordo com balanço divulgado na semana passada, e a BR-163 responde por 978km do total. A estrada, que liga o Rio Grande do Sul a Santarém, no Pará, tinha um último trecho de terra, entre Guarantã do Norte, em Mato Grosso, e a cidade paraense. O balanço do PAC2 informa que 62% da obra de asfaltamento do trecho já está concluído, floresta amazônica adentro.

Itália conhecerá hoje seu premier

Itália conhecerá hoje seu premier

Renata Giraldi* - Repórter da Agência Brasil

As eleições legislativas na Itália terminam hoje (25) às 15h (11h de Brasília). A partir das eleições legislativas será definido o novo primeiro-ministro do país. O primeiro-ministro terá a responsabilidade de conduzir a Itália na tentativa de superar os efeitos da crise econômica internacional.

No segundo dia de votações, a expectativa é que 50 milhões de eleitores compareçam até o fechamento das urnas. As votações começaram ontem (24), registrando o comparecimento de 55,17% dos eleitores, índice menor do que o das eleições legislativas de 2008. Os eleitores escolherão 630 representantes na Câmara dos Deputados e 315 integrantes do Senado. Para uma das quatro cadeiras destinadas a candidatos no exterior, há uma brasileira concorrendo.

Na disputa pelo cargo de primeiro-ministro o líder do Partido Democrata (PD), Pier Luigi Bersani, é o considerado o favorito. Em segundo lugar, estão o ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi – que concorre pelo Partido Povo pela Liberdade – e Mario Monti, atual primeiro-ministro, que defende a coligação Eleição Cívica formada pela União dos Democratas Cristãos e Futuro e Liberdade.

A brasileira Renata Bueno (PPS-PR) concorre ao Parlamento italiano com o apoio da  Frente Ambientalista da Câmara dos Deputados. Pela legislação italiana, há quatro cadeiras destinadas a candidatos do exterior para deputado e duas para senador. Na Itália, os eleitores residentes no Brasil e nos demais países da América do Sul também podem votar, por meio dos Correios. Cidadãos italianos que moram na América do Sul ou pessoas com dupla cidadania tiveram até o último dia 21 para votar. 

*Com informações da agência pública de notícias de Portugal, Lusa.

Edição: Talita Cavalcante//Matéria atualizada às 8h15.

Fonte: Agência Brasil (EBC)
 
 

Publicado em: 25/02/2013

Eleiçoes no Paraguai

Eleiçoes no Paraguai

Renata Giraldi* - Repórter da Agência Brasil

A menos de dois meses das eleições presidenciais no Paraguai, o presidente da Justiça Eleitoral do país, Alberto Ramírez Zambonini, faz hoje (25) uma reunião com integrantes da Corte e representantes da Organização dos Estados Americanos (OEA). A organização enviará observadores para as eleições no país, marcadas para o dia 21 de abril.

O Paraguai está suspenso do Mercosul e da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) até as eleições. Há oito meses, o país foi suspenso dos dois blocos porque os presidentes sul-americanos entenderam que houve o rompimento da ordem democrática no país em decorrência da forma como foi conduzido o processo de impeachment do então presidente Fernando Lugo, em junho de 2012.

Amanhã (26) haverá um debate entre os presidenciáveis sobre a luta contra a pobreza. Os principais candidatos à Presidência do Paraguai são Efraín Alegre (PLRA), Horácio Cortes (ANR), Mario Ferreiro (Avança País), Miguel Carrizosa (Pátria Querida) e Aníbal Carrillo (Frente Guasú). A Frente Guasú é a coligação que conta com o apoio de Lugo.

Desde o impeachment de Lugo, o governo do Paraguai está sob o comando de Federico Franco, que era o vice-presidente da gestão anterior.

*Com informações da agência pública de notícias do Paraguai, Ipparaguay // Edição: Juliana Andrade

Fonte: Agência Brasil (EBC)
 
 

Publicado em: 25/02/2013

O que Obama não dirá sobre os drones

O que Obama não dirá sobre os drones

Autor(es): Ryan Goodman
O Estado de S. Paulo - 25/02/2013
 
Eis um fato que você não ouviu nas audiências de confirmação de John Brennan, o escolhido pelo presidente Barack Obama para ser o próximo chefe da CIA, nem viu no relatório do governo sobre as mortes por drones. As regras internacionais sobre conflitos armados exigem que as nações capturem combatentes inimigos, em vez de matá-los, especialmente quando a força letal não é o único meio de tirá-los do campo de batalha.
No relatório, o governo alega que realizou uma revisão exaustiva das leis de guerra e honra essas normas. O retrato que ele faz das leis, contudo, é errado, de tão incompleto que está. O pressuposto fundamental, que em todas as análises que li ainda não foi questionado, é que, em tempo de guerra, um Estado pode, ao seu critério, escolher matar em vez de capturar combatentes inimigos.
Isto é uma absoluta falácia em matéria do direito atual e da história jurídica. O entendimento correto - e respeitador - da lei nesta área é extremamente importante para as escolhas que as forças especiais americanas são autorizadas a fazer quando caçam um suspeito de terrorismo. E é importante para as regras que os Estados Unidos estabelecem na cooperação com seus aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
Ao ouvir a versão do governo a respeito do manual sobre aviões não tripulados (drones), o sujeito pode ser induzido a acreditar que, tão logo alguém seja designado como um combatente inimigo, ele pode ser morto á qualquer momento, em qualquer lugar - a menos que se renda. No entanto, quanto mais se procura uma defesa bem sustentada dessa ideia por algum especialista na lei de guerra, mais se percebe como ela é um erro.
Em 1625, o pai do direito internacional, Hugo Grotius, escreveu que, em geral, matar é chamado um "direito de guerra" e, segundo a lei das nações, "qualquer um que seja um inimigo pode ser atacado em qualquer lugar". O entendimento de Grotius esteve presente na Revolução Americana, na Guerra Civil dos EUA e nas guerras mundiais, na primeira metade do século 20.
No entanto, as modernas leis de guerra percorreram um longo caminho depois disso. Em 1967, um dos arquitetos delas, o jurista suíço Jean Pictet, afirmou que as partes de um conflito devem aplicar somente a força necessária. Mais tarde, ele elaboraria esse princípio numa máxima simples. "Se pudermos pôr um soldado fora de ação capturando-o, não devemos feri-lo, se pudermos obter o mesmo resultado ferindo-o, não devemos matá-lo, se houver dois meios de alcançar a mesma vantagem militar, devemos escolher a que causa menos males."
Não me entendam mal .Essa máxima não requer que soldados americanos se coloquem em risco para capturar terroristas da Al-Qaeda. O princípio de Pictet simplesmente sustenta que, se for desnecessário matar um indivíduo para tirá-lo do campo de batalha, a captura deve ser a opção preferida.
As opiniões de Pictet repudiavam a ideia da lei que remontavam a Grotius. E se impuseram. Em 1973, um grupo que incluía importantes figuras intelectuais da época, como Hans Blix, da Suécia, e Frits Kalshoven, da Holanda, adotou a linguagem de Pictet, essencialmente, palavra por palavra, como um reflexo justo da lei existente.
Por volta da mesma época, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha analisou o estado da lei em um importante relatório para governos mundiais e afirmou concretamente: "O princípio de humanidade dispõe que a captura deve ser preferida ao ferimento. E o ferimento à eliminação."
Esse período culminou numa conferência internacional em Genebra, em 1977, que famosamente estabeleceu novos tratados que refletiam e atualizavam as normas de guerra. O resultado final foi um pacto, concordando com uma proibição mundial de "ferimentos supérfluos ou sofrimentos desnecessários", palavras que, de novo, espelhavam a máxima de Pictet. E palavras que estão hoje incluídas nos manuais bélicos dos militares americanos.
O fundamento da posição da Casa Branca se baseia, no fim das contas, numa relíquia histórica. No entanto, essa visão tem sido aceita como dominante nos Estados Unidos. Até críticos vigorosos do programa dos drones começaram a engoli-la. Por exemplo, um crítico recente da análise jurídica do Departamento de Justiça aceitou que, "a menos que ele se renda, um combatente pode ser morto independentemente de atividade".
A dissociação entre a conversa americana e as modernas leis de guerra ficou exposta até numa recente discussão com o filósofo político americano Michael Walzer. Ele sinalizou seu forte apoio à posição da Casa Branca. "Numa guerra assimétrica, sem um front, sem soldados em uniformes, as eliminações seletivas parecem uma forma necessária de guerra - e justificada, se atingirmos os alvos certos. Por que o risco (para forças americanas) faz diferença", afirmou.
Compare-se isso, porém, à emblemática decisão da Suprema Corte de Israel, em 2005, sobre eliminações seletivas. Numa decisão que incorpora desdobramentos modernos da lei internacional, os juizes israelenses declararam que a força letal deve ser abandonada quando "um meio menos danoso pode ser empregado". Eles explicaram que um fator-chave é se essa restrição envolve "um risco muito grande às vidas de soldados (israelenses)".
Uma leitura cuidadosa da lei e da história moderna mostra como a posição da Casa Branca está errada. Na faculdade de Direito, ensinamos que interpretar erroneamente a lei é tão ruim quanto ignorá-la. Neste caso, pelo menos nós ainda temos a chance de interpretá-la corretamente. /
Tradução de Celso Paciornik e professor de direito na Universidade De Nova York

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

A cor dos homicídios no Brasil

A cor dos homicídios no Brasil
Entre 2002 e 2010, o país apresentou uma inquietante tendência de aumento da distinção entre negros e brancos nos índices de mortalidade. Se os dados globais de homicídio mudaram pouco nesse período, em torno de 27 para cada 100 mil habitantes, foi em razão da queda dos homicídios brancos e crescimento dos negros
por Julio Jacobo Waiselfisz
O Brasil está cada dia mais longe de manifestar respeito a um direito essencial, que é o direito à vida e à segurança sem distinção de raça ou cor, proclamado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.
O Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde, construído com base nos padrões internacionais da Organização Mundial da Saúde, é a única fonte que temos disponível, até os dias de hoje, que verifica em nível nacional o quesito raça/cor das vítimas de homicídio. Esse item só foi incorporado em 1996, mas nos primeiros anos de vigência seu preenchimento foi muito deficitário, melhorando de forma progressiva. Assim, a partir de 2002, quando a identificação da raça/cor já estava na casa de 92%, pudemos considerar os dados suficientemente confiáveis para iniciar as análises sobre o tema. O último dado divulgado, até o momento, corresponde ao ano de 2010.
Segundo os registros desse sistema, entre 2002 e 2010 morreram assassinados no país 272.422 cidadãos negros, o que dá uma média de 30.269 assassinatos por ano. Só em 2010 foram 34.983. Na cruenta Guerra do Iraque, as estimativas mais elevadas indicam que de 2003 até fins de 2009 morreram 110 mil pessoas, incluindo civis, o que significa 15,7 mil por ano. No Brasil, país que não aparenta ter conflitos étnicos, religiosos, de fronteiras, raciais ou políticos, morre assassinado o dobro de cidadãos negros todos os anos e mais do triplo – 52.260 em 2010 – de seus habitantes de todas as raças e cores.
Embora os números sejam preocupantes, inquieta mais ainda a tendência crescente dessa mortalidade discriminante. Se os índices globais de homicídio do país nesse período mudaram pouco, em torno de 27 homicídios para 100 mil habitantes, foi em razão de uma associação inaceitável de queda dos homicídios de brancos e crescimento dos homicídios de negros:
• Considerando o conjunto da população, entre 2002 e 2010 o número absoluto de vítimas brancas de homicídio caiu de 18.867 para 14.047, queda de 25,5%. Já as vítimas negras cresceram de 26.952 para 34.983, incremento de 29,8%.
• Com isso, o índice de vitimização negra na população total, que em 2002 era 65,4% – morriam assassinados, proporcionalmente, 65,4% mais negros que brancos –, em 2010 pulou para 132,3%.
• As taxas de vítimas entre os jovens negros – 15 a 29 anos de idade – duplicam, ou mais, os da população total. Assim, em 2010, se a taxa de homicídio da população negra foi de 36 em 100 mil, a dos jovens negros foi de 72 para 100 mil.
• Com isso, a vitimização de jovens negros, que em 2002 era de 71,7%, em 2010 pulou para 153,9% – morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros que brancos.
• Os dados também apontam que essa vitimização negra está crescendo de forma rápida e preocupante por suas implicações sociais e políticas.
Esse é o panorama nacional, a média do país. Mas, se olharmos para as unidades da federação e, mais ainda, para os municípios, veremos situações extremas que deveriam ser fonte de séria atenção:
• Seis estados apresentaram, em 2010, taxas de homicídio acima de 50 para 100 mil negros: Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pará, Pernambuco e Distrito Federal.
• Oito unidades ultrapassaram a marca dos 100 homicídios para 100 mil jovens negros: Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco, Mato Grosso, Distrito Federal, Bahia e Pará.
• Na Paraíba, em 2010, foram registrados 47 homicídios brancos e 1.335 homicídios negros. Considerando as respectivas populações, a taxa de homicídios brancos foi de 3,1 para 100 mil brancos contra 60,5 para 100 mil negros. Dessa forma, o índice de vitimização negra foi de 1.824: para cada branco morreram, proporcionalmente, dezenove negros.
• Diversos especialistas estabelecem que níveis acima de 10 homicídios para 100 mil habitantes caracterizam situação de violência epidêmica. Todos os estados brasileiros superam esse patamar. As unidades com as menores taxas de homicídios negros em 2010, Santa Catarina e Piauí, ostentavam, respectivamente, 13,3 e 15 homicídios para 100 mil negros.
• A heterogeneidade de situações torna-se ainda maior quando desagregamos os dados para os municípios do país, com casos extremos como o de Ananindeua, no Pará, onde em 2010 foram registrados 33 homicídios brancos e 705 negros, o que origina taxas de 29,3 homicídios para 100 mil brancos e 198,8 homicídios para 100 mil negros. No outro extremo, 2.936 municípios – 52,8% do total nacional – não registraram nenhum homicídio negro em 2010.
• Não muito diferente é o panorama de algumas capitais do país, como João Pessoa (PB), onde, em 2010, foram assassinados 16 brancos e 545 negros, taxas de 4,9 homicídios brancos e 140,7 negros. Ou Maceió (AL), com 17 vítimas brancas e 774 negras.
Dois fatores devem ser mencionados para a compreensão da situação. Em primeiro lugar: a crescente privatização do aparelho de segurança. Como já ocorrido com outros serviços básicos, como a saúde, a educação e, mais recentemente, a previdência social, o Estado vai se limitar a oferecer, para o conjunto da população, um mínimo – e muitas vezes nem isso – de acesso aos serviços e benefícios sociais considerados básicos. Para os setores com melhor condição financeira, serviços privados de melhor qualidade. Com a segurança vem ocorrendo esse processo de forma acelerada nos últimos anos. A pesquisa domiciliar do IBGE de 2011 é clara sobre as possibilidades diferenciais de acesso a serviços privados de melhor qualidade: as famílias negras tinham uma renda média de R$ 1.938,19, e as brancas, de R$ 3.183,07, isto é, 64,2% a mais.
Em segundo lugar, e reforçando o anterior, as ações de segurança pública distribuem-se de forma extremamente desigual nas diversas áreas e espaços geográficos, priorizando sua visibilidade política e seu impacto na opinião pública e, principalmente, na mídia. Assim, em geral áreas mais abastadas, de população prioritariamente branca, ostentam os benefícios de uma dupla segurança, a pública e a privada, enquanto as áreas periféricas, de composição majoritariamente negra, nenhuma das duas.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, pedra fundamental de nossa moderna convivência, estabelece que: “Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal [...] sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”. Temos ainda um longo caminho para tornar realidade esse direito fundamental proclamado em 1948.
Julio Jacobo Waiselfisz
Coordenador da Área de Estudos da Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) e pesquisador do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela).


Ilustração: Jean Jullien

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

O programa nuclear e o futuro do Brasil


O programa nuclear e o futuro do Brasil

Roberto Amaral

Publicado em Carta Capital

O Brasil, considerando apenas a área até aqui prospectada, é o sexto país em reservas de urânio em todo o mundo. Esta reserva é suficiente para manter em funcionamento as atuais usinas Angra I e Angra II, e a futura Angra III e mais 4 novas usinas de 1000 Mw cada, por cerca de 100 anos. Não é para ser desconsiderado, portanto.
Foto: Johannes Eisele/AFP
Foto: Johannes Eisele/AFP

Mas possuir reservas minerais não é tudo, embora o Brasil esteja se descuidando de suas terras raras. Para ser utilizado, e para ter valor comercial, o urânio precisa ser transformado industrialmente em combustível nuclear, processo que compreende algumas etapas, entre elas o enriquecimento, com enorme valor agregado, inumeráveis fases de tratamento e o acesso a segredos tecnológicos guardados a cinco chaves pelos países que dominam essa tecnologia.
É o que se descreve a seguir.
Inicialmente, o minério bruto é processado de maneira a extrair a maior quantidade possível do urânio nele contido. Isso gera um material sólido chamado yellow cake, ou concentrado de urânio. Antes do enriquecimento propriamente dito, o yellow cake puro deve ser transformado em gás. Nas usinas de enriquecimento esse gás é processado para aumentar a proporção de Urânio 235, o urânio físsil, responsável, quando fissionado, pela geração de energia no gás. Em seguida ele é reconvertido para a fase sólida, constituindo-se num pó, que é compactado em pastilhas (pellets) e acondicionado em varetas que compõem o chamado elemento combustível.
Precisamos de urânio enriquecido para alimentar Angra I e II e Angra III, e, se o país tiver juízo, as demais usinas projetadas, projetadas, projetadas e de execução adiada.  Qual o procedimento atual? Produzimos o yellow cake e o remetemos para processadores no exterior para transformação em gás enriquecido, retornando ao país para ser reconvertido, produzidas as pastilhas e  acondicionadas nos elementos combustíveis.
Hoje, após anos de investimentos em pesquisa e equipamentos, e enfrentando a sabotagem das grandes potências nucleares, EUA à frente, como sempre, já dominamos a tecnologia para enriquecimento isotópico do urânio, desenvolvida pela Marinha (CTMSP) em colaboração com o IPEN, e brevemente estaremos produzindo  nosso combustível, na fábrica da INB. A tecnologia não é pioneira, mas nossas centrífugas, principal equipamento da planta, apresentam importantes conquistas que as tornam mais eficientes que as atualmente em uso em todo o mundo. E motivo de cobiça.
O domínio dessa tecnologia decorre de decisões políticas cruciais de vários governos e da persistência de pesquisadores e militares devotados. Dele tanto resulta o acúmulo de pesquisas, como determina igualmente novos avanços científicos e tecnológicos, os quais  estarão refletidos em novas conquistas; além da conclusão do ciclo nuclear, disporemos de  maior segurança no fornecimento do combustível, economia de custos e de divisas e, de futuro, a possibilidade de fornecermos urânio enriquecido para clientes no exterior. O ganho econômico pode ser medido pela diferença de preço, no mercado internacional, entre o minério bruto e o elemento combustível.
Uma vez mais  se coloca para o país optar entre permanecer como mero fornecedor de matéria-prima in natura,  ou transformar-se em exportador de conhecimento, rejeitar como destino a condição dependente,  optando pela emancipação nacional como base de seu  futuro. E não há futuro nem independência se renunciarmos ao desenvolvimento científico e tecnológico. Não se veja nessa política a revisão do velho projeto do Brasil-potência, nem eivos de um militarismo arcaico. Trata-se, simplesmente, de optar entre  independência e  dependência e caminhar no sentido contrário das políticas do neoliberalismo.
Nossa tecnologia, voltada para os usos pacíficos da energia nuclear, nada tem a ver com a produção de bombas, que requer urânio enriquecido a mais de 90% em seu isótopo 235, enquanto a planta de enriquecimento isotópico da INB em Rezende foi projetada para a produção de enriquecimento até 5%, destinando-se, portanto, exclusivamente, para uso na fabricação de elementos combustíveis dos reatores de potência do sistema Angra e em alguns tipos de reatores para propulsão naval, como do nosso futuro submarino.
Portanto, nosso país nada tem que esconder. E jamais escondeu. Precisa apenas decidir se deseja mesmo (pois precisa) dominar o conhecimento científico e tecnológico pondo-o a serviço de seu desenvolvimento e de sua soberania.
Além de haver aderido, em 1997, ao Tratado de não-proliferação de Armas Nucleares (TNP), unilateralmente, ou seja,  sem negociar, isto é, sem cobrar contrapartidas, como, por exemplo, transferência de tecnologia, ou, a redução dos estoques das potências nucleares e guerreiras (EUA à frente),  o Brasil é o único país do mundo a determinar, em sua Constituição (art.21, XXIII, a) que “toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos” e, igualmente, é o único país do mundo que permite inspeções em suas instalações militares. E o único submetido a inspeções de duas agências internacionais, a Agência Internacional de Energia Atômica-AIEA, e a ABACC, Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares- ABACC.
O país recebe anualmente cerca de 50 inspeções anunciadas e seis inspeções não anunciadas, isto é de surpresa, sem programação prévia, em suas instalações nucleares.
Quando foi levantado o pleito da AIEA com vistas à assinatura  de um novo Acordo de Salvaguardas, a posição brasileira foi a de assegurar, às Agências, a aplicação de um controle efetivo do material nuclear utilizado, ao mesmo tempo que defendíamos   outras questões como desarmamento e, principalmente, nosso acesso às conquistas tecnológicas, além de igualdade de condições entre os signatários.
É querer muito? Não. O diferencial é que esses devem ser os termos de discussão de um país preocupado em preservar seus interesses, para continuar soberano.
É oportuno lembrar que o programa nuclear brasileiro não se reduz à produção de combustível. São notáveis suas aplicações na área médica, seja com vistas a diagnóstico, seja com vistas à terapia (radioterapia e braquiterapia; biotecnologia, irradiação de materiais biológicos); no meio ambiente, na indústria, na agricultura e irradiação de alimentos, nas indústrias do petróleo e do papel e na siderurgia, no beneficiamento de gemas, esterilização de materiais e no melhoramento genético e controle de pragas, nas áreas de materiais, processos físicos, químicos e tecnologia de suporte.
E, por fim, é fundamental o aproveitamento do urânio para a geração de energia elétrica, como fonte complementar às hidrelétricas e em substituição às fontes fósseis (petróleo e carvão), caras e poluentes. Até porque as hidrelétricas, independentemente das delimitações impostas pelo regime das chuvas (acabamos de viver ameaças de ‘apagões’), enfrentam crescentes restrições ambientais as quais, por exemplo, estão determinando hidrelétricas a fio-d’água, isto é, sem reservatórios, donde a necessidade de o Estado investir em alternativas.
Trata-se, portanto, o nuclear, de programa estratégico, que decide hoje o futuro do país.

Sem governo, Tunísia caminha para o limbo político

Sem governo, Tunísia caminha para o limbo político

 José Antônio Lima

 Publicado em Carta Capital

Jebali durante reunião com o presidente da Tunísia, Moncef Marzouki, nesta terça-feira 19, na qual anunciou sua renúncia. Foto: Fethi Belaid / AFP
Jebali durante reunião com o presidente da Tunísia, Moncef Marzouki, nesta terça-feira 19, na qual anunciou sua renúncia. Foto: Fethi Belaid / AFP

A crise política que afeta a Tunísia desde o início de fevereiro, quando o líder oposicionista Chokri Belaid foi assassinado, se tornou mais grave nesta terça-feira 19. O premier Hamadi Jebali, que tentava formar um governo tecnocrático para estabilizar o país, renunciou ao cargo. Sem Jebali, a Tunísia deve passar por um período ainda mais conturbado até que uma solução seja encontrada.
Jebali fez seu anúncio em entrevista coletiva. Foi o cumprimento de uma promessa realizada no início das negociações por um novo governo. “Hoje há um grande desapontamento na população e precisamos reconquistar sua confiança”, afirmou Jebali. “Está renúncia é o primeiro passo”. As palavras do agora ex-premier são um recado a seu próprio partido, o Ennahda, entidade islâmica que possui maioria no Parlamento e governa a Tunísia desde a queda do ditador Zine el-Abidine Ben Ali, o primeiro governante árabe a deixar o poder por conta de manifestações populares da chamada Primavera Árabe.


A formação de um governo com burocratas no lugar de políticos foi bloqueada pelo Ennahda. Na segunda-feira, Jebali fez reuniões com líderes de diversas siglas, mas não conseguiu um consenso, justamente por conta de seu partido. O líder linha-dura do Ennahda, Rached Ghannouchi, se recusa a abrir mão do poder obtido nas urnas e enxerga a crise política como uma tentativa de tirar seu grupo político de cena.
De fato, a Tunísia está polarizada. Como mostrou reportagem de Gianni Carta, o Ennahda e outros partidos islâmicos mais radicais, são acusados de querer reislamizar a Tunísia, o país mais secular entre os de maioria muçulmana do Oriente Médio e Norte da África. Ao mesmo tempo, a oposição é chamada de “antirrevolucionária a serviço de uma agenda ocidental”. Este clima de tensão provocou, nos últimos dias, diversos confrontos violentos entre partidários dos dois lados e entre eles e a polícia tunisiana.
Na raiz da crise, além da disputa por poder, está a recusa dos partidos islâmicos de abdicarem do poder obtido na sequência da Primavera Árabe. O Ennahda, assim como a Irmandade Muçulmana no Egito, passou anos na ilegalidade, com seus integrantes exilados e presos. Ainda assim, os grupos religiosos conseguiram se organizar rapidamente para as eleições e tiveram ótimos resultados. Uma vez no poder, temem que qualquer crise seja uma tentativa de afastá-los da cena política mais uma vez. No último sábado, Ghannouchi, líder do Ennahda, afirmou a milhares de partidários que seu partido “nunca irá abandonar o poder enquanto tiver a confiança do povo e a legitimidade das urnas”. Ocorre que, nem sempre, governos eleitos democraticamente conseguem formar uma ampla aliança capaz de garantir a governabilidade. Em democracias nascentes, com um lado suspeitando do golpismo do outro (e vice-versa), isso pode ser a receita para o desastre.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Rafael Correa é reeleito presidente do Equador

Rafael Correa é reeleito presidente do Equador

17/02/2013
De Monica Yanakiew
Correspondente da Agência Brasil/EBC

O presidente do Equador, Rafael Correa, foi reeleito neste domingo (17) para um terceiro mandato consecutivo, que terminará em 2017, quando ele completar uma década no poder – um recorde em um país marcado por crises econômicas e políticas. Os 11,6 milhões de eleitores equatorianos também escolheram um novo vice-presidente, Jorge Glas, do Movimento Aliança Pais, de Correa, e 137 parlamentares da  Assembleia Legislativa, além de cinco representantes do Parlamento Andino.
Correa não esperou os resultados oficiais para comemorar. Mal fecharam as urnas, saíram os primeiros resultados de boca de urna, confirmando a sua reeleição no primeiro turno. Correa tinha 58,80% dos votos, quase três vezes mais do que os 23,1% obtidos pelo segundo colocado, o ex-banqueiro Guillermo Lasso.  Meia hora depois do fechamento das urnas, Correa saiu ao balcão do palácio presidencial para agradecer ao povo, que o esperava na Praça da Independência.
“Obrigado pela confiança”, disse Correa, que prometeu aprofundar a revolução cidadã iniciada por ele em 2006, quando foi eleito presidente pela primeira vez com a promessa de uma reforma constitucional. A nova Constituição, aprovada pela Assembleia Constituinte e submetida a um plebiscito popular, convocou novas eleições presidenciais para 2009 e estabeleceu o direito a dois mandatos consecutivos. Correa candidatou-se e ganhou seu segundo mandato – mas como era o primeiro, com a nova Constituição, teve direito a uma segunda reeleição.
O presidente votou de manhã e depois acompanhou sua filha, Anne Correa, de 16 anos, a votar. É a primeira vez, no Equador, que adolescentes de 16 a 18 anos, além de policiais e militares na ativa,  podem votar.
Edição: Fábio Massalli

Projeção do mercado para crescimento do PIB este ano tem leve queda, mostra boletim Focus

Projeção do mercado para crescimento do PIB este ano tem leve queda, mostra boletim Focus

18/02/2013
Kelly Oliveira
Repórter da Agência Brasil 

  Analistas de instituições financeiras consultados pelo Banco Central (BC) ajustaram a projeção para o crescimento da economia neste ano e em 2014, segundo o boletim Focus, divulgado hoje (18) pela instituição.
A projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), soma de todos os bens e serviços produzidos no país, foi reduzida de 3,09% para 3,08%, em 2013, e de 3,80% para 3,65%, no próximo ano.
A estimativa para a expansão da produção industrial passou de 3,10% para 3%, este ano, e de 3,70% para 3,50%, em 2014.
A projeção para a relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB foi ajustada de 34,25% para 34,50%, em 2013, e de 33% para 33,10%, no próximo ano.
A expectativa para a cotação do dólar passou de R$ 2,03 para R$ 2,02, ao final deste ano, e permanece em R$ 2,05, ao fim de 2014.
A previsão para o superávit comercial (saldo positivo de exportações menos importações) passou de US$ 15,5 bilhões para US$ 15,2 bilhões, este ano, e de US$ 16 bilhões para US$ 15,6 bilhões, em 2014.
Para o déficit em transações correntes (registro das transações de compra e venda de mercadorias e serviços do Brasil com o exterior), a estimativa foi alterada de US$ 64 bilhões para US$ 62,65 bilhões, em 2013, e de US$ 69,37 bilhões para US$ 68,73 bilhões, em 2014.
A expectativa para o investimento estrangeiro direto (recursos que vão para o setor produtivo do país) foi mantida em US$ 60 bilhões tanto para 2013 quanto para o próximo ano.
Edição: Juliana Andrade

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A nova Índia se inquieta

A nova Índia se inquieta
 Publicado em Le Monde Diplomatique

Crime horrível, condenação exemplar? Se os protestos que se seguiram ao estupro de uma estudante em Nova Déli trazem a esperança de uma mudança de mentalidade, a falta de julgamento justo dos suspeitos não é um bom presságio. O governo procura uma resposta diante de uma mobilização espetacular e com aspirações inéditas
por Bénedicte Manier
("Puna os estupradores, não os manifestantes", diz cartaz durante protesto em Nova Déli)
Manifestações gigantescas para protestar contra um estupro são um acontecimento jamais visto em Nova Déli. Repetidas vezes, dezenas de milhares de homens e mulheres se reuniram nas ruas da capital indiana para expressar sua revolta perante o calvário vivido por uma jovem de 23 anos, que faleceu no dia 28 de dezembro de 2012 em virtude dos ferimentos causados pela violação múltipla.
Se as jovens da classe média indiana também desceram às ruas, é porque, em primeiro lugar, esse crime tocou uma delas. Filha de uma família camponesa modesta, ela veio estudar na capital: imagem dessa geração em plena ascensão social, nascida com a globalização, com oportunidades de estudar no exterior e financeiramente independente. Uma geração que começou a provar a igualdade de gênero, tanto na universidade (onde as mulheres são mais numerosas que os homens) como no trabalho. A elevada taxa de crescimento da última década permitiu o acesso das mulheres a mais oportunidades de trabalho. Além do setor público, que em 2005 já contava com 2,9 milhões de mulheres ativas,1 elas investiram em setores que vão de vento em popa: serviços tecnológicos, aéreos, da indústria farmacêutica. As mulheres representam, por exemplo, 32% dos 3 milhões de assalariados oficiais das áreas de tecnologia da informação e serviços de informática,2 e sua taxa de participação na população economicamente ativa passou de 19,7% em 1981 para 25,7% em 2011.
No seio dessa minoria urbana, esse estupro produziu um efeito de catarse. As manifestações expressaram a rejeição à dominação dos homens, que está se tornando inaceitável. O que irrompeu na cena política de dezembro foi um choque de culturas entre a Índia do homem, modelada pelas tradições patriarcais, e a Índia “que brilha” – a famosa shining India –, cujo símbolo é essa juventude emancipada.
A região nordeste do país, onde está a capital, permanece marcada pela cultura patriarcal e constitui o foeticide belt, a zona que elimina mais fetos femininos. A inferioridade das mulheres se manifesta desde a concepção da criança, pela seleção no nascimento que privilegia os homens. Estes últimos perpetuam o nome e o patrimônio familiar, enquanto a presença de meninas é considerada inútil, mesmo prejudicial: casá-las implica oferecer um dote que endivida as famílias durante anos. Essa preferência se expressa nos milhões de abortos seletivos que, mesmo proibidos por uma lei de 1994, deixam a população desequilibrada: a Índia conta com 940 mulheres para cada 1.000 homens.3
Essa dominação masculina tradicional explica também a alta taxa de violência doméstica. Mais de 37% das indianas casadas são submetidas a violências sexuais e físicas,4 entre as quais de 7 mil a 8 mil por ano sofrem algum crime ligado ao dote, cometido por maridos que querem extorquir mais dinheiro da família da esposa. Embora sejam casos isolados, o número real é bem superior. Quanto aos crimes de estupro, dobraram entre 1990 e 2008, de acordo com o National Crime Records Bureau (NCRB) indiano, e são cometidos a cada vinte minutos,5 segundo dados oficiais.

Jovens solteiros em busca de uma esposa

Mesmo não sendo suficiente para explicar essa alta, o maior número de homens não é por acaso. Estatisticamente, não há relação entre os dois fenômenos, mas a população estabelece vínculos entre eles por conta própria: nos vilarejos do foeticide belt (nos estados de Punjab, Haryana, Rajastão...), as famílias não deixam as filhas ir sozinhas à escola ou aos campos, enquanto os médicos dos postos de saúde locais registram violações coletivas perpetradas por jovens solteiros que não conseguem uma mulher.
Tradicionalmente, as agressões sexuais refletem também a relação entre as castas, notadamente nas zonas rurais. As mulheres dalit (intocáveis) sofrem mais frequentemente a violência de homens das castas mais altas, porque são vítimas de uma fraqueza dupla: são mulheres e não pertencem a nenhuma casta. Em geral, carregam sozinhas a desonra do estupro, em um contexto de impunidade dos agressores e de silêncio complacente da sociedade. O caso de Nova Déli ajudará a mudar essa situação?
Na capital, o acosso sexual se espalhou também pelo transporte público. Os estupros aumentaram nos campi universitários, nos terrenos baldios das periferias e nos pontos de ônibus à noite. Nova Déli tem um número alto de violações declaradas: 572 em 2011, muito mais do que o total em Mumbai (221), Calcutá (76), Bangalore (97) e Hyderabad (59).6
Ao se tonar mais urbana, a violência sexual se tornou mais visível nos meios de comunicação. As mulheres reagiram, se matricularam em massa em cursos privados de autodefesa, que se multiplicaram nas grandes cidades. Repetidas vezes, a presidente indiana Pratibha Patil convidou-as a aprender artes marciais, julgando que a “melhor proteção é a autoproteção”.7 Cursos de autodefesa progressivamente foram instaurados em diversas escolas públicas femininas de Nova Déli.
Entretanto, a Índia não é uma exceção em relação à elevada violência sexual. Em um contexto cultural diferente, os estupros atingem altos índices nos Estados Unidos, por exemplo (188.380 casos registrados em 2012 em pessoas com mais de 12 anos).8 Na França, mais de 75 mil mulheres e quase o mesmo número de crianças são vítimas desse crime a cada ano.9 Nesse contexto, na Índia, campanhas deverão ser lançadas para incentivar as vítimas a falar e “fazer a vergonha mudar de lado”, segundo a expressão do manifesto contra o estupro lançado em novembro.
A força com que esse tema surgiu publicamente na Índia, contudo, evidencia a dificuldade de escutar as vítimas e encaminhar as denúncias, diferentemente do que ocorre em outros países, onde esse mecanismo já está mais desenvolvido. Dar queixa implica colher provas, com questões e exames humilhantes, para, no fim, nem sequer poder assegurar a detenção e condenação dos estupradores. Em Nova Déli, por exemplo, dos 754 homens acusados de 635 casos de violação sexual registrados entre janeiro e novembro de 2012 – números que revelam os ataques coletivos –, apenas um foi condenado. O processo ainda está em curso para todos os outros.10
Diante da comoção pública e das manifestações, o governo anunciou o maior acolhimento das mulheres pela polícia e mais severidade em relação aos criminosos, mas nada garante que esses anúncios serão suficientes para resolver a crise de confiança em uma força de segurança julgada incapaz de conter o aumento das agressões. De fato, a cólera dos manifestantes se dirigia tanto ao Estado como à polícia, os dois criticados por não cumprir suas devidas funções.
Não há dúvida de que esses protestos tiveram repercussão política e são eco do descontentamento expressado em 2011 pelo movimento anticorrupção liderado por Anna Hazare. Naquele momento, as classes médias urbanas também saíram em massa pelas ruas. Esses dois movimentos mostram a agudização das diferenças entre uma Índia emergente com planos econômicos e culturais, e uma classe dirigente considerada ineficaz diante dos problemas do país e envolvida em casos de corrupção.
Além disso, as duas ondas de protesto marcam a chegada à vida pública de uma geração educada, que sabe aproveitar os meios de comunicação, utilizar redes sociais e formular palavras de ordem que considera justas. Se, em um primeiro momento, essa classe média reagiu reivindicando a possibilidade de consumo e o ensino superior, agora forma uma consciência coletiva que se organiza para reivindicar a segurança e a eficiência do Estado. Esse movimento faz nascer a esperança de futuras normas sociais mais progressistas e será determinante para o conjunto da sociedade.
As classes médias, contudo, ainda permanecem minoritárias, e as mudanças levarão tempo para se concretizar porque o país caminha em velocidades diferentes não só na questão dos direitos das mulheres de nascer, se alimentar, estudar e se igualar aos homens. O desenvolvimento econômico da Índia é profundamente desigual: não permite erradicar a desnutrição infantil, e mais de 37% dos indianos vivem em situação de pobreza absoluta. O crescimento tampouco permite a melhoria global das infraestruturas, notadamente o acesso à água e a amenização das desigualdades entre a cidade e o campo.
Além das fraturas mencionadas – modernidade e patriarcado, população e elite política –, há distâncias enormes entre os novos ricos e os esquecidos pelo crescimento, as regiões abastadas e as regiões pobres, ou entre o universo urbano e o rural. Essas disparidades ampliam o êxodo rural e provocam a expansão caótica das cidades, fenômeno que acentua a delinquência.Perante o cenário sociopolítico em mudança, essas múltiplas fraturas, contudo, rapidamente se tornarão insustentáveis social e politicamente.
Se o governo deseja responder positivamente à ira social desencadeada por esse estupro, deveria melhorar a polícia, aperfeiçoar as leis e garantir sua aplicação, além de ajudar ONGs a combater as discriminações seculares. De forma mais geral, deveria enfrentar o “mau desenvolvimento” socioeconômico, para retomar a expressão de Christophe Jaffrelo.11 Se a intervenção do Estado não é suficiente para mudar as mentalidades, as políticas com o objetivo de contribuir para o progresso social poderiam melhorar, no mínimo, a sorte de todas as mulheres do país.

Mulheres políticas, uma ascensão solitária

 Na Índia, mulheres conquistaram cargos políticos de primeiro escalão, mas esse processo não significou a melhoria das condições gerais de vida desse gênero na base da sociedade. Esse é um dos paradoxos desse país.
Indira Gandhi foi primeira-ministra de 1966 a 1977, depois de 1980 a 1984. Sua nora, Sonia Gandhi, preside o Partido do Congresso desde 1998. Oriunda dessa mesma legenda, Pratibha Patil ocupou a presidência da República (cargo honorífico) de 2007 a agosto de 2012, enquanto a Câmara Baixa do Parlamento (Lok Sabha) é dirigida por Meira Kumar desde 2009. O território de Déli também é governado por uma mulher, Sheila Dikshit, desde 1998.
Contudo, a desigualdade de gênero ainda permanece profunda. Dois fatores, em particular, impedem o mundo político de pesar de fato sobre a evolução da sociedade: a força das práticas sociais tradicionais e o pouco respeito às leis. Assim, apesar da legislação de 2005, que lhes garante o direito de receber a herança na mesma medida que os homens, a maioria das mulheres é privada de herança e excluída da titularidade de terras. Da mesma forma, 70% das indianas vivem na zona rural, onde permanecem geralmente submetidas ao pai ou ao marido e se beneficiam pouco do desenvolvimento econômico. Na lista geral dos 146 países classificados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) em termos de igualdade entre homens e mulheres, a Índia ocupa a posição 129 e, no sul da Ásia, perde apenas para o Afeganistão, que está em último lugar.
Na política, graças às cotas, as mulheres conquistaram 36,8% das cadeiras dos conselhos municipais das cidades, o que representa 1 milhão de eleitas em todo o país. Mas ocupam somente 10,8% das cadeiras no Lok Sabha, e um projeto de lei para instaurar uma cota de um terço de deputadas permanece suspenso desde 1996. (B.M.)

4  Terceira Pesquisa Nacional sobre a Família e a Saúde (National Family Health Survey - 3), 2006.
5  National Crime Records Bureau (NCRB). O número real de casos é desconhecido, porque muitas vítimas não prestam queixa.
6  Fonte: NCRB.
7  “Teach girls martial arts for protection: president” [Ensinar artes marciais às garotas para proteção: presidente], IBN Live, 2 nov. 2011. Disponível em: .

8  Cf. www.contreleviol.fr.
9  Office for Victims of Crime, US Department of Justice, Washington. Disponível em: .
10            “One conviction out of 635 rape cases in Delhi this year” [Uma condenação em 635 casos este ano, em Nova Déli], The Indian Express, Nova Déli, 30 dez. 2012.
11       Christophe Jaffrelot, Inde, l’envers de la puissance. Inégalités et révolte[Índia, o outro lado da potência. Desigualdades e revoltas], CNRS Éditions, Paris, 2012.
Bénedicte Manier
Jornalista, é autora de Quand les femmes auront disparu. L’élimination des filles en Inde et en Asie [Quando as mulheres desaparecerem. A eliminação de meninas na Índia e na Ásia], La Découverte, Paris, 2008.


Ilustração: Adnam Abidi / Reuters
1 Ministério do Trabalho e do Emprego da Índia.
2 “Government should do its part in ensuring safety of women in IT-BPO sector: Nasscom” [Governo deveria fazer sua parte para garantir a segurança da mulher no setor de tecnologia da informação: Nasscom], The Economic Times, Nova Déli, 4 jan. 2013.
3 Essa relação é ainda mais baixa no Punjab (893/1.000), em Haryana (877/1.000), no Rajastão (926/1.000) e em Nova Déli (866/1.000).

Zona de livre-comércio entre EUA e UE pode redefinir comércio mundial

Zona de livre-comércio entre EUA e UE pode redefinir comércio mundial

Publicado em Carta Capital

As duas maiores potências econômicas do mundo, a União Europeia e os Estados Unidos, iniciam conversas para se unir numa zona de livre comércio em breve. Porém, os obstáculos são gigantescos, já que as metas de ambos são ambiciosas.
Economistas, políticos e empresários aclamam unanimemente a ideia de que uma zona livre iria impulsionar o crescimento dos dois lados do Oceano Atlântico. E asseguraria que, num futuro próximo, as regras do jogo na economia sejam ditadas pelo Ocidente, e não pela China.

O tratado representaria a consolidação dos maiores mercados do mundo e seria uma resposta eficaz à ameaça de hegemonia chinesa
O tratado representaria a consolidação dos maiores mercados do mundo e seria uma resposta eficaz à ameaça de hegemonia chinesa

Os dados econômicos confirmam: um tratado amplo de livre comércio seria, de fato, o que se denomina um game changer, ou seja, ele redistribuiria as cartas no pôquer do comércio mundial. Pois os negócios entre a UE e os EUA representam a maior parceria econômica bilateral do mundo, envolvendo um intercâmbio de bens em serviços num valor superior a 1,8 bilhão de euros. Juntas, as duas potências, somando 800 milhões de habitantes, controlam metade da oferta de serviços em todo o mundo e cerca de um terço do fluxo global de mercadorias.

Boas perspectivas

Segundo estimativas da UE, um tratado amplo de livre comércio com os Estados Unidos aumentaria o Produto Interno Bruto europeu em 0,5%, ou 65,7 bilhões de euros por ano; e os ganhos para os norte-americanos seriam comparáveis. Além disso, devido às proporções dos mercados envolvidos, uma unificação transatlântica dos padrões industriais e dos procedimentos de licenciamento transformariam essas normas, de fato, em padrões mundiais, com especial vantagem para a forte indústria europeia.
Acordo de livre comércio UE-EUA seria chance de fazer frente ao avanço comercial da China
Acordo de livre comércio UE-EUA seria chance de fazer frente ao avanço comercial da China

A proposta de uma zona transatlântica de livre comércio conta com grande apoio dentro da UE. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o primeiro-ministro britânico, David Cameron, já se manifestaram a favor do projeto. E tanto o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, quanto o chefe de Estado norte-americano, Barack Obama, são, em princípio, favoráveis desde meados de 2012, quando um grupo de trabalho euro-americano divulgou um relatório parcial positivo sobre as oportunidades de um convênio.
O relatório final desse grupo transatlântico deverá ser conhecido nos próximos dias, e espera-se que contenha a recomendação para o início das negociações. No entanto, ainda assim, é totalmente incerto que essa zona de livre comércio venha a se tornar realidade.

Harmonização de normas: um problema

“Um tratado amplo de livre comércio iria mais longe do que todos os acordos comerciais que firmamos até agora. Será que chegaremos lá? Não será fácil, mas as perspectivas são boas”, declarou em dezembro último o comissário da UE para o Comércio, Karel de Gucht.
De fato, em comparação, não passam de bagatelas tanto o recente tratado comercial entre a UE e Cingapura, quanto o acordo com o Canadá, prestes a ser concluído, ou tratados anteriores com a Coreia do Sul ou o México.
Daniel Gros, Direktor do Centre for European Policy Studies, sediado em Bruxelas, é inteiramente a favor de um convênio com os EUA. “Só não creio que a vontade política seja forte bastante para superar todas as resistências”, pondera.
No caso de um acordo em grande escala, a diminuição das barreiras alfandegárias transatlânticas, já bastante reduzidas, nem seria o principal problema. Tampouco é intransponível a questão da agricultura – um setor econômico tradicionalmente sensível, de ambos os lados do Atlântico, por ser fortemente regulamentado pelo Estado.
“O grande problema é a independência dos diferentes órgãos reguladores”, afirma Gros, mencionando, como exemplo, a Food and Drug Administration (FDA), responsável nos EUA pela regulamentação de medicamentos. “Este é um tema muito delicado. O órgão norte-americano será capaz de simplesmente aceitar uma certificação europeia e vice-versa?”

Engenharia genética e produtos financeiros

O mesmo vale para o licenciamento e regulamentação de numerosas mercadorias e serviços. Por exemplo: a UE exige a identificação de alimentos transgênicos, enquanto os EUA, não. Também teriam que ser considerados serviços complexos e até então sujeitos a regulamentos diversos, como seguros e produtos financeiros.
Alimentos transgênicos esbarram em forte resistência na União Europeia
Alimentos transgênicos esbarram em forte resistência na União Europeia

“Acho pouco realista esperar que um tratado de livre comércio possa harmonizar todas essas normas”, comenta Charles Ries, vice-presidente da Rand Corporation, de Washington. Ele é a favor de uma versão menor: “Eu visaria um tratado de livre comércio que eliminasse todas as taxas alfandegárias e quotas entre os Estados Unidos e a Europa”. Ries participou das negociações do Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta, na sigla original), entre o seu país, o México e o Canadá.
No entanto, os EUA e a UE pretendem jogar a grande cartada. “Na verdade, as tarifas alfandegárias não pesam tanto assim no comércio transatlântico”, assegura John Clancy, porta-voz do comissário europeu do Comércio, Gucht. “Os grandes obstáculos são as diferentes normas de licenciamento e padrões. Por isso, não queremos apenas acabar com as taxas, mas sobretudo visar uma harmonização dessas normas.”

Trauma de Doha

Observadores especializados estão céticos de que o plano possa ter sucesso. Eles lembram que há anos a visão do livre comércio transatlântico paira sobre os debates políticos em Washington e Bruxelas, sem nunca se tornar realidade.
Por muito tempo, os EUA também estiveram extremamente reticentes em apoiar esse megaprojeto. Após anos de negociações – por fim fracassadas – em torno de um tratado mundial de livre comércio, o assim chamado Acordo de Doha, o país não estava disposto a novamente se empenhar em conversações intermináveis e sem perspectivas.
Assim, para sondar o grau de seriedade dos europeus, a administração Obama exigiu um sinal bem claro do Bruxelas. E este veio: na segunda-feira (04/02), a UE anunciou que a partir de 25 de fevereiro estará permitida a importação de porcos vivos e de carne de vaca tratada com ácido lático, originários dos Estados Unidos.
Porém, mesmo que a UE e os EUA iniciem as negociações oficiais nos próximos meses, o sucesso está longe de ser garantido. Pois os negociadores de Washington e da Comissão Europeia não agem com autonomia absoluta. Sem o aval final do Congresso norte-americano e do Parlamento Europeu, não há acordo. E outros parceiros terão que participar das negociações, pelo menos em caráter informal: tanto a Turquia – estreitamente associada à UE através de um acordo alfandegário – quanto o México e o Canadá – ligados aos EUA através do Nafta.

Cronograma rigoroso

Deste modo, Estados Unidos e analistas reivindicam negociações ágeis, dentro de um cronograma bem definido. Segundo os analistas, um ano após o início das conversações, deverá se alcançar um consenso básico, e no prazo de dois a três anos, o tratado deverá estar fechado.
No entanto, os riscos políticos de uma zona transatlântica de livre comércio continuam sendo difíceis de calcular, na opinião de Daniel Gros. “Quando se inicia um grande projeto mas ele não é levado até o fim, talvez a situação para os participantes fique pior do que se nem o tivessem começado.”

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Coreia do Norte desafia o mundo com novo teste nuclear

Coreia do Norte desafia o mundo com novo teste nuclear

Publicado rm Carta Capital
O terceiro teste nuclear norte-coreano aconteceu nesta terça-feira 12
O terceiro teste nuclear norte-coreano aconteceu nesta terça-feira 12

A Coreia do Norte confirmou nesta terça-feira 12 que realizou com êxito seu terceiro e mais potente teste nuclear, utilizando um artefato “miniaturizado”, em um gesto que provocou reações imediatas de condenação de grande parte da comunidade internacional.
O governo do fechado regime comunista afirmou que o teste é uma resposta à “hostilidade” dos Estados Unidos, seu inimigo declarado.
“Confirmou-se que o teste nuclear foi realizado em alto nível e de forma segura e perfeita”, afirmou a agência estatal KCNA. De acordo com a nota, o teste nuclear usou “um dispositivo nuclear em miniatura, mais leve com maior força explosiva e que não causou danos ao meio ambiente”, disse a KCNA.
O Conselho de Segurança da ONU convocou uma reunião de emergência para as 12 horas de Brasília, em Nova York. Em Viena, a Organização do Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares afirmou que a explosão constituiu uma “clara ameaça à paz e à segurança”.

Capacidade nuclear

A informação que mais causa alarme na comunidade internacional é o uso de um dispositivo “miniaturizado”, o que, em outras palavras, indica que o governo norte-coreano alcançou um nível de tecnologia suficiente para fabricar um artefato nuclear que poderia ser instalado em um míssil de longo alcance.
Em dezembro, Pyongyang executou um teste de lançamento de foguete para colocar um satélite em órbita, ação que demonstrou os avanços norte-coreanos na área da tecnologia de mísseis.
Na área técnica, analistas tentam descobrir agora se a Coreia do Norte utilizou parte de suas escassas reservas de plutônio ou se utilizou urânio em uma nova opção de desenvolvimento para detonações atômicas.
De acordo com uma fonte do ministério da Defesa da Coreia do Sul, a explosão desta terça-feira 12 teve uma potência de seis a sete quilotons, aproximadamente a metade do que foi utilizado pelos Estados Unidos na cidade japonesa de Hiroshima em 1945, ao final da Segunda Guerra Mundial.
Sul-coreanos queimam uma bandeira da Coreia do Norte em Seul. Foto: ©afp.com / Kim Jae-Hwan
Sul-coreanos queimam uma bandeira da Coreia do Norte em Seul. Foto: ©afp.com / Kim Jae-Hwan
Também de acordo com fontes sul-coreanas, o primeiro teste nuclear norte-coreano, em 2006, teve potência de menos de um quiloton e muitos cientistas o consideraram um fracasso. O teste de 2009, no entanto, usou de dois a seis quilotons.
A Coreia do Norte anunciou que estava enriquecendo urânio em 2010, quando permitiu a visita de especialistas estrangeiros a um complexo nuclear de Yongbyon. No entanto, muitos analistas acreditam que o país comunista fabrica armas de urânio enriquecido há muito tempo em outras instalações secretas.
Retaliações
Horas após o anúncio do teste nuclear norte-coreano, a comunidade internacional já se unia em críticas e preocupações em relação ao regime comunista norte-coreano, liderado por Kim Jong-il.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pediu uma resposta rápida da comunidade internacional a um teste nuclear que chamou de “provocação”. Enquanto o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, considerou o teste “profundamente desestabilizador”.
O primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, declarou que o teste nuclear norte-coreano era “extremamente lamentável” e uma ameaça grave para a segurança japonesa.
Já o vizinho e principal aliado do regime de Pyongyang, o governo chinês reiterou a “firme oposição” ao teste nuclear norte-coreano em um comunicado do ministério das Relações Exteriores, que não utiliza a palavra “condenação”. No comunicado, a China defende o fim dos programas nucleares na península e estimula Pyongyang a “não levar adiante nenhuma ação que agrave a situação”.
Também defende a retomada das negociações multilaterais (entre as duas Coreias, Rússia, China, Estados Unidos e Japão) sobre o programa nuclear de Pyongyang. Washington, aliado da Coreia do Sul e Japão, reiterou que manterá a vigilância e os compromissos de defesa com os aliados na Ásia.
A Rússia, por outro lado, pediu à Coreia do Norte o fim das atividades ilegais e o respeito a todas as diretrizes do Conselho de Segurança da ONU.
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) destacou que o país violou as resoluções das Nações Unidas ao executar o teste nuclear. ”Isto é lamentável e uma clara violação”, afirmou Yukiya Amano, diretor da AIEA. A União Europeia (UE) condenou o teste norte-coreano, que chamou de “desafio flagrante” ao regime global de não proliferação e violação das obrigações internacionais de Pyongyang. Mais firmes, os governos da Alemanha e da França defenderam novas sanções do Conselho de Segurança da ONU contra a Coreia do Norte.
A Coreia do Norte realizou testes com explosões nucleares em 2006 e 2009. A explosão desta terça-feira causou um terremoto de 5,1 graus que sacudiu o país às 11h58 locais.

Entenda como será a eleição do próximo papa

Entenda como será a eleição do próximo papa

Publicado em Carta Capital

 Imagem de 16 de abril de 2005 mostra a capela Sistina pronta para o conclave que elegeu Joseph Ratzinger como o novo papa. Foto: Pierpaolo Cito / AFP

Imagem de 16 de abril de 2005 mostra a capela Sistina pronta para o conclave que elegeu Joseph Ratzinger como o novo papa. Foto: Pierpaolo Cito / AFP

A data de 28 de fevereiro, anunciada na segunda-feira 11 pelo papa Bento XVI como o dia em que renunciará ao cargo, não foi estabelecida de forma aleatória. A eleição para substituí-lo precisa ter início em, no máximo, 20 dias após a vacância do papado, como determina a Constituição do Vaticano, o que obriga os cardeais eleitores a se reunirem, e tomarem uma decisão, ainda em março. Assim, antes da Páscoa (que em 2013 ocorre em 31 de março), quando os cristãos celebram a ressurreição de Jesus Cristo, a Igreja Católica terá um novo líder.
As regras para a realização do conclave, a eleição do novo papa, foram estabelecidas e atualizadas na Constituição Apostólica, assinada por João Paulo II. Qualquer homem católico batizado pode ser escolhido como papa, mas apenas cardeais foram eleitos desde 1378. Participam da votação somente os cardeais com menos de 80 anos. Hoje há 117 eleitores aptos, 50 nomeados por João Paulo II e 67 por Bento XVI. A maioria (61) é da Europa. Há ainda 19 latino-americanos, 14 de Estados Unidos e Canadá, 11 africanos, 11 asiáticos e um da Oceania.
O processo eleitoral é coordenado por uma congregação formada pelo cardeal camerlengo, o administrador da propriedade e receita da Santa Sé, e por três cardeais assistentes. Desde 2007, o camerlengo é o italiano Tarcisio Bertone, ex-arcebispo de Gênova. Os assistentes são definidos por sorteio e têm “mandatos” de apenas três dias, sendo posteriormente substituídos após um novo sorteio. Essa comissão tem poder apenas para cuidar da eleição e tratar de assuntos urgentes, mas não pode tomar decisões de atribuição exclusiva do papa.
A Constituição Apostólica é uma admissão de que os cardeais não são santos. Há uma série de mecanismos e restrições para garantir a transparência do conclave e evitar fraudes ou influências indevidas sobre a votação.
Durante o conclave, os cardeais são obrigados a trajar a batina preta filetada e a faixa vermelha, com o solidéu, cruz peitoral e anel e devem-se manter em completo isolamento, não podendo trocar correspondência epistolar, telefônica ou por outros meios de comunicação com pessoas estranhas ao âmbito da eleição. Todas as pessoas que estarão no Vaticano durante a eleição, como os responsáveis por alimentação e limpeza, ou mesmo religiosos de nível inferior, estão proibidas de conversar com os cardeais.

As votações são administradas por nove cardeais também sorteados. Três são os “escrutinadores”, que contam os votos, três são os infirmarii, responsáveis por recolher os votos dos cardeais eventualmente doentes, e três são revisores da votação. Para o papa ser eleito, ele precisa de dois terços dos votos. No caso do sucessor de Bento XVI, serão necessários 78 votos (dois terços de 117). É na primeira votação que os cardeais descobrem quão favorito é cada um dos candidatos. “Até a primeira votação, você não sabe quem realmente tem força e quem não tem”, disse ao jornal norte-americano Chicago Tribune o arcebispo de Chicago, Francis George.
Caso não seja obtida a maioria de dois terços, os cardeais passam por um período de três dias nos quais devem realizar duas votações, uma pela manhã e outra à tarde, em busca de um consenso. Se não tiverem sucesso, os cardeais podem realizar mais três séries de sete votações, entremeadas por curtos períodos de “oração, de livre colóquio entre os votantes e de uma breve exortação espiritual”. Se ainda assim não houver consenso, realiza-se uma votação entre os dois cardeais mais votados.
A cada votação, as cédulas e as anotações dos cardeais são queimadas. Se o voto não tiver sucesso, a chaminé da Capela Sistina emitirá uma fumaça preta. Quando o nome do novo papa for definido, a chaminé soltará uma fumaça branca. Momentos depois, o protodiácono do Vaticano, atualmente o francês Jean-Louis Tauran, aparece na varanda central da Basílica de São Pedro para informar, com a frase habemus papam, que um novo papa foi escolhido e aceitou a nomeação. Após o anúncio, o novo papa é apresentado ao povo e dá a primeira bênção.

Pressões políticas podem ter influenciado Bento XVI

Pressões políticas podem ter influenciado Bento XVI

Publicado em Carta Capital

O anúncio da renúncia do Papa Bento XVI nesta segunda-feira 11 causou surpresa, mas não pode ser considerado um movimento tão inesperado. Em meio a um mandato marcado por tensões com outros líderes religiosos, novos casos de pedofilia envolvendo clérigos e a demanda por uma Igreja Católica mais aberta, Joseph Ratzinger vivia sob constante pressão. Algo que tornou-se mais evidente em delicados escândalos, como o do mordomo mandado para a prisão por revelar documentos que deixavam claro o jogo de poder nos corredores do Vaticano.
Papa Bento XVI no dia 25 de novembro de 2012 na Basílica de São Pedro. Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto
Papa Bento XVI no dia 25 de novembro de 2012 na Basílica de São Pedro. Foto: ©AFP / Vincenzo Pinto

Em uma carta, Ratzinger afirma ter refletido repetidamente até concluir não ter mais “forças, devido à idade avançada (…) para exercer adequadamente o ministério petrino”. Embora isso não seja novidade, uma vez que ele assumiu o posto aos 77 anos, em 19 de Abril de 2005, o pontífice não mencionou nos últimos anos nenhuma doença grave que poderia afasta-lo de suas funções. Realizou recentemente, inclusive, um longo discurso a cardeais sem grandes problemas.
É preciso, então, avaliar as forças políticas do Vaticano, um monastério absolutista sobre o qual o Papa tem mandato vitalício e controla sozinho os poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. Sem mencionar alguns aspectos das diretrizes econômicas do Estado independente cravado no centro da Itália. É, portanto, um cargo sujeito a pressões de todos os tipos. Algo que pode ter contribuído para a renúncia.
“O Papa vinha enfrentando problemas políticos entre os grupos [da Igreja]. Basta ver no ano passado quando o mordomo vazou documentos secretos. Tudo isso cria um conjunto de fatores políticos sérios que o desgastaram ainda mais na idade dele”, diz o teólogo Rafael Rodrigues da Silva, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Logicamente, isso não vai aparecer de maneira oficial.”
O Vaticano, comenta o desembargador aposentado Walter Mairovitch, colunista de CartaCapital, é notório por guardar bem seus segredos. “No caso do mordomo, há várias notícias de um movimento contrário ao Papa e até um carta com uma ameaça de morte. Houve ainda o escândalo do Banco do Vaticano, em que se viu que o Papa tinha muita dificuldade de impor as regras mínimas da União Europeia contra a lavagem de dinheiro.”
Segundo Silva, a Igreja está rachada em três grupos: o que levou Ratzinger ao poder, um mais liberal e outro conservador, que figuram no aspecto político e econômico do Vaticano. “O caso dos vazamentos mostra claramente que há um grupo totalmente contrário ao Papa atual. E isso desgasta qualquer agente político.”


Foto: Hermenpaca/Flickr
Pressões políticas podem ter influenciado decisão do Papa. Foto: Hermenpaca/Flickr

Um desgaste capaz de fazê-lo tomar uma decisão quase sem precedentes na Igreja Católica. Bento XVI se tornará o primeiro Papa a renunciar nos últimos 600 anos. O último foi Gregório XII, que deixou o cargo em 1415. “Estou bem consciente de que este ministério, pela sua essência espiritual, deve ser cumprido não só com as obras e com as palavras, mas também e igualmente sofrendo e rezando. [...] É necessário também o vigor, quer do corpo, quer da mente; vigor este que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado”, disse.
Na carta, Bento XVI afirma estar “consciente da gravidade deste ato, com plena liberdade” e define a decisão como de grande importância “para a vida da Igreja”. E de fato será. Os cardeais, que devem anunciar um substituto até março, não poderão ignorar que o secularismo vem ganhando espaço no mundo e que a sociedade espera mudanças no posicionamento da Igreja sobre temas como o uso de preservativos. “Quando ele diz que não tem plenas forças para continuar, poderia se esperar que a igreja teria uma posição rumo À modernidade, com um sucessor mais jovem”, aponta Maierovitch.
O papado de Bento XVI, diz Silva, foi uma transição ao João Paulo II e a renúncia indica que já cumpriu seu papel. O que abre espaço para as especulações sobre o seu substituto. Pela primeira vez, a Igreja Católica poderia ser chefiada por um não-europeu. Entre os nomes cotados estão o dos brasileiros dom Odilo Pedro Scherer, arcebipso de São Paulo, e João Braz de Aviz, do departamento de Congregações Religiosas do Vaticano. O argentino Leonardo Sandri, do departamento de Igrejas Ocidentais, é outro cotado.
As mudanças poderiam ocorrer também na condução da Igreja, que não enfrenta uma “revolução” desde o Concílio do Vaticano II, entre 1962 e 1965. À época, o Papa João XXIII e bispos de todo o mundo modernizaram a igreja para estancar a perda de fieis. Como resultado, as missas deixaram de ser rezadas em latim com o padre de costas para o público, para acontecerem no idioma local. “A expectativa é ter um sucessor que siga o caminho de abertura pelo Vaticano II, algo que Paulo II e Bento XVI representaram um retrocesso”, acredita Silva.