quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Sem governo, Tunísia caminha para o limbo político

Sem governo, Tunísia caminha para o limbo político

 José Antônio Lima

 Publicado em Carta Capital

Jebali durante reunião com o presidente da Tunísia, Moncef Marzouki, nesta terça-feira 19, na qual anunciou sua renúncia. Foto: Fethi Belaid / AFP
Jebali durante reunião com o presidente da Tunísia, Moncef Marzouki, nesta terça-feira 19, na qual anunciou sua renúncia. Foto: Fethi Belaid / AFP

A crise política que afeta a Tunísia desde o início de fevereiro, quando o líder oposicionista Chokri Belaid foi assassinado, se tornou mais grave nesta terça-feira 19. O premier Hamadi Jebali, que tentava formar um governo tecnocrático para estabilizar o país, renunciou ao cargo. Sem Jebali, a Tunísia deve passar por um período ainda mais conturbado até que uma solução seja encontrada.
Jebali fez seu anúncio em entrevista coletiva. Foi o cumprimento de uma promessa realizada no início das negociações por um novo governo. “Hoje há um grande desapontamento na população e precisamos reconquistar sua confiança”, afirmou Jebali. “Está renúncia é o primeiro passo”. As palavras do agora ex-premier são um recado a seu próprio partido, o Ennahda, entidade islâmica que possui maioria no Parlamento e governa a Tunísia desde a queda do ditador Zine el-Abidine Ben Ali, o primeiro governante árabe a deixar o poder por conta de manifestações populares da chamada Primavera Árabe.


A formação de um governo com burocratas no lugar de políticos foi bloqueada pelo Ennahda. Na segunda-feira, Jebali fez reuniões com líderes de diversas siglas, mas não conseguiu um consenso, justamente por conta de seu partido. O líder linha-dura do Ennahda, Rached Ghannouchi, se recusa a abrir mão do poder obtido nas urnas e enxerga a crise política como uma tentativa de tirar seu grupo político de cena.
De fato, a Tunísia está polarizada. Como mostrou reportagem de Gianni Carta, o Ennahda e outros partidos islâmicos mais radicais, são acusados de querer reislamizar a Tunísia, o país mais secular entre os de maioria muçulmana do Oriente Médio e Norte da África. Ao mesmo tempo, a oposição é chamada de “antirrevolucionária a serviço de uma agenda ocidental”. Este clima de tensão provocou, nos últimos dias, diversos confrontos violentos entre partidários dos dois lados e entre eles e a polícia tunisiana.
Na raiz da crise, além da disputa por poder, está a recusa dos partidos islâmicos de abdicarem do poder obtido na sequência da Primavera Árabe. O Ennahda, assim como a Irmandade Muçulmana no Egito, passou anos na ilegalidade, com seus integrantes exilados e presos. Ainda assim, os grupos religiosos conseguiram se organizar rapidamente para as eleições e tiveram ótimos resultados. Uma vez no poder, temem que qualquer crise seja uma tentativa de afastá-los da cena política mais uma vez. No último sábado, Ghannouchi, líder do Ennahda, afirmou a milhares de partidários que seu partido “nunca irá abandonar o poder enquanto tiver a confiança do povo e a legitimidade das urnas”. Ocorre que, nem sempre, governos eleitos democraticamente conseguem formar uma ampla aliança capaz de garantir a governabilidade. Em democracias nascentes, com um lado suspeitando do golpismo do outro (e vice-versa), isso pode ser a receita para o desastre.

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