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segunda-feira, 18 de março de 2013

O PAPA DAS AMÉRICAS

O PAPA DAS AMÉRICAS

ESCOLHA INÉDITA SURPREENDE E EMOCIONA MILHARES DE FIÉIS
Autor(es): Deborah Berlinck
O Globo - 14/03/2013
 

fumaça branca. Novo Papa mostra humildade e senso de humor ao falar pela 1ª vez como Pontífice à multidão que foi acompanhar o anúncio na
ROMA Um Papa que se curva diante da multidão e pede: "rezem por mim". E os fiéis silenciaram. Jorge Mario Bergoglio, de 76 anos, surpreendeu a todos ontem não apenas por ser o primeiro latino-americano, argentino e jesuíta da história da Igreja Católica a se tornar Papa - e o primeiro não europeu em mais de 1.200 anos -, como pelo gesto. Suas primeiras palavras para milhares de pessoas que aguardaram horas na chuva e no frio o anúncio do novo líder da Igreja, foram simplesmente:
- Irmãos e irmãs, boa noite!
Treze dias depois da inusitada renúncia de Bento XVI - a primeira em 600 anos -- o Papa Francisco, nome que ele escolheu em homenagem a São Francisco de Assis, foi eleito o novo Pontífice, enterrando a tão anunciada disputa entre os cardeais italiano Angelo Scola e o brasileiro Odilo Scherer. O argentino, filho de imigrante italiano, que sequer aparecia entre os 15 ou 20 mais cotados, foi eleito após cinco rodadas de votação no conclave e com o apoio de ao menos 77 de 115 cardeais.
A fumaça branca na chaminé da Capela Sistina anunciando sua escolha surgiu às 19h06 (15h06 de Brasília), gerando gritos de emoção na Praça de São Pedro, ao som dos sinos da Basílica. Uma hora depois, as cortinas vermelhas do balcão da basílica se abriram. O cardeal francês Jean-Louis Tauran anunciou:
- Habemus Papam!
Para um Vaticano tão ligado à tradição e ao peso da liturgia, a simplicidade do jesuíta que apareceu em sua batina branca na imponente janela de cortinas vermelhas da Basílica de São Pedro emocionou os fiéis. Acostumados nos últimos oito anos ao Papa Bento XVI, considerado intelectualmente brilhante, mas tímido e sem carisma, a virada do argentino foi instantânea.
O Papa Francisco saudou a multidão também com uma tirada de humor, divertindo os fiéis.
- Vocês sabem que o dever de um conclave era dar um bispo a Roma. Parece que meus amigos cardeais foram quase até o fim do mundo para buscá-lo. Mas aqui estamos - disse o novo Papa.
O Papa agradeceu aos fiéis pela acolhida. E em seguida disse que, "antes de mais nada" gostaria de fazer uma oração pelo Papa Emérito Bento XVI. Momentos antes, ele havia telefonado para Bento e prometido visitá-lo nos próximos dias.
A eleição de Bergoglio foi uma total surpresa. Seu nome não era citado na imensa maioria das listas de prováveis Papas. Não porque não fosse apreciado, mas sim por conta de um detalhe que todos imaginaram que pesaria na hora do voto: sua idade avançada. Bento XVI tinha 78 anos quando foi eleito e renunciou oito anos depois alegando não ter mais forças para comandar a Igreja. O embaixador do Brasil no Vaticano, Almir de Sá Barbuda, também imaginou que a idade influenciaria:
- A grande surpresa foi a idade. Por causa disso ele não estava nas listas que estavam há muito tempo correndo. Pensava-se que iria ser eleito um Papa mais jovem - disse o embaixador.
O governo brasileiro, segundo ele, também recebeu a notícia com surpresa, mas ficou satisfeito:
- É um Papa sul-americano e isso é muito bom para todos. O discurso dele foi ótimo, de uma grande humildade. Acho que será um grande Papa. Ficamos todos contentes - disse Barbuda, definindo o novo Papa como "conservador, mas com ideias novas, capaz de fazer mudanças".
SURPRESA ATÉ PARA COMPATRIOTAs
O que a maioria dos vaticanistas não considerou foi a popularidade aparentemente intacta do argentino entre os cardeais. Bergoglio teria sido o segundo mais votado no conclave de 2005, depois de Joseph Ratzinger. Sua escolha reforça a importância da América Latina, que abriga 42% dos católicos no planeta, para a Igreja e a percepção de que o futuro do Catolicismo está no Hemisfério Sul.
Caberá a Francisco o papel de dar um novo rumo a uma Igreja abalada por escândalos financeiros, vazamento de documentos no caso VatiLeaks e por denúncias de pedofilia envolvendo religiosos. Deverá lidar ainda com o desafio de oferecer mais transparência às operações do Banco do Vaticano e atender aos clamores por uma reforma da Cúria Romana.
O anúncio surpreendeu padres argentinos que estavam na Praça de São Pedro.
- Bergoglio? Bergoglio? - perguntava, incrédulo, Sebastian Sangoi, de 32 anos.
Seu colega, o padre Carlos Rubia, também não acreditava:
- Escutei bem? É Bergoglio?
Emocionado, Sebastian disse que passaria a noite celebrando a escolha do Papa conterrâneo "com cerveja", junto com padres. A escolha, para ele, não poderia ter sido tão acertada:
- Ele é um homem simples, que anda de ônibus e pega o metrô na Argentina, muito sensível e próximo ao povo - disse Sebastian.
Outro argentino, Claudio Mariani, de 47 anos, acreditava que um brasileiro tivesse mais chances. Emocionado, ele já vê uma mudança de direção na Igreja:
- Ele faz coisas para o povo e em algum momento vai fazer as pessoas voltarem para a Igreja e terem mais fé, que está um pouco perdida.
A brasileira Márcia Zanol, de 44 anos, foi à Praça de São Pedro com um cartaz "Papa brasileiro: eu acredito!" Saiu com o cartaz enrolado, mas feliz:
- Independemente da nacionalidade, a gente sabe que ele certamente é uma pessoa do bem, da América do Sul.
A maioria dos brasileiros compartilhava a opinião de Márcia. Mas alguns não resistiram e confessaram:
- Pessoalmente, não era minha escolha. Até agora, nada de sentimento ou simpatia por ele. Mas vamos esperar para ver -disse Cristiane Serqueira, 33 anos.
O mineiro Giovanni Douglas, 40 anos, homossexual, gritava com um grupo de amigos "Francisco, Francisco, viva o Papa!". Apesar de achar que a Igreja não trata bem os homossexuais, ele disse que se sente católico:
- Quando ouvi o nome Francisco, me vieram lágrimas. É maravilhoso. Francisco é um nome muito simbólico. Esperamos que traga mais modernidade para a Igreja, uma mudança, mais inclusão.
Horas antes do anúncio ele discutia com um jovem seminarista a discriminação da Igreja em relação aos homossexuais:
- Sou gay e sofri durante anos esta paranóia católica de que vou para o inferno porque Deus não gosta. Mas não desisti de Deus nem do cristianismo. Não acredito na Igreja. Acredito no cristianismo.

FRANCISCO, O PAPA ARGENTINO

FRANCISCO, O PAPA ARGENTINO

FRANCISCO, UM PAPA LATINO-AMERICANO
Autor(es): Andrei Netto Jamil Chade José Maria Mayrink
O Estado de S. Paulo - 14/03/2013
 

Primeiro pontífice do continente americano, Jorge Mario Bergoglio, 76 anos, é também o 1º jesuíta a ocupar trono de Pedro • Escolha surpreendeu fiéis e analistas • Seu nome rompeu impasse entre grupos pró e contra a Cúria
Habemus papam
Jorge Mario Bergoglio, de 76 anos, foi eleito ontem o 266º papa na quinta votação, no segundo dia de conclave. Arcebispo de Buenos Aires, o primeiro pontífice do continente americano é também o primeiro jesuíta e o primeiro Francisco, nome que adotou, a ocupar o trono de Pedro, informam os enviados especiais Jamil Chade, José Maria Mayrink e Andrei Netto. A fumaça branca saiu da chaminé da Capela Sistina, sinalizando a decisão dos 115 cardeais, às 19h10 (15h10 em Brasília). Uma hora depois, o argentino apareceu no balcão da Basílica de São Pedro, para uma Praça São Pedro lotada. Em seu pronunciamento, pediu aos católicos, que somam 1,2 bilhão, que empreendam "um caminho de fraternidade e de amor". Uma surpresa para o mundo, seu nome rompeu o impasse entre os dois grupos, pró e contra Cúria, que haviam se formado nos últimos dias, derrotando o italiano Angelo Scola e o brasileiro Odilo Scherer. Para analistas, os cardeais escolheram o "papa possível", que deverá conduzir a Igreja para uma transição que se acreditava finalizada com a renúncia de Bento XVI.
Numa escolha surpreendente, conclave de dois dias elege o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, um jesuíta austero de 76 anos, o primeiro pontífice de fora da Europa em 1.300 anos.
Foi uma surpresa geral. Os fiéis que lotavam ontem, a Praça São Pedro, entre os quais centenas de padres e freiras, precisaram de alguns minutos para entender o nome do papa eleito, antes de aplaudi-lo. "Eu vos anuncio uma grande alegria: temos papa, o digníssimo senhor Jorge Mario, cardeal Bergoglio, que escolheu o nome de Francisco", comunicou o protodiácono Jean-Louis Tauran, cardeal francês, do balcão central da Basílica de São Pedro. Argentino, Francisco entra para a história da Igreja Católica como o primeiro papa latino-americano. Havia quase 1,3 mil anos que o escolhido era do continente europeu.
O mundo conheceu o nome do 266° homem a ocupar o trono de Pedro às 20h12 (16h12 em Brasília), uma hora e sete minutos após a fumaça branca ter saído da chaminé da Capela Sistina, onde o Colégio Cardinalício fez uma votação na terça-feira e quatro ontem. Mais de 50 mil pessoas acompanharam o anúncio na Praça São Pedro, apesar da chuva que caiu ao longo de todo o dia e de uma temperatura em tomo dos 8ºC.
Em sua primeira mensagem aos fiéis, após aparecer na sacada da basílica, Francisco agradeceu aos fiéis e afirmou que gostaria de fazer uma oração a Bento XVI, a quem chamou de "nosso bispo emérito". Hoje, Francisco visitará Bento XVI, em Castel Gandolfo.
Jesuíta, considerado austero, Francisco é arcebispo emérito de Buenos Aires. Em 2005, teve grande votação no conclave que elegeu Bento XVI. Há 27 anos, porém, cardeal Bergoglio é alvo de grupos de direitos humanos na Argentina. Para parte dos militantes, ele ilustra o silêncio da Igreja sobre crimes praticados pelo regime militar (1976-1983). Nos últimos anos, sofreu um revés em seu país com a aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A MISSÃO DE FRANCISCO

A MISSÃO DE FRANCISCO

PAIXÃO À PRIMEIRA BÊNÇÃO
Autor(es): » DIEGO AMORIM Enviado especial
Correio Braziliense - 14/03/2013
 

Maior desafio do novo pontífice é tirar a Igreja Católica da crise e levá-la para mais perto do povo.
Primeiro jesuíta, e também latino-americano, a sagrar-se papa, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, 76 anos, pertence a uma ordem que se notabilizou por levar o catolicismo a regiões recém-descobertas, como as missões que catequizaram índios no Brasil e em países vizinhos. Por isso, sua eleição sinaliza que a Igreja Católica fez uma clara opção: quer estar mais perto do povo, com menos pompa e mais trabalho de evangelização, à imagem e semelhança de seu novo líder. Avesso à ostentação, Bergoglio trocou a vida em palácio por um apartamento simples, prepara a própria comida, deixou de lado motorista e carro oficial para andar de metrô e ônibus. Não à toa, decidiu chamar-se Francisco. Seria homenagem a São Francisco de Assis, que renunciou à vida mundana, virou frade e acabou liderando a renovação da Igreja à época. Mas, para a Argentina, a eleição de Bergoglio é controversa. Pesam contra ele, no país, denúncias de que colaborou no sequestro de dois jesuítas e de bebês durante a ditadura militar. Ele nega.
I - Retomar o dom evangelizador
O Latino-americano Bergoglio precisa se voltar para os povos mais pobres e dar a eles a atenção especial que o Vaticano nunca ofereceu.
II - Reexaminar o papel da Igreja
João XXIII propôs um retorno em cinco séculos para que a Igreja fizesse um autoexame. Daí surgiu o Concílio Vaticano II.
III - Reformara Cúria Romana
Espera-se que o novo pontífice acabe com as divisões internas e escolha assessores capazes de traduzir os anseios da comunidade.
IV - Restaurar a credibilidade
Escândalos como os do banco do Vaticano e do VatiLeaks minaram a confiança na administração dos assuntos internos da Igreja.
V - Estancar a fuga de fiéis
Terá que recuperar o terreno perdido para os evangélicos e para o islamismo e conter a diminuição do catolicismo na Europa.
VI - Combater com rigor a pedofilia
As famílias e as vítimas de abusos sexuais cobram ações e respostas mais rápidas do Vaticano na apuração das denúncias.
VII - Conviver com a sombra de Bento XVI
Como há mais de 600 anos não acontecia, Francisco terá que reger seus fiéis com seu antecessor ainda vivo e influente.

Ao anoitecer do segundo dia de conclave, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio surpreendeu a multidão de fiéis e o mundo como o papa Francisco

Papa Francisco

Cidade do Vaticano — O povo queria papa. E, mesmo tão esperado, ele veio de surpresa. Estava escuro, fazia 8ºC e a chuva fina não parava de cair na Praça de São Pedro. A segunda tarde do conclave estava terminando e a expectativa dos fiéis era crescente depois da fumaça negra ao fim de quatro votações, a primeira delas na véspera. A multidão, embaixo de guarda-chuvas coloridos, ainda repetia cânticos e orações quando ecoaram os primeiros gritos de euforia. O relógio marcava 19h08 (15h08 em Brasília) quando a chaminé da Capela Sistina expeliu fumaça branca, anunciando que os 1,2 bilhão de católicos tinham um novo líder. A multidão em êxtase precisou esperar praticamente mais uma hora até que as luzes do balcão central da Basílica de São Pedro se acenderam e o cardeal-díacono Jean-Louis Tauran surgiu para o aguardado anúncio: “Habemus papam!”

O 266º pontífice é o primeiro a adotar Francisco como nome. É também o primeiro formado na Companhia de Jesus. E o primeiro da América Latina: os 115 cardeais eleitores escolheram o argentino Jorge Mario Bergoglio, 76 anos. No conclave de 2005, o cardeal Bergoglio era um nome forte e rivalizou com o alemão Joseph Ratzinger, eleito papa Bento XVI. Desta vez, ele mal figurava na lista dos papabili. “Argentino, argentino!”, vibrou imediatamente o grupo de hermanos na praça, identificado pela bandeira celeste. “Não dá para acreditar, não é possível. Quem poderia imaginar?”, perguntava, com os olhos arregalados, o operador de telemarketing argentino Claudio Mariani, 46 anos, assediado por jornalistas do mundo inteiro.

Com as varandas laterais da Basílica ocupadas pelos cardeais, as cortinas vermelhas de veludo se abriram novamente para a primeira aparição do papa Francisco. Sob os olhares do mundo, Sua Santidade surgiu, de branco da cabeça aos pés. “Vocês sabem que o objetivo do conclave era dar um bispo a Roma. E parece que meus amigos cardeais foram buscar quase no fim do mundo. Mas aqui estamos”, brincou, logo no início, arrancando risos e aplausos.

Antes da protocolar bênção Urbi et Orbi (“para a cidade e para o mundo”), o papa que não aparecia nas bolsas de apostas nem nos cenários traçados pelos mais experientes vaticanistas iniciou o pontificado surpreendendo. Em italiano, com fala mansa e pausada, conduziu uma oração pelo predecessor e puxou em seguida um pai-nosso, uma ave-maria e um glória ao pai — as três rezas mais triviais da fé católica. Depois, o gesto que silenciou a multidão: do alto da Basílica, o homem que acabara de ocupar o cargo máximo da Igreja Católica curvou-se, por conta própria, para receber as preces do povo. “Começamos este caminho, bispo e povo, juntos, em irmandade, amor e confiança recíproca. Rezemos uns pelos outros, por todo o mundo, para que haja uma grande irmandade”, pediu, antes de desejar boa noite e bom descanso.

Papa pop

Em poucos minutos, o papa Francisco conquistou os fiéis. “Gostei da primeira impressão. Ele pareceu simpático e bem acessível”, opinou a estudante portuguesa Cristina Neves, 21, que faz intercâmbio em Roma. “É um latino-americano! Agora, estou me sentindo representado”, comemorava o seminarista boliviano Israel Huasco, 28.

Enquanto os fiéis dispersavam, a enfermeira brasileira Vânia Moura, 40 anos, que vive em Roma há 13, ainda enxugava as lágrimas. “As palavras e o jeito de falar dele me tocaram. Senti um calor de pai, de avô, como se ele fosse da minha família”, dizia, tentando explicar a emoção. “Ele puxou orações que a gente aprende criança. E pediu que a gente o abençoasse. Foi incrível”, emendou a freira catarinense Deisi Naibo, 29, também residente na capital italiana.

De batina molhada e terço em mãos, padres davam pulos de alegria. Freiras choravam e sorriam ao mesmo tempo, enquanto jovens se abraçavam. “Simplesmente, não acredito que estou vivendo isso”, era tudo o que conseguia dizer o psicólogo catarinense Cristian Stassun, 28 anos, que faz doutorado em Roma. As cenas, embaladas pelo ressoar dos sinos, eram de vitória e de alívio na praça tomada pela multidão, avaliada em 100 mil pessoas. Bandeiras de vários países — incluindo as brasileiras — tremulavam, dividindo espaço com tablets, celulares e câmeras. Os brados estridentes de “Viva o papa!” vinham de todos os lados.


Reencontro (quase) marcado

Pouco depois de ser eleito, o papa Francisco falou por telefone com o antecessor, Bento XVI, informou o porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi. Os dois combinaram um primeiro encontro “em breve”, acrescentou o padre Lombardi, que aproveitou para ressaltar a empatia imediata entre o pontífice e os fiéis que lotaram a Praça de São Pedro. “Ele fez um belo gesto ao pedir sua bênção e ao se curvar (ante os fiéis).”


Agenda lotada

Francisco tem pela frente uma pequena maratona de compromissos nos primeiros sete dias de pontificado. Hoje, o papa deve acordar cedo para uma “visita particular” à Basílica de Santa Maria Maior. “Vou rezar à Virgem para que ela proteja a cidade de Roma”, anunciou, em sua primeira declaração como bispo da capital italiana. À tarde, por volta das 13h, o pontífice celebrará missa na Capela Sistina com os demais 114 cardeais eleitores. Amanhã, às 7h, receberá o Colégio Cardinalício na Sala Clementina. No sábado será a vez dos jornalistas e responsáveis pela comunicação do Vaticano. O primeiro domingo do novo papa marcará sua primeira bênção do Ângelus, pronunciada às 8h (6h em Brasília) dos aposentos oficiais. A missa de entronização será celebrada em 19 de março — dia de São José —, na Basílica de São Pedro. A semana do pontífice termina com uma audiência aos delegados fraternais, sem a tradicional audiência geral das quartas-feiras.

domingo, 17 de março de 2013

Um jesuíta em pele de Francisco

Um jesuíta em pele de Francisco

Publicado em Carta Capital

Um mistério cercou o Vaticano após a escolha do argentino Jorge Mario Bergoglio como o novo líder da Igreja Católica. Ao ser anunciado papa Francisco, teria o sumo pontífice se inspirado em qual são Francisco? O de Assis, de vestes simples, atenção aos pobres e reação aos luxos e ao poder, ou Xavier, um dos co-fundadores da Companhia de Jesus, braço do Estado na colonização do novo mundo a partir da catequese? Bergoglio, um jesuíta, teria homenageado o santo a quem, segundo a história, foi convidado pelo espírito de Cristo a reconstruir a Igreja ou o santo que ajudara a fundar a companhia da qual faz parte?
O papa Francisco, durante audiência com a imprensa neste sábado 16. Ele disse querer uma "igreja pobre para os pobres". Foto: Vincenzo Pinto / AFP
O papa Francisco, durante audiência com a imprensa neste sábado 16. Ele disse querer uma “igreja pobre para os pobres”. Foto: Vincenzo Pinto / AFP

No sábado 16 a dúvida se dissipou. Em entrevista coletiva, o papa Francisco deixou claro: o nome, sugerido pelo cardeal brasileiro dom Cláudio Hummes, era uma homenagem a são Francisco de Assis. “Gostaria de uma igreja pobre e para os pobres”, disse. O nome foi definido quando a sua escolha como papa já se materializava no Conclave e o colega brasileiro disse após um abraço: “Não se esqueça dos pobres”.
Eis a origem da nomenclatura. O jesuíta, portanto, acenava para uma outra face da própria Igreja ao reverenciar o santo que, como lembrou o jornalista Mino Carta em seu mais recente editorial, “foi reformador herói, sem contar o poeta que escreveu O Cântico das Criaturas, ou Cântico ao Irmão Sol, obra-prima da língua italiana, e, portanto, o santo mais próximo de Cristo, cujo exemplo transformou na Regra da sua vida e da sua pregação em defesa da natureza e dos desvalidos”.
“A lição de Francisco é, na essência, um desafio à Igreja e ao papa Inocêncio III, estadista cercado pelo luxo, grudado à crosta terrestre e às suas ambições e vaidades, e em cuja época o poder temporal do Vaticano atingiu o apogeu, quando o sucessor de Pedro interferia na política do Sacro Romano Império. Francisco surge como prova dos descaminhos papais, é o manso contestador que põe o dedo na chaga em nome da ideia indiscutivelmente cristã da revelação e do amor”, escreveu Carta.

O exemplo de Francisco de Assis, portanto, parece uma contradição à escola pela qual Bergoglio se formou, está de voto incondicional ao papa e historicamente ligado aos interesses do Estado colonizador. Uma ordem que tinha como pretensão, a partir do século XVI, “civilizar os índios” – para muitos, uma forma de genocídio cultural. Vale lembrar, no entanto, que a ordem dos jesuítas tem como compromisso, a partir do Concílio Vaticano II, os votos em defesa da justiça social e a “opção preferencial pelos pobres”.
É este compromisso que o novo papa tentou reforçar em sua primeira manifestação à imprensa. O que ainda não se sabe é qual lado pesará em seu papado: o exemplo contestador do santo que lhe empresta o nome ou a proximidade com a ordem e os colonizadores que a história dos jesuítas inspira.bsp;

Novo Papa: Quem ganha e quem perde

Quem ganha e quem perde

por Wálter Maierovitch

Publicado em Carta Capital 

A capela sistina sempre foi palco de litígios e puxadas de tapete. Nela existe a “câmara das lágrimas”, onde o vencedor troca os panos cor púrpura de cardeal pelos brancos de papa, antes de, na solidão, debulhar-se em lágrimas por causa da grande emoção. Na Sistina, o então jovem Rafael, insuflado pelo seu mestre Bramante, tentou tomar o lugar de Michelangelo. Rafael não se contentava em afrescar os quartos dos papas. Aproveitava-se do atraso de Michelangelo para espalhar que o concorrente nunca afrescara paredes e não dominava as técnicas de aplicar tinta em reboco molhado. Michelangelo venceu o embate.
Depois de 25 horas de votações, venceram os reformistas da Cúria. A disputa estava polarizada entre esses e os antirreformistas liderados pelo camerlengo Tarcisio Bertone, ex-secretário de Estado (chefe da Cúria e uma espécie de primeiro-ministro). O candidato de Bertone era o brasileiro Odilo Pedro Scherer, integrante da comissão de fiscalização do apelidado Banco do Vaticano, eufemisticamente denominado Instituto para as Obras Religiosas (IOR).
Nos últimos conclaves, o grande embate ocorria entre os reformadores da doutrina, incluindo o saudoso Carlo Maria Martini, e os conservadores. Venceram os últimos, cujos principais símbolos foram Karol Wojtyla e o seu delfim Joseph Ratzinger. Por evidente, perdia a Igreja com o conservadorismo, destacando a redução de fiéis na Europa. A propósito, e como demonstrou o vaticanista Marco Politi, Ratzinger foi o grande teólogo do obscurantismo. É contra a camisinha em tempos de Aids, manteve a proibição de Paulo VI ao uso de pílulas anticoncepcionais, opõe-se à ordenação de mulheres para o posto de sacerdotisas, condena o homossexualismo e a lei alemã de “despenalização” do aborto, é contrário ao casamento de padres e à oferta da eucaristia, nas celebrações, aos divorciados, entre outras.
A escolha de Jorge Mario Bergoglio, que na eleição de Ratzinger ficou em segundo lugar ao entrar nos escrutínios depois da baixa votação e da desistência do cardeal Martini, foi costurada pelos norte-americanos, à frente Timothy Dolan, de Nova York. Os primeiros candidatos apresentados eram Angelo Scola e Odilo Scherer. O reformista entrou na Sistina com cerca de 50 votos e o antirreformista Scherer com quase 25. Como não passavam desse número e jamais atingiriam os dois terços previstos na Constituição apostólica, acabaram substituídos. Então, pelo resultado da urna, percebeu-se que não emplacariam os cardeais canadense, húngaro, australiano, mexicano e o outsider e cultíssimo Gianfranco Ravasi. Para os vaticanistas, Scola pediu a transferência dos seus votos para Bergoglio, de 76 anos. O outro argentino, Leonardo Sandri, estava fechado com os antirreformistas.
As articulações de Dolan, o apoio de diversos cardeais sul-americanos engasgados com a Cúria (Scherer nunca foi unanimidade entre os brasileiros votantes) e a migração de votos do italiano Scola deram a vitória a Bergoglio, que entrou sem nenhuma aspiração e zero de apetite. Como as questões terrenas, nada teológicas, prevaleceram no conclave, os reformistas curiais Scola e Dolan devem indicar o novo secretário de Estado. Aquele que cuidará da limpeza e das defenestrações. A respeito fala-se de um cardeal com prestígio entre políticos italianos, capaz de manter a contribuição do governo da Itália ao Vaticano, equivalente a 9 bilhões de euros por ano.
Scherer saiu chamuscado ao defender o escandaloso Banco do Vaticano. Segundo Paolo Rodari, vaticanista do jornal La Repubblica, “o ataque duríssimo na congregação-geral feito por muitos cardeais e contra a ‘corrupção’ romana, numa Cúria que apontava no candidato Odilo Scherer, cardeal brasileiro e integrante da Comissão Cardinalícia do IOR, ecoou de maneira dramática durante o conclave… Um conclave que assistiu, gradualmente, aos sul-americanos e norte-americanos escolherem uma figura independente”.
Com Bergoglio, jesuíta, esperam-se ações de moralização na Cúria, com o vigor de Inácio de Loyola. Perderam os fiéis brasileiros: o maior país católico do mundo não teve um candidato, entre os reformistas da Cúria, capaz de empolgar. E fica a impressão, por exigência dos cardeais norte-americanos, de estar com os dias contados a lavanderia do IOR, que não atende a todas as regras internacionais de prevenção à lavagem de dinheiro criminoso ou sem causa.

terça-feira, 12 de março de 2013

Conclave começa hoje com cardeais divididos em 4 grupos

Conclave começa hoje com cardeais divididos em 4 grupos

Cardeais se dividem em quatro correntes
O Estado de S. Paulo - 12/03/2013
 

O conclave para eleger o novo papa começa hoje, a partir das 16h30 (meio-dia no Brasil), quando os 115 cardeais votantes se reunirão na Capela Sistina. Eles chegam à votação divididos em quatro grupos: dois pró e dois contra a Cúria, informam os enviados especiais Jamil Chade e José Maria Mayrink. Para analistas, mais do que questões religiosas, prevalecerão disputas políticas internas. E, ao contrário de 2005, não há um nome favorito. O secretário de Estado do Vaticano, Tarcísio Bertone, garantiu aos cardeais ontem, último dia de reuniões, que o Banco do Vaticano, alvo de denúncias, é "transparente", mas se negou a prolongar o debate. O número de religiosos que pediram para falar foi tão grande que nem todos puderam fazer intervenções.
Num cenário político bizantino, os 115 cardeais entram hoje para o conclave profundamente polarizados, divididos e irão às urnas em uma eleição aberta. Fontes próximas aos cardeais confirmaram ao Estado que existem pelo menos quatro grupos atuando nos bastidores para que suas visões prevaleçam. Mas todos admitem que, ao contrário do conclave de 2005, não há um franco favorito. De um lado, dois grupos que se apresentam como espécies de partidos da situação, enquanto outros dois clamam por maior transparência, maior eficiência na gerência da Igreja e uma espécie de modernização na gestão pontifícia.
"Não há um debate sobre doutrina ou sobre fé", indicou um assessor de um cardeal de peso no Vaticano. "A Igreja hoje está falando com a mesma voz no que se refere à religião. É sua administração que está dividindo os cardeais", acrescentou.
Mas, para observadores em Roma, com o elemento religioso fora da campanha, é mesmo a disputa política que ganhará espaço de honra na Capela Sistina. Ontem, no último dia de reuniões, o número de cardeais que pediu para falar sobre o que esperavam do próximo papa era tão grande que nem todos puderam fazer suas intervenções.
Parte deles deixou claro que considerava que o debate deveria continuar. Mas a Cúria deu por encerradas as discussões. Assessores admitiram que isso era um sinal de que nem tudo está resolvido e que o pleito está aberto.
"No último conclave, havia um homem com uma estatura três ou quatro vezes maior que a dos demais cardeais", disse o cardeal francês Philíppe Barbarin, em referência a Joseph Ratzinger. "Desta vez não é o caso. A escolha terá de ser feita entre um, dois, três, quarto, uma dúzia  de candidatos", insistiu. "Não sabemos ainda de nada. Vamos ver  o que sairá daprimeira votação."
Primária. Nos últimos dias, Roma foi tomada por reuniões secretas de diferentes grupos, mobilizando forças para justamente permitir que seus candidatos descubram hoje se têm ou não apoio suficiente para continuar na batalha. Na tarde de hoje, a primeira votação servirá como uma espécie de primária. Diante da proliferação de nomes que podem atrair votos, quem não se sair bem na primeira votação será na prática eliminado.
Não por acaso, a meta dos grupos ontem era o de costurar os últimos apoios para garantir a sobrevivência de seus candidatos para os próximos dias.
Um dos grupos de maior peso é o que poderia ser chamado de "pró-Cúria", com o apoio de alguns dos principais príncipes do Vaticano que já estavam no poder durante a gestão do secretário de Estado, Tarcisio Bertone.
O grupo, porém, queimado diante dos escândalos e da própria renúncia de Bento XVI, foi obrigado a buscar nomes de fora para atrair eleitores.
Um deles é de d. Odilo Scherer, afinado com as posições da Cúria. Ele atenderia a dois critérios: é o homem de confiança de um grupo no poder e, ao mesmo tempo, renovaria a imagem da Igreja ao se tomar o primeiro papa de fora da Europa em 1,3 mil anos. Jornais italianos apontam que o brasileiro  á poderia ter numa primeira votação entre 20 e 30 votos.
Mas nem o grupo do establishment da Igreja estaria unido. Parte dele, liderado pelo secretário de Estado, Tarcísio Bertone, defende a volta de um italiano para o comando da Santa Sé, depois de mais de 30 anos nas mãos de "estrangeiros". Um dos nomes seria o de Giancarlo Ravasi, o poderoso ministro da Cultura da Santa Sé. Mas não se descarta que o arcebispo do Sri Lanka, Malcolm Ranjith, possa ser uma alternativa se não houver uma sintonia entre os italianos.
Oposição. Do outro lado está a oposição que clama por uma reforma da administração e uma nova imagem de maior transparência na Igreja. O problema, segundo fontes no Vaticano, é que o único ponto em comum é o desejo de derrubar o grupo no poder. "Não há um nome único da oposição que atraia a atenção de todos", disse uma fonte.
Ironicamente, o representante da oposição considerado como tendo maiores chances é um antigo aliado de Bento XVI, o poderoso arcebispo de Milão, Ângelo Scola. Antes de renunciar, o papa chegou a dar sinais de que Scola seria seu candidato. Ele tem o apoio de outros cardeais italianos - mas nem todos.
"Scola é moderno, mas não progressista", insistia ontem Marco Politi, vaticanista italiano, cada vez que alguém tentava rotular Scola como um reformista. Mas parte da delegação americana também estaria inclinada a votar nele, desde que adote posições claras pró-transparência. Jornais italianos chegaram a apontar que o arcebispo de Milão poderia somar até 40 votos já na primeira rodada de votação.
Até a tarde de ontem, a prioridade de seu grupo de apoio era o de atrair o voto de cardeais independentes e descontentes com a atual Cúria. O problema é que nem todos estão convencidos de que Scola representaria de fato uma renovação da Igreja e que adotaria medidas drásticas de reformas.
Não por acaso, grupos debateram nos últimos dias nomes alternativos de oposição. São pessoas que não se alinham com o grupo pró-Cúria e nem com Scola. Mas ainda assim teriam o apoio de vários descontentes.
A lista, neste caso, é ampla e iria desde o canadense Marc Ouellet, passando pelo ganense Peter Turkson, os cardeais americanos Sean G"Malley e Timothy Dolan, o filipino Luis Antonio Tagle, o húngaro Péter Erdo e mesmo o brasileiro João Aviz. "A Cúria precisa de uma revolução", declarou o cardeal alemão Walter Kasper. "Precisamos de reforma e transparência", disse.
Já o canadense Marc Ouellet poderia ainda ser um dos nomes fortes, representante de uma espécie de compromisso entre os diversos campos. Para ser eleito, o novo papa terá de acumular 77 votos, o que pode não ser uma tarefa simples diante das divisões. Se houver um impasse entre os grupos e se as votações se repetirem sem um claro avanço de um dos candidatos, cardeais poderão chegar à conclusão de que terão de abandonar seus preferidos para buscar um nome de consenso. O canadense, não por acaso, é visto como um dos favoritos justamente por fazer a ponte entre os grupos, /jamil chade

CONCLAVE COMEÇA COM BRASILEIRO ENTRE FAVORITOS

CONCLAVE COMEÇA COM BRASILEIRO ENTRE FAVORITOS

115 CARDEAIS LARGAM EM CORRIDA IMPREVISÍVEL
Autor(es): Fernando Eichenberg
O Globo - 12/03/2013
 
Ansiedade. Visitantes aguardam na fila para conhecer a Basílica de São Pedro, no Vaticano: além de turistas, local atrai fiéis e curiosos, ávidos para conhecer o novo Papa

ROMA Os afrescos de Michelangelo retratam as cenas dramáticas do Juízo Final - quando Deus julga os homens na Terra. E com este pano de fundo, 115 cardeais estarão trancados a partir de hoje na Capela Sistina, no Vaticano, para o conclave que elegerá um novo Papa. A eleição é imprevisível e pode até resultar na escolha do primeiro brasileiro no comando da Igreja Católica e seus 1,2 bilhões de fiéis. Entre os cinco representantes do Brasil, é o arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, o que tem mais chance.
Scherer aparece na maioria das listas de papáveis dos vaticanistas, junto com o italiano Angelo Scola, arcebispo de Milão. Em comum, os dois cardeais têm no currículo o perfil que a burocracia da Santa Sé mais precisa. Ambos administram grandes arquidioceses, São Paulo e Milão. Mas isso pode não ser o bastante.
- Scola e Scherer vão se destacar no primeiro escrutínio, mas não estou convencido de que conseguirão se eleger - avalia Andrea Tornielli, vaticanista do jornal italiano "La Stampa".
DESDE 1831, SEM ULTRAPASSAR OS CINCO DIAS
Tornielli só tinha 14 anos quando o polonês Karol Wojtyla foi eleito Papa em 1978. Nenhum vaticanista imaginou na época que ele se tornaria um dos Pontífices mais populares da História da Igreja. Antes da eleição, seu nome não aparecia em nenhuma lista de papáveis.
- Lembro que quando anunciaram o nome dele, eu reagi : W-O-J-T-Y-L-A ? É um africano?
Tornielli, como vários outros vaticanistas, não exclui a possibilidade de uma grande surpresa novamente. Como o canadense Marc Ouellet.
- Fiquem de olho nos que correm por fora, como Jorge Mario Bergoglio (Argentina), Luis Antonio Tagle (Filipinas) e Francisco Robles Ortega (México). Bergoglio e Tagle fizeram intervenções (nas reuniões preparatórias) que todos gostaram, porque falaram com o coração.
John Allen Jr., o mais conhecido vaticanista americano, diz que este é provavelmente o conclave mais parecido com a eleição de Karol Wojtyla. Naquela ocasião, dois candidatos despontaram na frente: os italianos Giovanni Benelli e Giuseppe Siri. Mas, nas primeiras votações, nenhum deles conseguiu os dois terços necessários para se eleger.
- Então tiveram que buscar outro nome. Escolheram um candidato da Polônia e chocaram o mundo. Da mesma forma, poderemos desta vez ter uma outra surpresa - diz Allen Jr.
Sentados de frente uns para os outros, diante de compridas mesas cobertas por um pano branco e caimento de veludo vermelho, os cardeais terão diante de si uma cédula retangular onde está escrito, em latim, Eligo in Summum Pontificem - Elejo como Sumo Pontífice. Os nomes dos escolhidos serão escritos à mão.
E a opção, desta vez, não será fácil. O próximo Papa poderá - ou não - mudar os rumos de um Vaticano ingovernável e marcado por escândalos de pedofilia e corrupção. Bento XVI renunciou deixando dúvidas sobre seu legado - se de um revolucionário ou de um homem que quebrou a imagem de que o Papa é infalível. O racha na Igreja Católica, agora, é tal que ninguém se arrisca num palpite sobre quanto tempo o conclave pode durar. Mas uma coisa é certa: a fumaça branca que sairá da chaminé do Vaticano, um ritual histórico que anuncia a escolha de um Papa, não será vista hoje, após a única votação prevista para o dia.
- Esperem fumaça negra. A primeira votação em conclave dificilmente tem êxito - avisa o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi.
Tornielli lembra que, em 2005, apenas dois cardeais tinham experiência em conclaves - contra 47 de agora. Porém, ele mesmo admite que isso pode não ter nenhuma influência na duração das votações. John Allen Jr. arrisca uma previsão mais concreta: para ele, o processo não vai durar mais do que três ou quatro dias. Desde 1831, aliás, um conclave não dura mais de cinco dias.
- Obviamente eles querem um Papa para a Semana Santa. Depois, porque no saturado mundo de mídia em que vivemos hoje, se passar de três dias, nós vamos todos produzir matérias sobre um conclave em crise. E eles (os cardeais) não querem isso - assegurou.
O processo de votação se inicia hoje com uma missa na Basílica de São Pedro. Além dos cardeais com direito a voto, estarão presentes, ainda, aqueles com mais de 80 anos e hierarquias mais baixas do clero, além de fiéis e autoridades, como o embaixador brasileiro no Vaticano, Almir de Sá Barbuda. Apesar de dom Odilo ser constantemente citado como favorito, o diplomata lembra de outra aposta - dom João Braz de Aviz, o arcebispo emérito de Brasília.
- Para o "Washington Post" (jornal americano), no grupo dos reformistas moderados ele era o que tinha mais chances. É um homem da Cúria Romana, mas mais crítico - afirmou, esquivando-se de prognósticos, mas sem esconder o entusiasmo com a possibilidade de um Pontífice brasileiro.
Segundo analistas ouvidos pelo GLOBO nas últimas semanas, três fatores devem influenciar na eleição do futuro Papa: idade, capacidade administrativa e mãos limpas. Ou seja, nenhum rastro de conivência com casos de pedofilia, corrupção ou qualquer outra irregularidade na Cúria - o que enterraria qualquer chance de ascensão de gente como o cardeal de Los Angeles, Roger Mahony. Ele desembarcou em Roma trazendo na bagagem suspeitas de ter acobertado 129 casos de pedofilia.
Para o vaticanista Tornielli, a Igreja precisa de um homem que seja capaz de mostrar ao mundo uma face positiva da Igreja, "um mensagem do Evangelho, de alegria e de misericórdia":
- E que consiga fazer as reformas pedidas por muitos cardeais depois dos tantos escândalos, que a Cúria fique a serviço do Papa e não seja um órgão de governo da Igreja, melhorando também a relação entre o centro (Vaticano) e a periferia (dioceses no mundo).
Cum Clave , em latim, significa fechado à chave - conclave. Hoje, às 16h30m (12h30m de Brasília), os 115 cardeais se trancam na Capela Sistina. E deixam do lado de fora 1,2 bilhão de fiéis curiosos. E em suspenso.

115 CARDEAIS, UM ÚNICO PAPA

115 CARDEAIS, UM ÚNICO PAPA

OS 115 ELEITORES E O ESPÍRITO SANTO
Autor(es): DIEGO AMORIM Enviado especial
Correio Braziliense - 12/03/2013
 

O mundo inteiro estará de olho hoje na chaminé da Capela Sistina. Nesta manhã, 115 cardeais de 50 países se reúnem a portas fechadas no recinto . Eles só sairão de lá quando uma fumaça branca subir anunciando a 1,2 bilhão de fiéis que a Igreja Católica tem um novo papa. O conclave tanto pode ter minar ainda nesta terça-feira, depois da primeira votação, à tarde, quanto se estender por tempo indeterminado. Enviado especial do Correio ao Vaticano, o repórter Diego Amorim relata que, embora haja favoritos — como o arcebispo de Milão, Angelo Scola, e o brasileiro dom Odilo Scherer —, o processo, iniciado após a inesperada renúncia de Bento XVI, pode terminar de forma tão surpreendente como começou. Isso porque, em tese, qualquer um dos cardeais que participam do encontro está apto a ocupar o trono de Pedro e usar a mitra (alto) que o artesão colombiano Luis Abel Delgado , 44 anos, confeccionou para o próximo pontífice. Para isso , o religioso precisa obter o voto de pelo menos 70 colegas

Na manhã de hoje, depois de invocar inspiração divina, os cardeais serão trancados na Capela Sistina para o conclave que elegerá o novo papa

Cidade do Vaticano — Chegou o dia. Hoje, 115 homens vão se isolar do mundo para eleger quem assumirá a barca de Pedro em plena tempestade. Sob o inspirador teto da Capela Sistina, com os célebres afrescos renascentistas, cardeais de 50 países terão de chegar a um consenso e, em votação ultrassecreta, indicar a 1,2 bilhão de fiéis o novo líder da Igreja Católica. Desde o anúncio de que Bento XVI deixaria o cargo, um mês atrás, nomes de prováveis sucessores vieram à tona. Mas, embora haja favoritos, o processo pode terminar tão surpreendente quanto começou.

Na manhã de ontem, os purpurados se reuniram pela última vez antes do conclave, encerrando uma maratona de 10 encontros em sete dias. Ao longo das 27 horas de Congregações Gerais, houve 161 intervenções e, ainda assim, nem todos os inscritos tiveram oportunidade de dizer o que pensam. Na extensa pauta, desabafos e cobranças públicas, o perfil do próximo pontífice e temas espinhosos, como o escândalo do Vatileaks e a situação financeira da Santa Sé.

Vencido o arrastado período de preparação, está tudo pronto para os cardeais tomarem a decisão mais esperada pelos católicos. Bombeiros do Vaticano instalaram ontem a cortina vermelha no balcão central da Basílica de São Pedro, que se abrirá para o novo papa ser apresentado ao povo. Cerca de 90 pessoas que trabalharão na área do conclave — entre enfermeiros, médicos, seguranças e o pessoal da limpeza — juraram silêncio sobre tudo o que vão ver e ouvir nos próximos dias.

Às 10h (6h em Brasília), os eleitores rezarão uma missa para pedir ajuda ao Espírito Santo, em um momento delicado e decisivo para a Igreja. Depois, seguirão em procissão para a Capela Sistina, onde serão fechados a chave sob a proclamação de Extra omnes (“todos fora”). À tarde ocorrerá o primeiro escrutínio, e vários cardeais tendem a receber votos. Segundo o porta-voz do Vaticano, o padre Federico Lombardi, dificilmente haverá uma definição hoje. Até sexta-feira, porém, a fumaça branca deverá ser avistada da Praça de São Pedro, anunciando que um papa foi eleito.

Incomunicáveis

Até sair um vencedor, os cardeais se manterão enclausurados. A Casa Santa Marta, onde ficarão alojados, teve os sistemas de internet e telefonia bloqueados. Até os televisores foram retirados. Somente durante as refeições os cardeais poderão conversar entre si. O responsável por conduzir o conclave, na condição de decano do Colégio dos Cardeais, será o italiano Giovanni Battista Re, um dos que teriam declarado apoio a dom Odilo Scherer, o brasileiro mais citado nas bolsas de apostas da sucessão papal.

Apesar de indicarem uma polarização entre dom Odilo, arcebispo de São Paulo, e o italiano Angelo Scola, titular da arquidiocese de Milão, jornais europeus, abastecidos com informações de vaticanistas, informaram ontem que mais da metade dos cardeais não entrará para o conclave com voto definido, o que poderia estender o processo e anular previsões. Há que levar em conta, ainda, a força de nomes que correm por fora, como os dos arcebispos de Boston, Sean O’Malley, e de Nova York, Timothy Michael Dolan, além do canadense Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos.

Para o povo que espera ansioso pelo tradicional pronunciamento de Habemus papam (“temos um papa”), pouco importa se as especulações vão se confirmar ou não. “Não sei quem vai ser, mas espero que seja jovem. Se for para ficar só de enfeite, não serve”, opina a aposentada paulista Amália Irani, 64 anos, “católica praticante”. Como outras milhares de pessoas, ela pretende fazer plantão na praça à espera da fumaça branca.

Mesmo entre os fiéis mais fervorosos, os papáveis são pouco conhecidos. Quase ninguém consegue indicar um cardeal preferido. “Não sei quem são, mas torço por um latino-americano. Somos mais católicos que os europeus”, comenta a cubana Karina Rodrigues, 37, de férias pela Itália. “Queria alguém mais aberto, mas não é o papa quem vai ditar o que eu tenho de fazer”, completa a amiga peruana Heidy Fischer, 37.

Acompanhado da esposa e da filha no passeio pelo Vaticano, o comerciante venezuelano René Barandela, 33, diz ter uma referência para o futuro pontífice. “Precisamos de um papa carismático como (Hugo) Chávez”, dispara ele, referindo-se ao presidente morto na semana passada. A partir de hoje, se intensificarão as apostas, as orações, e os olhos do mundo se voltarão de vez para Roma.

Depoimento
Aos fiéis, cabe dizer amém

Com o início do conclave, aumentarão as especulações em torno de quem será o novo papa. Enquanto a fumaça branca não for avistada, de todos os lados surgirá quem tente adivinhar o sucessor de Bento XVI. Nada mais natural.

Três são os nomes mais falados, não necessariamente nessa ordem: Angelo Scola (Itália), Odilo Scherer (Brasil) e Marc Ouellet (Canadá). Mas há um punhado de outros cardeais citados. Correndo por fora, um deles pode surpreender.

A avaliação possível de ser feita, no momento, é assim mesmo: solta, indefinida, especulativa, quase vaga. Há mais de 10 dias em Roma, estou convencido de que o colégio cardinalício não pode ser encarado como um parlamento qualquer.

Há, sim, entre os humanos purpurados, grupos, tendências e preferências. Mas não se trata da mesma lógica adotada por partidos políticos. Por isso, dificilmente alguém consegue “violar o painel” da Capela Sistina.

Os “príncipes da Igreja” vivem sujeitos a disputas de poder, vaidades, carreirismo e tantas outras práticas pouco evangélicas. Não parecem, porém, muito dispostos a, “diante de Deus e pelo bem da Igreja”, exercer voto de cabresto.

A cada conclave, os eleitores-candidatos insistem no fator espiritual e, portanto, na surpresa da votação secreta. Unânimes, creditam a palavra final ao Espírito Santo, porque é nisso que creem. A nós, reles mortais, ao menos por ora, resta dizer amém.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Papa aprova decreto que pode antecipar escolha de seu sucessor

Papa aprova decreto que pode antecipar escolha de seu sucessor

25/02/2013

Thais Leitão*
Repórter da Agência Brasil

  O papa Bento XVI aprovou hoje (25) um decreto que possibilita a antecipação do conclave que vai eleger seu sucessor. Segundo informou o Vaticano, no documento, o pontífice lembra que o prazo normal para a realização de um conclave é no mínimo 15 dias e no máximo 20, após o início da Sé vacante, período que começa com a morte ou renúncia de um pontífice. Com isso, o processo de escolha do novo papa deveria começar entre 15 e 20 de março, como informou o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, no dia 13 deste mês.
"Deixo aos cardeais a possibilidade de antecipar o início do conclave, uma vez que todos estejam presente, ou o adiamento, em caso de motivos graves, da eleição por alguns dias", disse o papa no decreto divulgado hoje.
O papa Bento XVI anunciou no último dia 11 que deixará o pontificado na próxima quinta-feira (28) em razão da idade avançada.
Devem participar do conclave que vai eleger o novo papa 115 cardeais. Hoje (25), o cardeal Keith O'Brien, homem mais importante na hierarquia da Igreja Católica na Grã-Bretanha, apresentou seu pedido de renúncia, após de ter seu nome envolvido em um escândalo ocorrido há três décadas.
O alemão Joseph Ratzinger, 85 anos, assumiu o comando da Igreja Católica em 19 de abril de 2005, após a morte de João Paulo II. Aos 78 anos, Ratzinger foi um dos cardeais mais idosos a ser eleito papa e sua renúncia é a primeira de um pontífice na era moderna. O último chefe da Igreja Católica a renunciar foi Gregório XII, no século 15 (1406-1415).

*Com informações da agência pública de notícias de Portugal, Lusa // Edição: Juliana Andrade

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Entenda como será a eleição do próximo papa

Entenda como será a eleição do próximo papa

Publicado em Carta Capital

 Imagem de 16 de abril de 2005 mostra a capela Sistina pronta para o conclave que elegeu Joseph Ratzinger como o novo papa. Foto: Pierpaolo Cito / AFP

Imagem de 16 de abril de 2005 mostra a capela Sistina pronta para o conclave que elegeu Joseph Ratzinger como o novo papa. Foto: Pierpaolo Cito / AFP

A data de 28 de fevereiro, anunciada na segunda-feira 11 pelo papa Bento XVI como o dia em que renunciará ao cargo, não foi estabelecida de forma aleatória. A eleição para substituí-lo precisa ter início em, no máximo, 20 dias após a vacância do papado, como determina a Constituição do Vaticano, o que obriga os cardeais eleitores a se reunirem, e tomarem uma decisão, ainda em março. Assim, antes da Páscoa (que em 2013 ocorre em 31 de março), quando os cristãos celebram a ressurreição de Jesus Cristo, a Igreja Católica terá um novo líder.
As regras para a realização do conclave, a eleição do novo papa, foram estabelecidas e atualizadas na Constituição Apostólica, assinada por João Paulo II. Qualquer homem católico batizado pode ser escolhido como papa, mas apenas cardeais foram eleitos desde 1378. Participam da votação somente os cardeais com menos de 80 anos. Hoje há 117 eleitores aptos, 50 nomeados por João Paulo II e 67 por Bento XVI. A maioria (61) é da Europa. Há ainda 19 latino-americanos, 14 de Estados Unidos e Canadá, 11 africanos, 11 asiáticos e um da Oceania.
O processo eleitoral é coordenado por uma congregação formada pelo cardeal camerlengo, o administrador da propriedade e receita da Santa Sé, e por três cardeais assistentes. Desde 2007, o camerlengo é o italiano Tarcisio Bertone, ex-arcebispo de Gênova. Os assistentes são definidos por sorteio e têm “mandatos” de apenas três dias, sendo posteriormente substituídos após um novo sorteio. Essa comissão tem poder apenas para cuidar da eleição e tratar de assuntos urgentes, mas não pode tomar decisões de atribuição exclusiva do papa.
A Constituição Apostólica é uma admissão de que os cardeais não são santos. Há uma série de mecanismos e restrições para garantir a transparência do conclave e evitar fraudes ou influências indevidas sobre a votação.
Durante o conclave, os cardeais são obrigados a trajar a batina preta filetada e a faixa vermelha, com o solidéu, cruz peitoral e anel e devem-se manter em completo isolamento, não podendo trocar correspondência epistolar, telefônica ou por outros meios de comunicação com pessoas estranhas ao âmbito da eleição. Todas as pessoas que estarão no Vaticano durante a eleição, como os responsáveis por alimentação e limpeza, ou mesmo religiosos de nível inferior, estão proibidas de conversar com os cardeais.

As votações são administradas por nove cardeais também sorteados. Três são os “escrutinadores”, que contam os votos, três são os infirmarii, responsáveis por recolher os votos dos cardeais eventualmente doentes, e três são revisores da votação. Para o papa ser eleito, ele precisa de dois terços dos votos. No caso do sucessor de Bento XVI, serão necessários 78 votos (dois terços de 117). É na primeira votação que os cardeais descobrem quão favorito é cada um dos candidatos. “Até a primeira votação, você não sabe quem realmente tem força e quem não tem”, disse ao jornal norte-americano Chicago Tribune o arcebispo de Chicago, Francis George.
Caso não seja obtida a maioria de dois terços, os cardeais passam por um período de três dias nos quais devem realizar duas votações, uma pela manhã e outra à tarde, em busca de um consenso. Se não tiverem sucesso, os cardeais podem realizar mais três séries de sete votações, entremeadas por curtos períodos de “oração, de livre colóquio entre os votantes e de uma breve exortação espiritual”. Se ainda assim não houver consenso, realiza-se uma votação entre os dois cardeais mais votados.
A cada votação, as cédulas e as anotações dos cardeais são queimadas. Se o voto não tiver sucesso, a chaminé da Capela Sistina emitirá uma fumaça preta. Quando o nome do novo papa for definido, a chaminé soltará uma fumaça branca. Momentos depois, o protodiácono do Vaticano, atualmente o francês Jean-Louis Tauran, aparece na varanda central da Basílica de São Pedro para informar, com a frase habemus papam, que um novo papa foi escolhido e aceitou a nomeação. Após o anúncio, o novo papa é apresentado ao povo e dá a primeira bênção.