terça-feira, 12 de março de 2013

CONCLAVE COMEÇA COM BRASILEIRO ENTRE FAVORITOS

CONCLAVE COMEÇA COM BRASILEIRO ENTRE FAVORITOS

115 CARDEAIS LARGAM EM CORRIDA IMPREVISÍVEL
Autor(es): Fernando Eichenberg
O Globo - 12/03/2013
 
Ansiedade. Visitantes aguardam na fila para conhecer a Basílica de São Pedro, no Vaticano: além de turistas, local atrai fiéis e curiosos, ávidos para conhecer o novo Papa

ROMA Os afrescos de Michelangelo retratam as cenas dramáticas do Juízo Final - quando Deus julga os homens na Terra. E com este pano de fundo, 115 cardeais estarão trancados a partir de hoje na Capela Sistina, no Vaticano, para o conclave que elegerá um novo Papa. A eleição é imprevisível e pode até resultar na escolha do primeiro brasileiro no comando da Igreja Católica e seus 1,2 bilhões de fiéis. Entre os cinco representantes do Brasil, é o arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, o que tem mais chance.
Scherer aparece na maioria das listas de papáveis dos vaticanistas, junto com o italiano Angelo Scola, arcebispo de Milão. Em comum, os dois cardeais têm no currículo o perfil que a burocracia da Santa Sé mais precisa. Ambos administram grandes arquidioceses, São Paulo e Milão. Mas isso pode não ser o bastante.
- Scola e Scherer vão se destacar no primeiro escrutínio, mas não estou convencido de que conseguirão se eleger - avalia Andrea Tornielli, vaticanista do jornal italiano "La Stampa".
DESDE 1831, SEM ULTRAPASSAR OS CINCO DIAS
Tornielli só tinha 14 anos quando o polonês Karol Wojtyla foi eleito Papa em 1978. Nenhum vaticanista imaginou na época que ele se tornaria um dos Pontífices mais populares da História da Igreja. Antes da eleição, seu nome não aparecia em nenhuma lista de papáveis.
- Lembro que quando anunciaram o nome dele, eu reagi : W-O-J-T-Y-L-A ? É um africano?
Tornielli, como vários outros vaticanistas, não exclui a possibilidade de uma grande surpresa novamente. Como o canadense Marc Ouellet.
- Fiquem de olho nos que correm por fora, como Jorge Mario Bergoglio (Argentina), Luis Antonio Tagle (Filipinas) e Francisco Robles Ortega (México). Bergoglio e Tagle fizeram intervenções (nas reuniões preparatórias) que todos gostaram, porque falaram com o coração.
John Allen Jr., o mais conhecido vaticanista americano, diz que este é provavelmente o conclave mais parecido com a eleição de Karol Wojtyla. Naquela ocasião, dois candidatos despontaram na frente: os italianos Giovanni Benelli e Giuseppe Siri. Mas, nas primeiras votações, nenhum deles conseguiu os dois terços necessários para se eleger.
- Então tiveram que buscar outro nome. Escolheram um candidato da Polônia e chocaram o mundo. Da mesma forma, poderemos desta vez ter uma outra surpresa - diz Allen Jr.
Sentados de frente uns para os outros, diante de compridas mesas cobertas por um pano branco e caimento de veludo vermelho, os cardeais terão diante de si uma cédula retangular onde está escrito, em latim, Eligo in Summum Pontificem - Elejo como Sumo Pontífice. Os nomes dos escolhidos serão escritos à mão.
E a opção, desta vez, não será fácil. O próximo Papa poderá - ou não - mudar os rumos de um Vaticano ingovernável e marcado por escândalos de pedofilia e corrupção. Bento XVI renunciou deixando dúvidas sobre seu legado - se de um revolucionário ou de um homem que quebrou a imagem de que o Papa é infalível. O racha na Igreja Católica, agora, é tal que ninguém se arrisca num palpite sobre quanto tempo o conclave pode durar. Mas uma coisa é certa: a fumaça branca que sairá da chaminé do Vaticano, um ritual histórico que anuncia a escolha de um Papa, não será vista hoje, após a única votação prevista para o dia.
- Esperem fumaça negra. A primeira votação em conclave dificilmente tem êxito - avisa o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi.
Tornielli lembra que, em 2005, apenas dois cardeais tinham experiência em conclaves - contra 47 de agora. Porém, ele mesmo admite que isso pode não ter nenhuma influência na duração das votações. John Allen Jr. arrisca uma previsão mais concreta: para ele, o processo não vai durar mais do que três ou quatro dias. Desde 1831, aliás, um conclave não dura mais de cinco dias.
- Obviamente eles querem um Papa para a Semana Santa. Depois, porque no saturado mundo de mídia em que vivemos hoje, se passar de três dias, nós vamos todos produzir matérias sobre um conclave em crise. E eles (os cardeais) não querem isso - assegurou.
O processo de votação se inicia hoje com uma missa na Basílica de São Pedro. Além dos cardeais com direito a voto, estarão presentes, ainda, aqueles com mais de 80 anos e hierarquias mais baixas do clero, além de fiéis e autoridades, como o embaixador brasileiro no Vaticano, Almir de Sá Barbuda. Apesar de dom Odilo ser constantemente citado como favorito, o diplomata lembra de outra aposta - dom João Braz de Aviz, o arcebispo emérito de Brasília.
- Para o "Washington Post" (jornal americano), no grupo dos reformistas moderados ele era o que tinha mais chances. É um homem da Cúria Romana, mas mais crítico - afirmou, esquivando-se de prognósticos, mas sem esconder o entusiasmo com a possibilidade de um Pontífice brasileiro.
Segundo analistas ouvidos pelo GLOBO nas últimas semanas, três fatores devem influenciar na eleição do futuro Papa: idade, capacidade administrativa e mãos limpas. Ou seja, nenhum rastro de conivência com casos de pedofilia, corrupção ou qualquer outra irregularidade na Cúria - o que enterraria qualquer chance de ascensão de gente como o cardeal de Los Angeles, Roger Mahony. Ele desembarcou em Roma trazendo na bagagem suspeitas de ter acobertado 129 casos de pedofilia.
Para o vaticanista Tornielli, a Igreja precisa de um homem que seja capaz de mostrar ao mundo uma face positiva da Igreja, "um mensagem do Evangelho, de alegria e de misericórdia":
- E que consiga fazer as reformas pedidas por muitos cardeais depois dos tantos escândalos, que a Cúria fique a serviço do Papa e não seja um órgão de governo da Igreja, melhorando também a relação entre o centro (Vaticano) e a periferia (dioceses no mundo).
Cum Clave , em latim, significa fechado à chave - conclave. Hoje, às 16h30m (12h30m de Brasília), os 115 cardeais se trancam na Capela Sistina. E deixam do lado de fora 1,2 bilhão de fiéis curiosos. E em suspenso.

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