MORTE DE CHÁVEZ ABRE CAMINHO PARA A SUCESSÃO NUM PAÍS DIVIDIDO E EM CRISE - O FIM DE UMA ERA
HUGO CHÁVEZ PERDE A BATALHA |
Autor(es): » RODRIGO CRAVEIRO » GABRIELA FREIRE VALENTE |
Correio Braziliense - 06/03/2013 |
Dilma cancela viagem e vai a velório do amigo. Enterro foi marcado para a sexta-feira. Obama prevê tempo de mudanças no país. Bolivarianismo deve perder forca política. “Patriotas que nos escutam, que nos veem, em todo o território da pátria e nossos irmãos do mundo. (…) Hoje, acompanhávamos sua filha, seu irmão e seus familiares quando recebemos a informação mais dura e mais trágica que podemos transmitir ao nosso povo. Às 16h25 de hoje (17h55 em Brasília), 5 de março, faleceu o comandante presidente Hugo Chávez Frías.” Visivelmente emocionado, o vice-presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, informou que Chávez acabara de sucumbir a uma batalha de quase dois anos contra o câncer. O anúncio foi o último capítulo de um dia tumultuado. Após se reunir com o Conselho de Ministros e com o Diretório Político-Militar da Revolução Bolivariana, Maduro atacou duramente “os inimigos da pátria”, acusou-os de conspirar contra Chávez e ordenou a expulsão dos adidos norte-americanos da Aeronáutica David Delmonaco e Devlin Kostal. “Rejeitamos totalmente a alegação do governo de Caracas que envolve os EUA em algum tipo de conspiração para desestabilizar o governo da Venezuela”, afirmou o Pentágono, por meio de um comunicado. Cerca de duas horas depois, o vice retornou à tevê e fez o comunicado fúnebre. Pela manhã, María Gabriela, uma de suas filhas, pedira à nação, por meio do microblog Twitter, que orasse pelo pai. O corpo de Chávez, de 58 anos, será trasladado hoje do Hospital Militar Dr. Carlos Arvelo para a Academia Militar da Venezuela. O velório na capela ardente durará até sexta-feira, data do sepultamento, marcado para as 10h (11h30 em Brasília), na presença de chefes de Estado e de governo. Desde ontem, o país vive luto oficial de sete dias. Amado e odiado, polêmico e sem papas na língua, o mandatário que forjou sua ideologia na figura do conquistador Simón Bolívar e adotou o socialismo do século 21 como a alma de seu governo morreu no mesmo dia que Josef Stalin, 60 anos depois. A presidente Dilma Rousseff considerou a perda “irreparável” e lembrou que Chávez era uma liderança comprometida com os povos da América Latina. Com a ausência do venezuelano, surgem dúvidas sobre o futuro do chavismo e de sua revolução. O chanceler, Elías Jaua, confirmou que Maduro assume o poder interinamente. “Estas foram as ordens do comandante presidente Hugo Chávez”, disse. “No momento em que se declara a ausência absoluta, ele terá que convocar eleições dentro de um mês, provavelmente para 7 de abril”, explicou ao Correio Tony De Viveiros, cientista político da Universidad Simón Bolívar (em Caracas). Principal líder da oposição, Henrique Capriles Radonski, governador do estado de Miranda, expressou solidariedade para com a família do presidente e exortou a população a se unir. “Nesses momentos difíceis, devemos demonstrar nosso profundo amor e respeito à nossa Venezuela! Unidade da família venezuelana!”, escreveu, por meio do microblog Twitter. De acordo com Maduro, Chávez morreu após lutar “duramente” contra o câncer, “com o amor do povo, com as bênçãos do povo e com a lealdade mais absoluta de seus companheiros e companheiras de luta e com o amor de todos os seus familiares”. O vice-presidente ordenou a mobilização especial de toda a Força Armada Nacional Bolivariana e da polícia, a fim de garantir a paz na Venezuela. “Nessa dor imensa, dessa tragédia histórica que toca a nossa Pátria, chamamos a todos os compatriotas a sermos os vigilantes da paz, do respeito e do amor”, declarou Maduro. “As bandeiras de Chávez serão levantadas com honra e com dignidade. Comandante, onde o senhor estiver, obrigado, mil vezes obrigado”, acrescentou, entre lágrimas. O pranto também tomou conta de simpatizantes, que se reuniram, na noite de ontem, diante do Hospital Militar Dr. Carlos Arvelo e nas praças Bolívar, espalhadas pelo país. Nesses locais, o choro se misturava a discursos acalorados em defesa da revolução. Em uma demonstração de obediência, a Força Armada Nacional Bolivariana prometeu cumprir a Constituição. “Nos encontramos unidos para cumprir e fazer cumprir os preceitos constitucionais e a vontade do nosso líder, comandante Hugo Rafael Chávez Frías”, disse Diego Molero, ministro da Defesa, que expressou apoio a Maduro, a Diosdado Cabello (presidente da Assembleia Nacional) e aos demais poderes do Estado. Por sua vez, o general Wilmer Barrientos, chefe do comando estratégico operacional das Forças Armadas da Venezuela, comentou que as fronteiras, incluindo os mares, estavam sendo vistoriados. “Até o momento, tudo segue em plena normalidade”, afirmou à rede Telesur. Por telefone, de Miami, o médico venezuelano José Rafael Marquina — que garantia ter informações privilegiadas sobre o prontuário médico do presidente — explicou ao Correio que um dos pulmões de Chávez estava totalmente invadido pelo tumor. “A falência respiratória continuou progredindo até o momento em que mais nada funcionava, nem mesmo a ventilação mecânica”, disse. Segundo ele, o tumor teve início no Psoas, um músculo da pélvis, se espalhou pela coluna e atingiu os pulmões. Governo Apesar do carisma considerado único de Chávez, a Venezuela deverá experimentar apenas uma pequena mudança na forma de governo. A opinião é de Alberto Pfeifer, especialista em América Latina pela Universidade de São Paulo (USP). “Se Chávez era dono de uma retórica inigualável, Maduro é dotado do populismo, herdado de seu mentor”, comentou à reportagem. O especialista alerta para o risco de conflitos internos a médio prazo. “A figura de Chávez era aglutinadora. Ainda não sabemos se Nicolás Maduro terá essa característica.” Professora da Universidad Simón Bolívar, Natalia Brandler acredita que os chavistas precisarão realizar várias manobras, caso queiram se fortalecer. “Eles têm que jogar várias cartas ao mesmo tempo: manter a polarização, culpar a oposição por todos os males econômicos e transformar Chávez numa figura mítica e religiosa. Um líder que deixou um último desejo: o de que o povo votasse no intragável Maduro para preservar a Revolução”, explicou. Apesar de a oposição ter perdido o poder de mobilização, ela já começa a trabalhar para desconstruir a imagem de Maduro. Nas últimas semanas, os antichavistas organizaram protestos contra a deterioração econômica do país, que enfrenta escassez de produtos e desvalorização da moeda. Sigo aferrado a Cristo e confiado em médicos e enfermeiros. Até a vitória sempre! Viveremos e venceremos!” Hugo Chávez, presidente da Venezuela, na última mensagem publicada no microblog Twitter, em 18 de fevereiro Suas bandeiras serão levantadas com honra e dignidade. Comandante, onde estiver, obrigado, mil vezes obrigado” Nicolás Maduro, vice-presidente da Venezuela Gratidão e despedida Antes do anúncio da morte de Chávez, a filha mais nova do presidente, María Gabriela (D), agradeceu o apoio de admiradores e pediu orações em intenção do pai. “Não fique triste, meu povo. Elevemos nossas orações e não percamos em nenhum momento a fé”, escreveu, em sua página no Twitter. Horas mais tarde, ela disse ser “eternamente grata” aos que lhe enviaram mensagens de força e lembrou o legado de Chávez. “Devemos seguir seu exemplo. Devemos seguir construindo a Pátria! Até sempre, meu papai” |
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