terça-feira, 12 de março de 2013

115 CARDEAIS, UM ÚNICO PAPA

115 CARDEAIS, UM ÚNICO PAPA

OS 115 ELEITORES E O ESPÍRITO SANTO
Autor(es): DIEGO AMORIM Enviado especial
Correio Braziliense - 12/03/2013
 

O mundo inteiro estará de olho hoje na chaminé da Capela Sistina. Nesta manhã, 115 cardeais de 50 países se reúnem a portas fechadas no recinto . Eles só sairão de lá quando uma fumaça branca subir anunciando a 1,2 bilhão de fiéis que a Igreja Católica tem um novo papa. O conclave tanto pode ter minar ainda nesta terça-feira, depois da primeira votação, à tarde, quanto se estender por tempo indeterminado. Enviado especial do Correio ao Vaticano, o repórter Diego Amorim relata que, embora haja favoritos — como o arcebispo de Milão, Angelo Scola, e o brasileiro dom Odilo Scherer —, o processo, iniciado após a inesperada renúncia de Bento XVI, pode terminar de forma tão surpreendente como começou. Isso porque, em tese, qualquer um dos cardeais que participam do encontro está apto a ocupar o trono de Pedro e usar a mitra (alto) que o artesão colombiano Luis Abel Delgado , 44 anos, confeccionou para o próximo pontífice. Para isso , o religioso precisa obter o voto de pelo menos 70 colegas

Na manhã de hoje, depois de invocar inspiração divina, os cardeais serão trancados na Capela Sistina para o conclave que elegerá o novo papa

Cidade do Vaticano — Chegou o dia. Hoje, 115 homens vão se isolar do mundo para eleger quem assumirá a barca de Pedro em plena tempestade. Sob o inspirador teto da Capela Sistina, com os célebres afrescos renascentistas, cardeais de 50 países terão de chegar a um consenso e, em votação ultrassecreta, indicar a 1,2 bilhão de fiéis o novo líder da Igreja Católica. Desde o anúncio de que Bento XVI deixaria o cargo, um mês atrás, nomes de prováveis sucessores vieram à tona. Mas, embora haja favoritos, o processo pode terminar tão surpreendente quanto começou.

Na manhã de ontem, os purpurados se reuniram pela última vez antes do conclave, encerrando uma maratona de 10 encontros em sete dias. Ao longo das 27 horas de Congregações Gerais, houve 161 intervenções e, ainda assim, nem todos os inscritos tiveram oportunidade de dizer o que pensam. Na extensa pauta, desabafos e cobranças públicas, o perfil do próximo pontífice e temas espinhosos, como o escândalo do Vatileaks e a situação financeira da Santa Sé.

Vencido o arrastado período de preparação, está tudo pronto para os cardeais tomarem a decisão mais esperada pelos católicos. Bombeiros do Vaticano instalaram ontem a cortina vermelha no balcão central da Basílica de São Pedro, que se abrirá para o novo papa ser apresentado ao povo. Cerca de 90 pessoas que trabalharão na área do conclave — entre enfermeiros, médicos, seguranças e o pessoal da limpeza — juraram silêncio sobre tudo o que vão ver e ouvir nos próximos dias.

Às 10h (6h em Brasília), os eleitores rezarão uma missa para pedir ajuda ao Espírito Santo, em um momento delicado e decisivo para a Igreja. Depois, seguirão em procissão para a Capela Sistina, onde serão fechados a chave sob a proclamação de Extra omnes (“todos fora”). À tarde ocorrerá o primeiro escrutínio, e vários cardeais tendem a receber votos. Segundo o porta-voz do Vaticano, o padre Federico Lombardi, dificilmente haverá uma definição hoje. Até sexta-feira, porém, a fumaça branca deverá ser avistada da Praça de São Pedro, anunciando que um papa foi eleito.

Incomunicáveis

Até sair um vencedor, os cardeais se manterão enclausurados. A Casa Santa Marta, onde ficarão alojados, teve os sistemas de internet e telefonia bloqueados. Até os televisores foram retirados. Somente durante as refeições os cardeais poderão conversar entre si. O responsável por conduzir o conclave, na condição de decano do Colégio dos Cardeais, será o italiano Giovanni Battista Re, um dos que teriam declarado apoio a dom Odilo Scherer, o brasileiro mais citado nas bolsas de apostas da sucessão papal.

Apesar de indicarem uma polarização entre dom Odilo, arcebispo de São Paulo, e o italiano Angelo Scola, titular da arquidiocese de Milão, jornais europeus, abastecidos com informações de vaticanistas, informaram ontem que mais da metade dos cardeais não entrará para o conclave com voto definido, o que poderia estender o processo e anular previsões. Há que levar em conta, ainda, a força de nomes que correm por fora, como os dos arcebispos de Boston, Sean O’Malley, e de Nova York, Timothy Michael Dolan, além do canadense Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos.

Para o povo que espera ansioso pelo tradicional pronunciamento de Habemus papam (“temos um papa”), pouco importa se as especulações vão se confirmar ou não. “Não sei quem vai ser, mas espero que seja jovem. Se for para ficar só de enfeite, não serve”, opina a aposentada paulista Amália Irani, 64 anos, “católica praticante”. Como outras milhares de pessoas, ela pretende fazer plantão na praça à espera da fumaça branca.

Mesmo entre os fiéis mais fervorosos, os papáveis são pouco conhecidos. Quase ninguém consegue indicar um cardeal preferido. “Não sei quem são, mas torço por um latino-americano. Somos mais católicos que os europeus”, comenta a cubana Karina Rodrigues, 37, de férias pela Itália. “Queria alguém mais aberto, mas não é o papa quem vai ditar o que eu tenho de fazer”, completa a amiga peruana Heidy Fischer, 37.

Acompanhado da esposa e da filha no passeio pelo Vaticano, o comerciante venezuelano René Barandela, 33, diz ter uma referência para o futuro pontífice. “Precisamos de um papa carismático como (Hugo) Chávez”, dispara ele, referindo-se ao presidente morto na semana passada. A partir de hoje, se intensificarão as apostas, as orações, e os olhos do mundo se voltarão de vez para Roma.

Depoimento
Aos fiéis, cabe dizer amém

Com o início do conclave, aumentarão as especulações em torno de quem será o novo papa. Enquanto a fumaça branca não for avistada, de todos os lados surgirá quem tente adivinhar o sucessor de Bento XVI. Nada mais natural.

Três são os nomes mais falados, não necessariamente nessa ordem: Angelo Scola (Itália), Odilo Scherer (Brasil) e Marc Ouellet (Canadá). Mas há um punhado de outros cardeais citados. Correndo por fora, um deles pode surpreender.

A avaliação possível de ser feita, no momento, é assim mesmo: solta, indefinida, especulativa, quase vaga. Há mais de 10 dias em Roma, estou convencido de que o colégio cardinalício não pode ser encarado como um parlamento qualquer.

Há, sim, entre os humanos purpurados, grupos, tendências e preferências. Mas não se trata da mesma lógica adotada por partidos políticos. Por isso, dificilmente alguém consegue “violar o painel” da Capela Sistina.

Os “príncipes da Igreja” vivem sujeitos a disputas de poder, vaidades, carreirismo e tantas outras práticas pouco evangélicas. Não parecem, porém, muito dispostos a, “diante de Deus e pelo bem da Igreja”, exercer voto de cabresto.

A cada conclave, os eleitores-candidatos insistem no fator espiritual e, portanto, na surpresa da votação secreta. Unânimes, creditam a palavra final ao Espírito Santo, porque é nisso que creem. A nós, reles mortais, ao menos por ora, resta dizer amém.

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