As vítimas da repressão | ||
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por Silvio Caccia Bava | ||
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O momento é propício para atender ao clamor que surgiu das
manifestações de junho e que continua a se expressar de maneira
pulverizada todos os dias nas principais cidades do país. Foi o clamor contra a violência da polícia militar praticada contra as manifestações, criminalizando as manifestações, que trouxe para as ruas a solidariedade de milhões ao movimento do passe livre. Esse momento evidenciou que o policiamento da cidade não pode ser feito por militares. Eles têm uma formação para identificar o inimigo e destruí-lo. Cidadãos e cidadãs se manifestando em defesa de seus direitos, na sua cidade, não podem ser tratados assim. Por toda parte aconteceu o mesmo comportamento da polícia militar. Não foi só em São Paulo ou no Rio de Janeiro. O Exército tem a nobre função de proteger o país, não de reprimir seus cidadãos. A unificação das polícias, sua desvinculação do Exército, a criação de uma carreira e a melhora da remuneração, da formação e das condições de trabalho de seus integrantes serão um avanço enorme para a democracia, o respeito aos direitos humanos, para a própria polícia, e para a segurança pública. Essas propostas estão na PEC 51, um projeto de emenda constitucional apresentado pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ) que tramita no Congresso. Sua aprovação será um importante sinal de que o Congresso está ouvindo o clamor das ruas. O estado de guerra, com execuções sumárias por parte da polícia militar de traficantes, bandidos, suspeitos, jovens negros, pobres, tem de acabar. Os governos de estados, que têm a polícia sob sua responsabilidade, devem à população a garantia da paz, precisam desfazer-se das heranças da ditadura e de suas políticas de repressão. A política do terror, amplamente potenciada pela mídia; a militarização da gestão pública; a ocupação de territórios e a imposição da lei marcial, toque de recolher, proibição de atividades civis como os bailes funk, o controle militar de entradas e saídas das favelas; a prisão arbitrária de dezenas de milhares de “suspeitos” que ficam anos nas cadeias sem acusações, sem processos, presos “para averiguação”; tudo isso faz parte de uma estratégia que visa submeter pelo medo a sociedade e impedir que ela se articule e se revolte contra a espoliação de que é vitima. Espoliação pela privação de políticas sociais, serviços e equipamentos públicos indispensáveis para a vida nas cidades. O problema é que o medo se instalou na população. A violência se banalizou, tornou-se cotidiana. Cerca de 140 pessoas são assassinadas todo dia no Brasil. Em maio e junho de 2006 a polícia militar assassinou 993 pessoas na periferia de São Paulo como represália aos ataques do PCC. E grande parte dos cidadãos e cidadãs aceita ser privada de seus direitos em nome da luta contra o crime. Essa aceitação é o mal maior. É ela que sustenta a liberdade de ação do Estado nessa dimensão criminosa. Ela é fruto da contínua campanha da mídia conservadora para produzir o medo na população. Ela produz a servidão voluntária, um estado de alienação de liberdade e de direitos que se naturaliza pela repetição cotidiana. Os movimentos de junho foram uma escola. Ensinaram pacificamente que o protagonismo da cidadania supera esse estado de servidão voluntária e apatia, e pode reverter políticas de governo como os aumentos de tarifas de transporte, canceladas em muitas cidades brasileiras pela pressão das manifestações. Para superar o estado de guerra em que nos encontramos – os assassinatos aqui são mais numerosos que as baixas da guerra do Iraque no seu momento mais agudo – é preciso enfrentar muitos problemas, dentre os quais a desigualdade social é o principal, um problema crônico e que se agudiza, a verdadeira razão da violência, e que precisa ganhar espaço na agenda dos debates públicos. Novamente os movimentos de junho e os que se seguiram apontam o caminho para combater a desigualdade com medidas concretas: a proposta da catraca livre, da tarifa zero, propõe que políticas e serviços públicos deixem de ser cobrados, tornem-se bens públicos comuns, pagos não pelo usuário, mas pelos impostos de todos. Outras medidas, com efeito de curto prazo, poderão trazer resultados muito significativos. A unificação das polícias nos termos da PEC 51 é uma delas. Os recentes acontecimentos em São Paulo, onde um coronel da PM foi agredido pelos black blocs, geraram uma disposição de retaliação por parte da PM que trará graves consequências para a segurança pública e para a democracia. Os black blocs são um problema, mas precisamos encontrar outras formas de enfrentar a revolta social. Revidar violência com violência nos leva a um estado de guerra que não interessa à sociedade, só faz militarizar a questão social, e suas maiores vitimas são a democracia e a Constituição.
Silvio Caccia Bava
Diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil |
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domingo, 2 de fevereiro de 2014
As vítimas da repressão
‘Prisões precisam ser do século em que vivemos’, diz integrante da ONU
‘Prisões precisam ser do século em que vivemos’, diz integrante da ONU
O Globo - 13/01/2014 |
Representante para a América do Sul do
escritório para Direitos Humanos da ONU, Amerigo Incalcaterra lembra a
importância da imagem do Brasil na área de segurança Representante para a América do Sul do escritório para Direitos Humanos da ONU, Amerigo Incalcaterra lembra a importância da imagem do Brasil na área de segurança, diz que país não implantou mecanismo contra tortura, e sugere que a União poderia assumir os sistemas carcerários estaduais. Como vê o quadro do sistema prisional no Maranhão? É lamentável e preocupante, tanto pela violência que já deixou número alarmante de mortos, como pelas condições das prisões, incluindo a superlotação, que alimenta a violência e constitui grave violação de direitos humanos. Também me preocupa que situações como a de Pedrinhas possam se replicar em outros presídios brasileiros. O país conta com uma população carcerária de mais de meio milhão de pessoas; isso o coloca entre um dos países com mais presos no mundo. Por isso o escritório para Direitos Humanos da ONU fez um pedido urgente (semana passada) para que se realize uma investigação rápida, imparcial e efetiva dos fatos, não só para identificar os responsáveis por esses crimes atrozes (no MA), mas principalmente para que as autoridades e a sociedade façam uma reflexão profunda sobre o modelo carcerário no país. Ele tem de ser de acordo com o século em que vivemos. Quando foram as visitas mais recentes de representantes da ONU a presídios do Maranhão ou de outro estado brasileiro? Foram do Grupo de Trabalho sobre Detenções Arbitrárias (GTDA, da ONU). Em março de 2013, o GTDA visitou prisões em Brasília, Campo Grande, Fortaleza, Rio e São Paulo, e viu falta de acesso à Justiça pelos detentos, uso excessivo de medidas privativas de liberdade em detrimento de punições alternativas, prisão preventiva prolongada, discriminação contra indígenas presos. Em 2012, o Comitê para Eliminação da Discriminação contra a Mulher da ONU manifestou preocupação com as condições precárias, a superlotação e a violência sexual nas prisões. E, em 2011, o Subcomitê para Prevenção da Tortura (SPT, também da ONU) visitou prisões no Rio, no Espírito Santo, em Goiás e em São Paulo, e constatou superlotação, impunidade por tortura, assistência deficiente de saúde, e corrupção. Uma das recomendações do SPT ao Brasil foi estabelecer um mecanismo nacional de prevenção da tortura, para fiscalizar as prisões. Há algum tipo de sanção que a ONU poderia aplicar ao Brasil por causa da situação no Maranhão? A primeira responsabilidade é do Estado brasileiro. Além de investigações, o Estado deve adotar uma política carcerária que inclua agentes penitenciários treinados e bem remunerados, revisão da legislação penal e programa de reabilitação dos detentos. Ao ratificar a maioria dos tratados internacionais de direitos humanos, o Brasil assumiu o compromisso de cumpri-los de boa-fé. Os mecanismos de direitos humanos das Nações Unidas auxiliam os Estados nesse cumprimento, com medidas como informes e visitas de monitoramento. Mas nenhuma mudança real poderá ocorrer sem uma clara e decidida vontade do Estado de tomar medidas legais, institucionais e de políticas públicas. O Brasil tem demonstrado claro compromisso internacional com os direitos humanos, ratificando tratados. É, inclusive, membro atual do Conselho de Direitos Humanos. E adotou uma lei que cria um mecanismo nacional de prevenção da tortura; no entanto, ele não está implementado. É urgente que ele comece a operar o quanto antes, com independência funcional e autonomia financeira. Além disso, numa Federação como o Brasil, os estados podem não dispor de recursos e formação necessários para cumprir com os padrões carcerários que o país assumiu em nível internacional. Por isso, é conveniente que se discuta a pertinência de o governo federal assumir a responsabilidade do sistema carcerário. A imagem do país em matéria de direitos humanos deve estar acima de qualquer outra consideração. |
VERBA DA SEGURANÇA NÃO É APROVEITADA E UNIÃO RECEBE DE VOLTA R$ 135 MILHÕES
VERBA DA SEGURANÇA NÃO É APROVEITADA E UNIÃO RECEBE DE VOLTA R$ 135 MILHÕES
VERBA DA SEGURANÇA NÃO É APROVEITADA E UNIÃO RECEBE DE VOLTA R$ 135 MILHÕES |
O Globo - 13/01/2014 |
Apesar dos altos índices de homicídios no
país e de a violência ser apontada como um dos principais problemas
pela população brasileira, estados, municípios e ONGs não conseguem
gastar toda a verba federal que recebem para a área de Segurança
Pública. Números da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp),
do Ministério da Justiça, mostram que, nos últimos três anos, o governo
federal recebeu de volta R$ 135,35 milhões que havia repassado a
estados, municípios e ONGs por meio de convênios. Hoje, uma comissão de
senadores visitará o presídio de Pedrinhas, no Maranhão, onde 59
presos foram decapitados só em 2013. Segundo a Senasp, as devoluções têm três motivos. Dois indicam mau uso da verba: ou houve irregularidades no projeto ou ele simplesmente não foi executado. O terceiro, ao contrário, aponta bom aproveitamento do dinheiro: o projeto foi executado gastando menos do que o previsto. De acordo com a secretaria, não é possível separar quanto estados, municípios e ONGs devolveram por terem enfrentado problemas na execução dos convênios e quanto por terem conseguido economizar. Mas foi em tom de reclamação que a titular, a secretária Regina Miki, disse que todos os estados vêm devolvendo parte da verba nos últimos anos. Em outubro, numa palestra, ela lembrou que o governo federal depende de ações de governos estaduais e municipais para conseguir efetivar as políticas na área de Segurança. São Paulo foi onde governo, municípios e ONGs mais devolveram recursos nos últimos três anos: R$ 23,3 milhões. Em seguida, vêm Rio Grande do Norte (R$ 12,08 milhões), Rio Grande do Sul (R$ 7,9 milhões), Pernambuco (R$ 7,71 milhões), Rio (R$ 7,71 milhões), Paraná (R$ 7,68 milhões) e Amazonas (R$ 7,52 milhões). No Rio, foram devolvidos R$ 3,1 milhões em 2011, R$ 461,9 mil em 2012 e R$ 4,14 milhões em 2013. Segundo o Ministério da Justiça, os R$ 135,35 milhões devolvidos se referem a todos os convênios na área de Segurança, o que abrange o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) e outros. Isso inclui, ainda, parcerias firmadas em anos anteriores, mas cujos recursos foram devolvidos só em 2011, 2012 ou 2013. O levantamento também inclui municípios e ONGs pois, diz a Senasp, “não há como separar esta informação nos sistemas”. Mas, desde 2011, já não são feitas parcerias com ONGs. De acordo com o ministério, são muitos os motivos alegados para a devolução. Um deles é o início tardio da execução do convênio por problemas na estrutura administrativa. Também há falhas nos processos licitatórios. Em outros casos, falta pessoal capacitado, ou o quadro de funcionários é incompatível com a demanda. Outro motivo possível é aquisição de bens ou serviços a custo menor que o previsto. Os R$ 135,35 milhões devolvidos seriam suficientes para cobrir os gastos com programas importantes em Segurança Pública. O dinheiro cobriria, por exemplo, a maior parte das despesas da Senasp com a aquisição de 38 scanners veiculares usados no combate a contrabando, tráfico de drogas, de armas e de pessoas, a serem doados a todos os estados. O custo da compra ficou em U$ 66,5 milhões (R$ 159,6 milhões). Os valores devolvidos também seriam suficientes para construir três presídios federais como o previsto para Brasília, estimado em R$ 38 milhões. O sociólogo da Universidade de Brasília (UnB) Flávio Testa, também professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), diz que o mau uso das verbas não é culpa só de estados, municípios e ONGs. Segundo ele, o governo federal tem sua parcela de culpa. —Há muita burocracia por parte do governo federal. Os controles, não que sejam muito rigorosos, mas são burocráticos demais. E há um jogo político. Quando você tem muitas exigências burocráticas, acaba perdendo prazo. E, evidentemente, há também, por parte dos estados, certa negligência no preparo de suas equipes para negociar a liberação de recursos. O governo federal deveria cobrar dos estados mais efetividade. Além das dificuldades para gastar os recursos, em alguns casos também foram detectadas irregularidades. De janeiro de 2011 a setembro de 2013, a Controladoria Geral da União (CGU) fez 12 tomadas de contas especiais em repasses do Ministério da Justiça. Ao todo, segundo a CGU, estados e municípios terão de devolver à União R$ 7,3 milhões. Outras 3 inspeções, estas em convênios com ONGs, apontaram irregularidades de R$ 3,6 milhões. Mas não só os estados têm problemas para aplicar os recursos. O governo federal também executa pouco do orçamento. Dados oficiais mostram um orçamento total de R$ 32 bilhões para ações de Segurança entre 2011 e 2013. No mesmo período, incluindo valores liberados em anos anteriores, mas que ainda não tinham sido pagos, foram gastos R$ 14,1 bilhões — ou seja, menos da metade. — Do jeito que está, não funciona. Acho que a Senasp tem uma dificuldade imensa de entender o Brasil, de fazer um planejamento estratégico e negociar com os governadores um plano estratégico de Segurança Pública — diz Testa. |
Maranhão imerso no caos
Maranhão imerso no caos
Correio Braziliense - 08/01/2014 |
Os
60 assassinatos de 2013 no Complexo Penitenciário de Pedrinhas —
somados aos dois já consumados em 2014 — escancararam as condições
subhumanas de sobrevivência no presídio superlotado. Com os episódios da
última sexta-feira, quando atos de vandalismo vitimaram uma menina de 6
anos e deixaram outros quatro hospitalizados, a questão saiu de
Pedrinhas e aterrorizou os maranhenses. Submetida às condições de vida
de um estado que frequenta assiduamente as piores posições em rankings
de desenvolvimento humano e social (veja quadros), a população também
perdeu parcialmente o direito de ir e vir — muitos motoristas de ônibus e
cobradores têm se recusado a trafegar durante à noite, com medo de
ataques incendiários.
O
deputado estadual César Pires (DEM) garante que a governadora Roseana
Sarney tem escutado "sem vaidade" a todos que possam contribuir para
resolver o caos em Pedrinhas. O líder do governo na Assembleia Estadual
do Maranhão diz que não se fala em outra coisa no Executivo ou no
Legislativo estaduais, deixando de lado até mesmo discussões sobre as
eleições de outubro. Para o padre Elisvaldo Cardoso, coordenador da
Pastoral Carcerária no Maranhão, no entanto, a situação só se resolverá
com mudanças profundas e estruturais, que envolvem muito mais do que o
sistema carcerário. "Dar um basta à violência dentro dos presídios não
significa só ter mais cadeias, mas também mais salas de aula,
professores valorizados, crianças e jovens estudando e se
profissionalizando. Aí sim, vamos diminuir, com certeza, o número de
presos."
"O
problema da segurança pública envolve várias nuances. Não tem como
fugir disso", admite Pires. O ex-reitor da Universidade Estadual do
Maranhão (UEMA) pondera, no entanto, que "esse upgrade social demora".
"A evolução das coisas está acontecendo. Poderia estar melhor, mas não
posso dizer que há inação do governo". De acordo com ele, o estado tem
conseguido "colocar os alunos na sala de aula", mas a dívida é grande.
"Se formos conceituar a importância da educação, teríamos que remontar à
construção da historiografia nacional. Pagamos o preço disso", analisa.
O parlamentar acredita que a ignorância também contribui para que as
pessoas não melhorem de vida. "A sociedade, por não ter conhecimento,
não sente a dor do analfabetismo. Para um pai, é mais fácil que o filho
renda R$ 180 por semana como ajudante de pedreiro, do que um filho
estudando e, 15 anos depois, se formando."
Para
Zema Ribeiro, da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), a
privação de direitos básicos a que a população é submetida tem razões
claras. "O que tem de riqueza aqui está vinculada aos megaprojetos — que
são riquezas que passam. O minério vem de Carajás, passa por aqui e vai
para a China. A soja, que cresce cada vez mais, é tirada daqui e
exportada. O povo mesmo não fica com nada", comenta. Além disso, o que
poderia ficar para a população é "captado pela corrupção". "A pessoa que
passa quatro anos com os direitos essenciais sendo violados. Quando se
aproxima a eleição, e vê um filho com fome, uma esposa doente, se
submete a trocar o voto por um favor. Isso se reflete na espécie de
acomodação da população maranhense", critica.
O
deputado federal Domingos Dutra (Solidariedade-MA) analisa que os
marginalizados do lado de fora são os que acabam indo para os presídios.
"Há um vinculo forte entre pobreza, a miséria aqui fora, com o que está
lá dentro (do presídio). Lá só tem gente lascada, de "colarinho preto",
como digo: de baixa renda e originários de periferias", lamenta. Para o
parlamentar, que foi relator da CPI do Sistema Carcerário, "no Maranhão
isso fica mais evidente, graças à concentração histórica de renda".
"A
pessoa que passa quatro anos com os direitos essenciais sendo violados.
Quando se aproxima a eleição, e vê um filho com fome, uma esposa
doente, se submete a trocar o voto por um favor"
Zema Ribeiro,
da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos |
Cabe ao Maranhão resolver violência, diz ministra
Cabe ao Maranhão resolver violência, diz ministra
Cabe ao Maranhão resolver violência, diz ministra |
Jornal de Brasília - 08/01/2014 |
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Roseana aceita transferir presidiário do maranhão
roseana aceita transferir presidiário do maranhão
governo do maranhão envia relatório à pgr sobre presídios e critica cnj |
O Globo - 07/01/2014 |
Para
Secretaria de Comunicação do governo, relatório do CNJ traz ‘inverdades
com objetivo de agravar a situação nas unidades prisionais do estado’
SÃO
LUÍS - O governo do Maranhão encaminhou, nesta segunda-feira, relatório
à Procuradoria-Geral da República detalhando as medidas tomadas nos
últimos anos para solucionar os problemas do sistema carcerário do
estado. O documento critica o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que
denunciou em relatório as sérias violações de direitos humanos no
Complexo Penitenciário de Pedrinhas, onde morreram 60 presos em 2013.
Em
nota, o governo do Maranhão diz que não compactua com “inverdades que
foram levadas a público pelo juiz do Conselho Nacional de Justiça, com o
único objetivo de agravar ainda mais a situação nas unidades prisionais
do estado e numa clara tentativa de descredibilizar medidas que já
haviam sido determinadas pelo Governo”.
O
relatório do governo do Maranhão servirá de base para o
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, decidir se pedirá
intervenção federal no estado no Supremo Tribunal Federal (STF), por
causa da situação nos presídios.
Hoje,
morreu a primeira vítima dos incêndios a ônibus que feriram cinco
pessoas na última sexta-feira. A ordem para os ataques teria partido de
dentro da prisão, segundo Aluísio Mendes, secretário de Segurança
Pública do estado.
De
acordo com a Secretaria de Comunicação do governo maranhense (Secom),
já foram investidos R$ 131 milhões na ampliação do número de vagas no
sistema carcerário e reaparelhamento de todas as unidades prisionais do
Maranhão. As obras já estariam em execução ou em fase de contratação. Em
outubro de 2013, foi decretada situação de emergência no Complexo
Penitenciário de Pedrinhas, quando o governo do estado pediu reforço da
Força Nacional para garantir a segurança no complexo prisional.
As
críticas ao relatório do CNJ continuam. Para o governo, a denúncia de
que mulheres estariam sendo estupradas em Pedrinhas é infundada. “A
Secretaria de Justiça e Administração Penitenciária não recebeu até hoje
nenhum relato de estupro de mulheres ou irmãs de apenados”, diz a
Secom.
O
juiz Douglas Martins, que fez a inspeção na unidade prisional de
Pedrinhas em dezembro do ano passado, constatou a precariedade do
sistema prisional maranhense. “O Governo do Estado do Maranhão já
recebeu várias indicações da necessidade de estruturar o sistema com o
preenchimento dos cargos na administração penitenciária, construção de
pequenas unidades prisionais no interior do Estado, além de outras
medidas estruturantes que possibilitem ao Estado o enfrentamento das
facções do crime organizado”, diz o relatório do CNJ.
O
governo do estado desmente ainda a afirmação do juiz de que teria sido
impedido de entrar no complexo por líderes de facções criminosas.
“O
juiz afirmou também que tinha sido proibido, “por líderes de facções”,
de ter acesso a Pedrinhas, quando na verdade foi aconselhado por pessoas
da direção do presídio a voltar em outro momento, para não constranger
familiares, já que a vistoria ocorria em horário de visita ao Presídio
no período de Natal. O representante do CNJ preferiu ir embora”.
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83.500 vagas prometidas, nenhuma entregue
83.500 vagas prometidas, nenhuma entregue
Correio Braziliense - 30/12/2013 |
A presença de visitantes ilustres, como o ex-ministro José Dirceu e o ex-deputado federal José Genoino, descortinou o mundo caótico do sistema prisional no Brasil, conhecido bem só pelos profissionais que nele trabalham ou quem o estuda. Quando os primeiros mensaleiros foram presos no Complexo Penitenciário da Papuda, advogados se apressaram em bradar as ilegalidades. A primeira delas, alocar detentos de regime semiaberto em unidade fechada, evidencia uma das principais mazelas do setor: a falta de 240 mil vagas para abrigar 548 mil apenados. O problema da superlotação poderia ser menor caso o governo federal, chefiado nos últimos 11 anos pelo partido dos detentos mais célebres do caso, tivesse cumprido os dois planos lançados para a área carcerária, com a promessa de 83,5 mil vagas. Desse total, nenhuma foi entregue até agora. O levantamento das promessas para o sistema prisional faz parte de um balanço que o Correio publica hoje e amanhã sobre o tema. A primeira investida no setor foi dada ainda pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No bojo do Programa Nacional de Segurança com Cidadania (Pronasci), ele incluiu a abertura de 41 mil vagas em unidades de jovens e adultos. A ideia era separar os presos por idade, crime cometido, periculosidade, reincidência. Nada foi criado e a tal separação, imprescindível para uma boa gestão do sistema, só é cumprida, hoje, por cerca de 30% dos estabelecimentos prisionais do país, de acordo com pesquisa feita pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Lula passou o bastão para a atual presidente, Dilma Rousseff, que reembalou a promessa em 2011, falando em 42,5 mil vagas para mulheres e presos provisórios. Por enquanto, nada saiu do papel. As 32 mil vagas que surgiram no período das promessas presidenciais não cumpridas, de 2008 para cá, foram criadas pelos estados, que têm responsabilidade sobre a questão penitenciária. O fato de nada do que foi anunciado em 2011 pelo governo federal ter sido entregue, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), ligado ao Ministério da Justiça, tem a ver com a complexidade do processo de contratação das obras. Em nota, o órgão afirma que é "preciso o estado elaborar o projeto, o Depen e a Caixa (Econômica Federal), na condição de mandatária da União, precisam aprová-lo (obedecendo a legislação pertinente), o estado precisa dar início ao processo licitatório, e assim por diante". O Depen acrescentou que há cinco obras iniciadas no Ceará, Sergipe e Goiás, totalizando 1.790 vagas. Outros quatro projetos já foram licitados e os demais estão em fase inicial de análise. O ritmo lento de investimentos federais no setor prisional pode ser verificado na execução do orçamento para o setor. Só 37% dos R$ 3,9 bilhões autorizados para o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), na última década, foram efetivamente pagos — quando se dá a entrega da obra, do equipamento adquirido ou do serviço prestado. Há R$ 2,2 bilhões (ou 57% do total) empenhados, o que significa que o objeto do contrato ainda não foi completamente entregue. Coordenador do Núcleo de Execução Penal da Defensoria Pública do Distrito Federal, Leonardo Melo Moreira explica que, apesar da existência da verba federal para construção de vagas, os entes federativos costumam postergar tais obras. "Às vezes para não desagradar determinada parcela da população que reside naquelas cercanias ou mesmo em razão do custo de manutenção de agentes penitenciários por parte daquele estado", diz. |
40% dos presos não têm sentença
40% dos presos não têm sentença
Correio Braziliense - 30/12/2013 |
Pelo contrário, a quantidade subiu desde que a lei foi aprovada, passando de 218 mil para os atuais 229 mil. "Há uma resistência de juízes e promotores em aplicar as medidas cautelares, motivados principalmente pela falta de estrutura para fiscalizar que os governos estaduais deveriam proporcionar. Na dúvida, preferem manter o acusado preso", lamenta Rafael Custódio, coordenador do programa de justiça da organização não-governamental Conectas. Para ele, a proporção absurda de presos provisórios é um dos piores problemas do sistema penal do Brasil. "Não ignoramos a falta de vagas, mas é preciso parar com a política de encarceramento, que vai do ladrão de carteira ao usuário de drogas detido como traficante. Como se a prisão fosse a única resposta para o problema da criminalidade." (RM) |
terça-feira, 5 de novembro de 2013
A vergonhosa escalada dos estupros no Brasil Estupros superam os casos de assassinato Correio Braziliense - 05/11/2013 Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública revela o aumento expressivo de casos de violência sexual. E mostra que as políticas para o setor, na maioria dos estados, ignoram a importância de se investir em inteligência RENATA MARIZ Uma das estatísticas mais preocupantes que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública apresentará hoje, no lançamento da 7ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, é o número de estupros em 2012, que superou homicídios dolosos (com intenção de matar). Foram 50.617 casos de violência sexual, que representam 26,1 estupros por grupo de 100 mil habitantes — aumento de 18,1% em relação a 2011, que teve 22,1 casos por grupo de 100 mil pessoas. No caso dos assassinatos, foram feitos 47,1 mil registros. O fórum não antecipou os números de estupros por unidade da Federação, apenas divulgou alguns exemplos para ilustrar o resultado da pesquisa. Roraima, com 52,2 casos por 100 mil habitantes, Rondônia (49/100 mil) e Santa Catarina (45,8/100 mil) foram os estados com maior número de ocorrências de violência sexual. Paraíba (8,8/100 mil) , Rio Grande do Norte (9,9/100 mil) e Minas Gerais (10,1/100 mil) registraram os menores índices. No Distrito Federal, com base nos dados da Secretaria de Segurança Pública de janeiro a setembro de 2012, o número de estupros também cresceu significativamente: foram registrados 745 casos no período, contra 567 nos três primeiros trimestres de 2011, aumento de 31,4%. Ceilândia, Planaltina, Taguatinga e Plano Piloto lideraram a estatística no período. No quesito mortalidade violenta, o Brasil registrou aumento na taxa: de 22,5 homicídios por 100 mil habitantes para 24,3, um avanço de 7,8%. Alagoas continua no topo da lista dos assassinatos, com 58,2 mortes por 100 mil habitantes. Mas houve um recuo importante em relação a 2011, de 21,9%. Quem mais reduziu taxa de mortes, entretanto, foi o Espírito Santo, estado marcado pela violência. Lá, os homicídios atingiram 41,1 por grupo de 100 mil habitantes, em 2011. Ano passado, a taxa diminui 33%, passando para 27,5 mortes a cada 100 mil habitantes. Na outra ponta, o Amapá registrou o maior incremento na proporção de homicídios, saindo de 3,4 por 100 mil habitantes, em 2011, para 9,9 em 2012. Um avanço de 193,9%. O estudo ressalta, porém, que o Amapá é do grupo de estados com sistema ruim de informações, que prejudica o levantamento de dados. Inteligência pobre Independentemente do local, a cada crise na segurança pública o discurso das autoridades é sempre o mesmo. Coloca-se na mesa a necessidade de as ações policiais se basearem em dados de inteligência e troca de informações. Só que, na prática, essas duas áreas, consideradas fundamentais para o combate à violência, recebem uma atenção mínima das autoridades. Só 1,4% dos R$ 61,1 bilhões investidos pelos estados na segurança foram canalizados para tais setores. Na média, cada unidade da Federação gastou, em estruturas de informação e inteligência, R$ 27,62 milhões, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. No ranking dos estados que menos atenção deram a esse tipo de investimento estão Rio de Janeiro, com apenas R$ 19 mil liberados, Goiás (R$ 26,9 mil) e Santa Catarina (R$129,5 mil). No outro extremo, com aportes recorde de recursos, vêm São Paulo, com R$ 273,2 milhões, Mato Grosso do Sul (R$ 89 milhões) e Minas Gerais (R$ 76,1 milhões). Ex-investigador da Polícia Civil de São Paulo, doutor em crime organizado pela Universidade de São Paulo (USP) e consultor em inteligência e análise criminal, Guaracy Mingardi ressalta que o maior problema brasileiro, na área, é a falta de integração entre as forças de segurança. “Polícia Militar e Polícia Civil, de um mesmo estado, não conversam. Quando a troca de informações se faz necessária entre unidades da Federação, a coisa se complica ainda mais”, afirma Mingardi, que é membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Colaborou Vinicius Doria
A vergonhosa escalada dos estupros no Brasil
Estupros superam os casos de assassinato |
Correio Braziliense - 05/11/2013 |
Levantamento do Fórum Brasileiro de
Segurança Pública revela o aumento expressivo de casos de violência
sexual. E mostra que as políticas para o setor, na maioria dos estados,
ignoram a importância de se investir em inteligência
RENATA MARIZ
Uma
das estatísticas mais preocupantes que o Fórum Brasileiro de Segurança
Pública apresentará hoje, no lançamento da 7ª edição do Anuário
Brasileiro de Segurança Pública, é o número de estupros em 2012, que
superou homicídios dolosos (com intenção de matar). Foram 50.617 casos
de violência sexual, que representam 26,1 estupros por grupo de 100 mil
habitantes — aumento de 18,1% em relação a 2011, que teve 22,1 casos por
grupo de 100 mil pessoas. No caso dos assassinatos, foram feitos 47,1
mil registros.
O fórum não antecipou os números de estupros por unidade da Federação, apenas divulgou alguns exemplos para ilustrar o resultado da pesquisa. Roraima, com 52,2 casos por 100 mil habitantes, Rondônia (49/100 mil) e Santa Catarina (45,8/100 mil) foram os estados com maior número de ocorrências de violência sexual. Paraíba (8,8/100 mil) , Rio Grande do Norte (9,9/100 mil) e Minas Gerais (10,1/100 mil) registraram os menores índices. No Distrito Federal, com base nos dados da Secretaria de Segurança Pública de janeiro a setembro de 2012, o número de estupros também cresceu significativamente: foram registrados 745 casos no período, contra 567 nos três primeiros trimestres de 2011, aumento de 31,4%. Ceilândia, Planaltina, Taguatinga e Plano Piloto lideraram a estatística no período. No quesito mortalidade violenta, o Brasil registrou aumento na taxa: de 22,5 homicídios por 100 mil habitantes para 24,3, um avanço de 7,8%. Alagoas continua no topo da lista dos assassinatos, com 58,2 mortes por 100 mil habitantes. Mas houve um recuo importante em relação a 2011, de 21,9%. Quem mais reduziu taxa de mortes, entretanto, foi o Espírito Santo, estado marcado pela violência. Lá, os homicídios atingiram 41,1 por grupo de 100 mil habitantes, em 2011. Ano passado, a taxa diminui 33%, passando para 27,5 mortes a cada 100 mil habitantes. Na outra ponta, o Amapá registrou o maior incremento na proporção de homicídios, saindo de 3,4 por 100 mil habitantes, em 2011, para 9,9 em 2012. Um avanço de 193,9%. O estudo ressalta, porém, que o Amapá é do grupo de estados com sistema ruim de informações, que prejudica o levantamento de dados. Inteligência pobre Independentemente do local, a cada crise na segurança pública o discurso das autoridades é sempre o mesmo. Coloca-se na mesa a necessidade de as ações policiais se basearem em dados de inteligência e troca de informações. Só que, na prática, essas duas áreas, consideradas fundamentais para o combate à violência, recebem uma atenção mínima das autoridades. Só 1,4% dos R$ 61,1 bilhões investidos pelos estados na segurança foram canalizados para tais setores. Na média, cada unidade da Federação gastou, em estruturas de informação e inteligência, R$ 27,62 milhões, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. No ranking dos estados que menos atenção deram a esse tipo de investimento estão Rio de Janeiro, com apenas R$ 19 mil liberados, Goiás (R$ 26,9 mil) e Santa Catarina (R$129,5 mil). No outro extremo, com aportes recorde de recursos, vêm São Paulo, com R$ 273,2 milhões, Mato Grosso do Sul (R$ 89 milhões) e Minas Gerais (R$ 76,1 milhões). Ex-investigador da Polícia Civil de São Paulo, doutor em crime organizado pela Universidade de São Paulo (USP) e consultor em inteligência e análise criminal, Guaracy Mingardi ressalta que o maior problema brasileiro, na área, é a falta de integração entre as forças de segurança. “Polícia Militar e Polícia Civil, de um mesmo estado, não conversam. Quando a troca de informações se faz necessária entre unidades da Federação, a coisa se complica ainda mais”, afirma Mingardi, que é membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Colaborou Vinicius Doria |
sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013
A cor dos homicídios no Brasil
A cor dos homicídios no Brasil |
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Entre
2002 e 2010, o país apresentou uma inquietante tendência de aumento da
distinção entre negros e brancos nos índices de mortalidade. Se os dados
globais de homicídio mudaram pouco nesse período, em torno de 27 para
cada 100 mil habitantes, foi em razão da queda dos homicídios brancos e
crescimento dos negros
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por Julio Jacobo Waiselfisz |
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![]() O Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde, construído com base nos padrões internacionais da Organização Mundial da Saúde, é a única fonte que temos disponível, até os dias de hoje, que verifica em nível nacional o quesito raça/cor das vítimas de homicídio. Esse item só foi incorporado em 1996, mas nos primeiros anos de vigência seu preenchimento foi muito deficitário, melhorando de forma progressiva. Assim, a partir de 2002, quando a identificação da raça/cor já estava na casa de 92%, pudemos considerar os dados suficientemente confiáveis para iniciar as análises sobre o tema. O último dado divulgado, até o momento, corresponde ao ano de 2010. Segundo os registros desse sistema, entre 2002 e 2010 morreram assassinados no país 272.422 cidadãos negros, o que dá uma média de 30.269 assassinatos por ano. Só em 2010 foram 34.983. Na cruenta Guerra do Iraque, as estimativas mais elevadas indicam que de 2003 até fins de 2009 morreram 110 mil pessoas, incluindo civis, o que significa 15,7 mil por ano. No Brasil, país que não aparenta ter conflitos étnicos, religiosos, de fronteiras, raciais ou políticos, morre assassinado o dobro de cidadãos negros todos os anos e mais do triplo – 52.260 em 2010 – de seus habitantes de todas as raças e cores. Embora os números sejam preocupantes, inquieta mais ainda a tendência crescente dessa mortalidade discriminante. Se os índices globais de homicídio do país nesse período mudaram pouco, em torno de 27 homicídios para 100 mil habitantes, foi em razão de uma associação inaceitável de queda dos homicídios de brancos e crescimento dos homicídios de negros: • Considerando o conjunto da população, entre 2002 e 2010 o número absoluto de vítimas brancas de homicídio caiu de 18.867 para 14.047, queda de 25,5%. Já as vítimas negras cresceram de 26.952 para 34.983, incremento de 29,8%. • Com isso, o índice de vitimização negra na população total, que em 2002 era 65,4% – morriam assassinados, proporcionalmente, 65,4% mais negros que brancos –, em 2010 pulou para 132,3%. • As taxas de vítimas entre os jovens negros – 15 a 29 anos de idade – duplicam, ou mais, os da população total. Assim, em 2010, se a taxa de homicídio da população negra foi de 36 em 100 mil, a dos jovens negros foi de 72 para 100 mil. • Com isso, a vitimização de jovens negros, que em 2002 era de 71,7%, em 2010 pulou para 153,9% – morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros que brancos. • Os dados também apontam que essa vitimização negra está crescendo de forma rápida e preocupante por suas implicações sociais e políticas. Esse é o panorama nacional, a média do país. Mas, se olharmos para as unidades da federação e, mais ainda, para os municípios, veremos situações extremas que deveriam ser fonte de séria atenção: • Seis estados apresentaram, em 2010, taxas de homicídio acima de 50 para 100 mil negros: Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pará, Pernambuco e Distrito Federal. • Oito unidades ultrapassaram a marca dos 100 homicídios para 100 mil jovens negros: Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco, Mato Grosso, Distrito Federal, Bahia e Pará. • Na Paraíba, em 2010, foram registrados 47 homicídios brancos e 1.335 homicídios negros. Considerando as respectivas populações, a taxa de homicídios brancos foi de 3,1 para 100 mil brancos contra 60,5 para 100 mil negros. Dessa forma, o índice de vitimização negra foi de 1.824: para cada branco morreram, proporcionalmente, dezenove negros. • Diversos especialistas estabelecem que níveis acima de 10 homicídios para 100 mil habitantes caracterizam situação de violência epidêmica. Todos os estados brasileiros superam esse patamar. As unidades com as menores taxas de homicídios negros em 2010, Santa Catarina e Piauí, ostentavam, respectivamente, 13,3 e 15 homicídios para 100 mil negros. • A heterogeneidade de situações torna-se ainda maior quando desagregamos os dados para os municípios do país, com casos extremos como o de Ananindeua, no Pará, onde em 2010 foram registrados 33 homicídios brancos e 705 negros, o que origina taxas de 29,3 homicídios para 100 mil brancos e 198,8 homicídios para 100 mil negros. No outro extremo, 2.936 municípios – 52,8% do total nacional – não registraram nenhum homicídio negro em 2010. • Não muito diferente é o panorama de algumas capitais do país, como João Pessoa (PB), onde, em 2010, foram assassinados 16 brancos e 545 negros, taxas de 4,9 homicídios brancos e 140,7 negros. Ou Maceió (AL), com 17 vítimas brancas e 774 negras. Dois fatores devem ser mencionados para a compreensão da situação. Em primeiro lugar: a crescente privatização do aparelho de segurança. Como já ocorrido com outros serviços básicos, como a saúde, a educação e, mais recentemente, a previdência social, o Estado vai se limitar a oferecer, para o conjunto da população, um mínimo – e muitas vezes nem isso – de acesso aos serviços e benefícios sociais considerados básicos. Para os setores com melhor condição financeira, serviços privados de melhor qualidade. Com a segurança vem ocorrendo esse processo de forma acelerada nos últimos anos. A pesquisa domiciliar do IBGE de 2011 é clara sobre as possibilidades diferenciais de acesso a serviços privados de melhor qualidade: as famílias negras tinham uma renda média de R$ 1.938,19, e as brancas, de R$ 3.183,07, isto é, 64,2% a mais. Em segundo lugar, e reforçando o anterior, as ações de segurança pública distribuem-se de forma extremamente desigual nas diversas áreas e espaços geográficos, priorizando sua visibilidade política e seu impacto na opinião pública e, principalmente, na mídia. Assim, em geral áreas mais abastadas, de população prioritariamente branca, ostentam os benefícios de uma dupla segurança, a pública e a privada, enquanto as áreas periféricas, de composição majoritariamente negra, nenhuma das duas. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, pedra fundamental de nossa moderna convivência, estabelece que: “Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal [...] sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”. Temos ainda um longo caminho para tornar realidade esse direito fundamental proclamado em 1948.
Julio Jacobo Waiselfisz
Coordenador da Área de Estudos da Violência da Faculdade
Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) e pesquisador do Centro
Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela).Ilustração: Jean Jullien |
domingo, 18 de novembro de 2012
MINISTRO DA JUSTIÇA ‘PREFERIRIA MORRER' A CUMPRIR PENA NO PAÍS
MINISTRO DA JUSTIÇA ‘PREFERIRIA MORRER' A CUMPRIR PENA NO PAÍS
MINISTRO DA JUSTIÇA PREFERIRIA MORRER A CUMPRIR PENA EM PRESÍDIO BRASILEIRO |
Autor(es): BEATRIZ BULLA |
O Estado de S. Paulo - 14/11/2012 |
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse em palestra a empresários, em São Paulo, que preferiria morrer a cumprir pena no País. Ele afirmou ainda que as condições dos presídios causam violações aos direitos humanos. "Temos um sistema prisional medieval, que não só desrespeita os direitos humanos como também não possibilita a reinserção." Ele disse que falava como cidadão, não como governante. Depois de afirmar que a corrupção do aparelho do Estado é um entrave para o combate ao crime, Cardozo evitou comentar se era o caso de São Paulo. Ontem, cinco PMs que participaram da ação que terminou com a morte de Paulo Batista do Nascimento, na zona sul, foram indiciados. Em Florianópolis, bandidos atearam fogo em dois ônibus, em uma viatura e no carro de um policial. Para o secretário de Segurança Pública César Grubba, houve "imitação"de São Paulo. "Temos um sistema medieval", afirma Cardozo a empresários; no entanto, petista diz rejeitar pena de morte ou prisão perpétua no País O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse ontem, em palestra a empresários em São Paulo, que preferia a morte a cumprir pena no País. "Se fosse para cumprir muitos anos em uma prisão nossa, eu preferiria morrer." Cardozo ressaltou que as condições dos presídios brasileiros causam violações aos direitos humanos. "Quem cometeu crime pequeno sai de lá criminoso maior." E destacou que a reinserção social é a razão fundamental das punições. "Não é porque não tenho um sistema correto que vou penalizar situações definitivas; pena não é castigo, é oportunidade para ser reinserido; é preferível um sistema com penas bem dosadas que funcionem, do que um com penas muito severas." "Do que nós precisamos?", continuou o ministro. "De um bom sistema, com reinserção social, e não prisão perpétua ou pena de morte", afirmou, durante evento organizado pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide). "Temos um sistema prisional medieval, que não só desrespeita os direitos humanos como também não possibilita a reinserção", completou, explicando que falava como cidadão, e não como governante. Depois de afirmar que a corrupção do aparelho do Estado é um entrave para o combate ao crime, Cardozo evitou comentar se era o caso de São Paulo. "É preciso união. Os governos federal, estaduais e municipais têm responsabilidade e temos de parar o jogo de empurra." Cardozo, responsável pelo controle de quatro presídios federais, admitiu que o sistema precisa "melhorar". No ano passado, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, havia 471.254 presos no Brasil para 295.413 vagas, o que representa um déficit de 175.841 unidades e a relação de 1,6 preso por vaga. Os Estados de Alagoas e Pernambuco estão em piores condições, com 2,6 e 2,4 presos por vaga, respectivamente. O Estado de São Paulo tinha no ano passado 174 mil presos ou 38% do total. Segundo o governador Geraldo Alckmin, atualmente já são 195 mil detentos - 1,9 por vaga. OEA. A situação dos presídios pode levar o País a ser julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), a pedido de organizações internacionais. No dia 3 deste mês, a violação de direitos humanos nos Presídios Aníbal Bruno, em Pernambuco (o maior do País) e Urso Branco, em Rondônia, foi tema de reuniões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em Washington, nos Estados Unidos. /COLABOROU BRUNO PAES MANSO |
PCC COBRA DÍVIDA COM MORTE DE POLICIAIS
PCC COBRA DÍVIDA COM MORTE DE POLICIAIS
PCC TROCA DÍVIDAS POR EXECUÇÃO DE POLICIAIS E DÁ PRAZO DE 24H PARA PAGAR |
Autor(es): ARTUR RODRIGUES, MARCELO GODOY |
O Estado de S. Paulo - 15/11/2012 |
Três crimes desvendados nas últimas 24 horas mostram como a facção criminosa tem organizado atentados contra os agentes públicos Três crimes desvendados nas últimas 24 horas mostram que criminosos da cúpula do Primeiro Comando da Capital (PCC) estabeleceram prazos para que as ordens de assassinar policiais sejam cumpridas em São Paulo. As investigações confirmam a suspeita de que bandidos em dívida com a facção são obrigados a pagar o que devem por meio da execução de policiais civis e militares ou de agentes prisionais. As confissões dos assassinos do PCC foram gravadas em vídeo pela polícia - um deles foi feito pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e o outro pelo Delegacia de Juquitiba, na Grande São Paulo. As confissões corroboram as conversas telefônicas interceptadas pela polícia nas quais líderes da facção deram a ordem de matar a seus subordinados - o Deic tem em seu poder os áudios das ordens para matar os PMs Flávio Adriano do Carmo e Renato Ferreira da Silva Santos. Um das confissões gravadas é a de Jefferson Luis de Miranda, de 32 anos. Acusados de roubos e de um latrocínio, Miranda foi preso ontem em Peruíbe, no litoral paulista, onde se escondia. O acusado apontou como mandante o "sintonia-geral de Carapicuíba", o chefe da facção na região. Afirmou que, para quitar sua dívida de R$ 10 mil com o grupo, devia matar um policial militar. O prazo para que cumprisse a determinação era de dez dias. O tempo passou e Miranda não achou um PM. Recebeu, então, novo prazo: em 24 horas ou matava ou seria cobrado pela facção. Diante disso, Miranda pediu ajuda a um amigo. Segundo o delegado Josimar Ferreira de Oliveira, esse amigo é Valmir Fernandes, de 28 anos. Fernandes indicou o investigador João Antônio Pires, e a facção permitiu que, em vez de um militar, ele matasse um policial civil. Apanharam-no quando Pires saía de um mercado em 5 de outubro. O investigador carregava duas sacolas, quando os bandidos chegaram em uma moto. Miranda estava na garupa e atirou. Câmeras filmaram o policial tentando fugir- ele correu para o mercado e foi perseguido pelo acusado de arma em punho. O criminoso acertou 16 vezes o investigador - os últimos balaços foram disparados com a vítima imóvel e indefesa, caída no chão. Fernandes foi preso no dia 8 e negou a acusação. Ele e Miranda são mais dois candidatos a uma cela em um presídio federal, como os demais presos por matar policiais. "Foi o Comando". Como ele, também deve ser mandado para a penitenciária de Rondônia o empresário Leandro Rafel Peraira da Silva, o Leo Gordo, de 28 anos. Dono de uma empresa de transporte coletivo, foi ele quem deu a ordem para matar os PMs Carmo e Santos, de acordo com a investigação do Deic. Ao ser indagado de quem havia recebido a ordem para matar os policiais, respondeu aos homens do Deic: "Foi o Comando". Leo Gordo não disse quem do comando do PCC deu a ordem. Só contou que ela veio por escrito. Leo era o responsável pela "quebrada" do Campo Limpo, na zona sul de São Paulo. Ele devia "cobrar a rua" para que as ordens fossem cumpridas. A ele deram dez dias para que matasse dez policiais. Matou dois. Depois, deram-lhe mais 24 horas para fazer o que faltava. Falhou. Foi preso anteontem com o empresário Wellington Alves, dono de uma fábrica de molduras. Além das mortes, serão acusados de lavagem de dinheiro e tráfico - o Deic pedirá o sequestro de seus bens. Além de Leo Gordo, Alves e Miranda, outros dois acusados de atentados a PMs foram presos e um suspeito morto ontem (leia abaixo). |
quinta-feira, 17 de maio de 2012
Colisão inédita no Metrô fere 49
Colisão inédita no Metrô fere 49
Falha mecânica faz metrô de SP ter 1º choque de trens em 38 anos: 49 feridos |
Autor(es): ADRIANA FERRAZ, ARTUR RODRIGUES, BRUNO RIBEIRO e WILLIAM CARDOSO |
O Estado de S. Paulo - 17/05/2012 |
Pela primeira vez em 38 anos de operação, dois trens da Linha 3-Vermelha do Metrô de São Paulo bateram, deixando ao menos 49 feridos, na manhã de ontem. Houve pânico entre os passageiros. “O pessoal começou a quebrar a janela e se desesperar, faltava ar lá dentro”, relatou Cristiane Campos, de 45 anos. O maquinista cuja composição bateu na outra apontou falha mecânica. Segundo a polícia, ele evitou uma tragédia ao interferir no sistema, que é automático, para acionar o freio. O governo disse que o acidente está sendo investigado. Problemas na rede metroviária e ferroviária têm sido constantes nos últimos tempos e devem se tornar tema eleitoral. Vítimas ainda estavam em pânico,3h após acidente na Estação Carrão, que prejudicou a Linha 3 por 4h; governo admite rever sistemas Pela primeira vez em 38 anos de operação, dois trens da Linha 3-Vermelha do Metrô de São Paulo bateram durante o horário comercial. Ao todo, 106 passageiros foram atendidos em sete hospitais públicos - e pelo menos 49 deles tiveram ferimentos, na maioria escoriações, segundo o Samu e os bombeiros. O acidente aconteceu a 600 metros da Estação Carrão, na zona leste da capital paulista, pouco depois do horário de pico, às 9h50. Parte da linha, que é a mais importante da cidade e chega a transportar 1,1 milhão de pessoas por dia, ficou fechada até as 14h20. Os reflexos se espalharam pelo restante da rede. Três horas após a batida entre os trens, nos hospitais da zona leste, as vítimas ainda estavam em pânico. Os passageiros foram arremessados ao chão e uns contra os outros. Depois, tiveram dificuldades para sair das composições, alegando que algumas das portas não se abriram. A saída foi arrebentar os vidros das composições. "O pessoal começou a quebrar a janela e se desesperar, faltava ar lá dentro", disse a dona de casa Cristiane Campos, de 45 anos. Ambos os trens seguiam no sentido Palmeiras-Barra Funda. O trem da frente, um modelo da empresa espanhola CAF adquirido na última gestão, estava parado quando foi atingido pela outra composição, que estava cheia. Segundo o governo do Estado, o trem estava entre 9 km/h e 12 km/h. Os bombeiros tiveram de usar escadas para vencer os muros que separam a linha férrea da Radial Leste e prestar socorro. De imediato, 33 pessoas foram socorridas. Parte dos feridos procurou os hospitais por conta própria. Ambulâncias formaram uma fila na Radial e a ciclovia foi usada como centro de triagem de feridos - apenas dois foram classificados como "graves". Quem escapou ileso caminhou sobre os trilhos e pela Radial até a Estação Carrão. E quem depende de transporte público sofreu na manhã de ontem. O esquema de emergência com uso de ônibus quase não deu conta da demanda. Causas. O governo deu poucas explicações para a pane. O secretário dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, afirmou que uma comissão vai apurar as causas da batida, que seria decorrente de uma falha mecânica do sistema de controle dos trens. Ao SPTV, da Rede Globo, disse que o Metrô iria avaliar se a falha foi em algum dispositivo ou se foi no circuito que secciona as linhas. "Detectando essa falha, vamos fazer a correção, se necessário for, em todas as placas do Metrô de São Paulo." O sindicato que representa os metroviários - que faria, ainda na noite de ontem, uma assembleia para definir paralisação - apresentou uma série de detalhes extras confirmados pela companhia. O presidente, Altino Bezerra dos Prazeres, afirmou que a linha já havia apresentado uma falha pela manhã, antes da batida, e o trem só parou porque o operador acionou os freios de emergência. O trem que estava parado seria pertencente à Linha 1-Azul, e estava voltando de um serviço de manutenção. "Acho irresponsabilidade colocar veredictos do que aconteceu", rebateu o secretário Fernandes. |
sexta-feira, 11 de maio de 2012
Brasil é o país que mais investiu em defesa e segurança na América do Sul, mostra relatório
Brasil é o país que mais investiu em defesa e segurança na América do Sul, mostra relatório
11/05/2012
Renata Giraldi*
Repórter da Agência Brasil
Na América do Sul, o Brasil e a Colômbia são os países que mais gastaram com defesa e segurança, no período de 2006 a 2010, segundo o Centro de Defesa Estratégica, vinculado à União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Pelo relatório preliminar, o conjunto de países da região investiu US$ 126,1 bilhões no período, registrando um gasto médio por nação de US$ 25,2 bilhões.
Os valores gastos com defesa representam uma média de 4,14% do total
das despesas anuais dos governos e 0,91% do Produto Interno Bruto (PIB)
na região. O relatório será enviado aos ministros da Defesa da Unasul.
No próximo dia 4, eles se reunirão em Assunção, no Paraguai, para
avaliar o documento e adotar as políticas que considerem adequadas.
O Brasil foi responsável por gastar o equivalente a 43,7% do total investido na Unasul, seguido pela Colômbia, que aplicou 17%, Venezuela (10,7%), pelo Chile (9%) e pela Argentina (8,3%).
Entre os países que investiram menos estão o Equador (4,5%), o Peru (4%), o Uruguai (1,3%), a Bolívia (0,9%), o Paraguai (0,5%), o Suriname (0,1%) e a Guiana (0,1%).
*Com informações da agência pública de notícias do México, Notimex // Edição: Juliana Andrade
Repórter da Agência Brasil
Na América do Sul, o Brasil e a Colômbia são os países que mais gastaram com defesa e segurança, no período de 2006 a 2010, segundo o Centro de Defesa Estratégica, vinculado à União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Pelo relatório preliminar, o conjunto de países da região investiu US$ 126,1 bilhões no período, registrando um gasto médio por nação de US$ 25,2 bilhões.
O Brasil foi responsável por gastar o equivalente a 43,7% do total investido na Unasul, seguido pela Colômbia, que aplicou 17%, Venezuela (10,7%), pelo Chile (9%) e pela Argentina (8,3%).
Entre os países que investiram menos estão o Equador (4,5%), o Peru (4%), o Uruguai (1,3%), a Bolívia (0,9%), o Paraguai (0,5%), o Suriname (0,1%) e a Guiana (0,1%).
*Com informações da agência pública de notícias do México, Notimex // Edição: Juliana Andrade
terça-feira, 10 de abril de 2012
Feios, sujos e malvados
Feios, sujos e malvados | ||||||||
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Publicado em Le Monde Diplomatique Brasil
As
mais recentes operações militares na cidade de São Paulo, como a
realizada desde o início deste ano na Cracolândia, apresentadas pelo
discurso oficial como formas de intervenção sobre populações vulneráveis
e em situação de risco, revelam-se um poderoso instrumento de expansão
do controle
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por Alessandra Teixeira e Fernanda Matsuda | ||||||||
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![]() O comando da Polícia Militar alega, oficialmente, que a ação, cujo nome é Operação Centro Legal e integra estado e município, tem o intuito de “resgatar as pessoas em estado de vulnerabilidade, combater o tráfico e criar um ambiente propício para as ações sociais”.1 A mais recente fase da Operação Centro Legal na chamada Cracolândia, ainda que não traga novidades com relação às políticas repressivas ou intervencionistas adotadas nos últimos anos, reuniu elementos que lhe atribuem certa exemplaridade, a partir da qual podemos situar algumas questões. Essa ação pôde traduzir as mais contemporâneas formas de atuação das forças policiais e dos aparatos repressivos, que extrapolam suas competências legais e tradições históricas de gestão e repressão ao crime, para voltar-se a formas muito específicas de gerir territórios e populações consideradas de risco. Após um mês de operação, foram feitas 13.647 abordagens policiais, 296 prisões, 5.915 encaminhamentos e 195 internações.2 Ganha relevância a gramática bélica das operações, manifesta em táticas de ocupação de territórios, presença ostensiva e intimidadora dos destacamentos militares, práticas arbitrárias como buscas pessoais. Para além de mobilizar a ideia de urgência, alimentada sobretudo por uma imagem difusa da criminalidade violenta, ameaça permanente que demanda repressão e prevenção – nessa ordem –, constrói-se também a noção de vulnerabilidade das populações dos territórios sobre os quais a lógica intervencionista opera, permitindo que ela se instale no lugar da política na busca de restaurar a ordem ameaçada, autorizando, portanto, medidas de exceção. Um precedente importante desse novo modelo de atuação dos aparatos repressivos do Estado, voltado à intervenção em territórios e sobre populações “de risco”, foi a Operação Saturação, uma estratégia de ocupação desenvolvida pelo governo paulista em parceria com a prefeitura da capital nas periferias da cidade, entre 2005 e 2009. Durante esse período, onze territórios na periferia, a maioria deles compreendendo favelas, foram ocupados por variadas divisões da PM, que lá se mantiveram pelo tempo médio de sessenta dias. A Operação Saturação combinou ações pirotécnicas cujo caráter bélico se fazia notório, como o ingresso da Rota, Tropa de Choque, Corpo de Bombeiros, nos territórios “inimigos”, movimento em geral alardeado pela utilização de helicópteros portando armamentos pesados e ações de constrangimento permanente, entre as quais a abordagem maciça da população local. A parte social, as ditas ações “integradas de cidadania”, se materializou, na verdade, na improvisação da prestação de serviços públicos inexistentes ou precariamente providos nesses locais, como assistência odontológica e fornecimento de documentos. Mesmo antes da alardeada Operação Cracolândia na região central da cidade, testemunham-se diariamente medidas ostensivas voltadas à higiene social, que promovem a remoção de populações “em situações de risco”, ou em “situações de vulnerabilidade” do espaço “saudável” da urbe. As vítimas são os usuários de drogas e os moradores de rua, que insistem em evidenciar as mazelas do mundo social do qual também fazem parte, nos espaços visíveis da cidade. A prefeitura de São Paulo elaborou, em 2009, um autêntico programa de intervenção, para definir as populações-alvo, caracterizadas por atributos de vulnerabilidade que as constituem, e por consequência, tratadas não como sujeitos de direito, mas como indivíduos atravessados por “situações de risco”. Designado Programa de Proteção a Pessoas em Situação de Risco, ele não descreve ou define as ditas “situações de risco”, mas sim as “medidas” estratégicas para geri-las eficazmente, que combinam novamente ações ostensivas de vigilância e repressão (a abordagem e o eufemismo “encaminhamento”) com medidas de “proteção social”, cujo horizonte aqui desenhado é, no entanto, o de um suposto tratamento tutelar. A Portaria n. 105/2010 da Secretaria Municipal de Segurança Urbana −, seguida daquelas que a regulamentaram (portarias n. 79/2010 e 105/2010), definiu como finalidade primordial “contribuir para diminuir e evitar a presença de pessoas em situação de risco nas vias e áreas públicas da cidade e locais impróprios para permanência saudável das pessoas [...] objetivando a abordagem e o encaminhamento adequado para cada caso e situação de vulnerabilidade encontrada”. Para tanto, prevê-se a atuação daquilo que vai se designar como Rede de Proteção Social,que nada mais é do que a combinação do aparato de segurança pública do estado (polícias Militar e Civil) e do município (Guarda Civil Metropolitana) e algumas secretarias que gerem o campo do social (Assistência Social e Saúde), ao lado, é certo, das organizações sociais. Por este pequeno texto, que sintetiza as diretrizes dos programas de intervenção colocados em prática pela prefeitura de São Paulo nos últimos anos, vemos serem desenhadas nitidamente as inquietações de Robert Castel, em 1983, quando este apresentou os deslocamentos que se configuram em tempos pós-disciplinares: “do perigo ao risco”. Ao sujeito perigoso e suas determinações físicas, psíquicas, morfológicas, sobrepõe-se uma combinação de fatores de riscos – um cálculo de probabilidades –, eles mesmos talhados por uma imensa abstração, de modo a intensificar as possibilidades de intervençãonão mais sobre indivíduos concretos, mas sobre populações,que são o resultado dessa multiplicidade de fatores e suspeições. No caso do mencionado programa de intervenção sobre as populações em situação de risco de São Paulo, com o objetivo de diminuir ou evitar a presença de determinadas pessoas nas vias públicas, a prefeitura previu o cumprimento de medidas constritivas de liberdade (“abordagem” e “encaminhamento forçado”, inclusive à prisão), bem como destacou sua Guarda Civil para tal tarefa. Embora não conte em sua previsão originária com funções dessa natureza, a Guarda Civil Metropolitana (GCM) tem sido recrutada, ao longo dos anos, para desempenhar atividades de polícia, notadamente militares, que não estão, contudo, entre suas atribuições constitucionais. Em verdade, o município, enquanto unidade administrativa, nunca se configurou como instância responsável pela segurança pública, área que sempre foi assumida pelo estado e pela União, segundo previsão constitucional. Não obstante as restrições do texto constitucional de 1988, a criação das guardas municipais país afora, após a redemocratização, teve o sentido de reclamar um protagonismo dos municípios na área da segurança pública, assumindo como modelo a militarização das PMs, e não o policiamento civil voltado restritivamente à proteção do patrimônio público. Desde então, muitos desses destacamentos acabaram por se constituir como “exércitos municipais”, tendo o modelo da PM como horizonte de atuação, inclusive no caso da GCM paulistana. Ganha renovado sentido, assim, a ideia do militarismo como uma força que penetra diferentes âmbitos e domínios do estado. A partir de meados dos anos 1990, ganha força outro movimento no âmbito das ações de segurança nos municípios: o da criação de secretarias autônomas, que pudessem subsidiar administrativa e politicamente as atividades de policiamento ostensivo, que, aliás, as guardas municipais já vinham exercendo, irregularmente, desde sua criação. Na cidade de São Paulo, foi criada, pela Lei n. 13.396/02, a Secretaria de Segurança Urbana (SSU), para executar “políticas de segurança pública para o município focadas na prevenção da violência” (art. 1º). A referida noção de prevenção da violência foi sendo reapropriada pelas sucessivas gestões municipais, para, no início do mandato de Gilberto Kassab (2009), ser transmutada para a nada preventiva “diminuição da criminalidade”, seguida da tutelar “proteção das pessoas em risco” (Decreto n. 50.338, de janeiro de 2009, que reorganizou a SSU). O mencionado decreto foi rapidamente sucedido por outro, o Decreto n. 50.448, de fevereiro de 2009, pelo qual as atribuições da GCM foram alargadas, incluindo-se expressamente a “proteção de pessoas em situação de risco, encaminhando-as e apoiando as ações sociais, em conformidade com os programas e ações integradas” (art. 2º), o que abriu caminho para a formulação de diferentes programas de intervenção a essas ditas populações em risco, como acima descrito. Constituindo-se assim como força armada, de caráter repressivo e militarizado, a GCM tem, ao longo dos últimos anos, se destacado por uma atuação interventora bastante direcionada às tais populações “em situação de risco”, populações essas que, embora abstratamente mencionadas nos diplomas normativos, apresentam nome e endereço certo: os moradores de rua e os usuários de drogas, ambos ocupantes da área central da cidade. Na divisão do trabalho policial, o quinhão concernente à GCM é a repressão aos meninos de rua, sobretudo quando usuários de crack (“noinhas”). Dados de pesquisa3 recentemente realizada com presos do Centro de Detenção Provisória I de Pinheiros, que até pouco tempo atrás era o destino dos presos em flagrante na região central da cidade de São Paulo, revelam que a GCM tem assumido a tarefa de efetuar prisões, ao lado da Polícia Militar e, surpreendentemente, na mesma proporção que a Polícia Civil, órgão investigativo do sistema de justiça criminal. No desempenho dessa função, abusos são recorrentemente atribuídos à GCM: mais de 70% dos entrevistados que foram presos por guardas municipais relataram ter sofrido violência, taxa superior à da Polícia Civil e muito próxima daquela da Polícia Militar. A pesquisa também apurou que, na totalidade das prisões em flagrante efetuadas pela GCM na região central, mais de 40% haviam atingido pessoas em situação de rua e, quase metade, usuários de crack. A aproximação entre Polícia Militar e Guarda Civil Metropolitana não se dá apenas na assunção pela segunda de papéis legalmente reservados à primeira, mas especialmente na atuação violenta e ilegítima que as duas corporações exercem. Partilham uma visão de governo em que os mecanismos de repressão e, principalmente, medidas de assistência pautadas em um ideário higienizador, se combinam, aniquilando a autonomia do indivíduo sob a bandeira da tutela. Assim, a ameaça de um sujeito perigoso é reconfigurada pela tecnicidade dos índices de vulnerabilidade e passa a ser a ameaça de populações mais facilmente captadas pela “rede de serviços” da prefeitura, cuja oferta não raro é delegada aos guardas civis. Um desdobramento dessa atuação perversa do poder público é, em grande medida, o aumento exponencial da população carcerária, sendo bastante expressiva a quantidade de presos provisórios. Trata-se de pessoas que, na maioria das vezes, são presas em flagrante e que respondem ao processo criminal privadas de liberdade. O uso abusivo desse expediente revela mais um mecanismo de controle social do que propriamente uma medida jurídica de repressão ao crime. Há um descompasso evidente, pois muitos dos crimes de que se acusam os presos provisórios não redundam em uma condenação ou não acarretam a pena privativa de liberdade. São os pequenos ilegalismos, as negociações frustradas com os agentes do Estado, os “corres” para alimentar o corpo ou o vício, que acabam capturados pelos dispositivos de controle e que, não resultando em maior prejuízo ao bem público e à sociedade, não se transformam em objeto da punição stricto sensu. A prisão provisória é assim utilizada como mais uma engrenagem da atuação estatal perante grupos sobre os quais recaem as políticas sociorrepressivas, ora na condição de vulneráveis, sob uma situação de risco, ora como criminosos, produtores do risco para a população “de bem”. Mobiliza-se uma figura jurídico-penal para retirar, temporariamente, determinadas populações de circulação, para ocultar problemas e lhes imprimir uma solução aparentemente legal, que não se converte, todavia, em uma situação que deveria ser, ao menos logicamente, abarcada pela justiça criminal. Essa prática seletiva de criminalização e encarceramento impõe imediatamente uma pecha decorrente da passagem pela polícia ou, de forma mais abrangente, pelo sistema criminal, rotula o indivíduo e o aloca em uma categoria de pessoas propensas às abordagens, aos “encaminhamentos”, aos abusos, às violações de direitos e à prisão. Essas operações em andamento são demonstrativas da execução de um projeto de Estado fortemente calcado no controle e na repressão, sob a vestimenta do social, na construção de populações vulneráveis,de risco e delinquentes – mas não cidadãs.
Alessandra Teixeira e Fernanda Matsuda
Advogadas, pesquisadoras, mestres e doutorandas pela Universidade de São Paulo (USP).Ilustração: Daniel Kondo 1 Informação do site da Polícia Militar do Estado de São Paulo, disponível em www.policiamilitar.sp.gov. br/hotsites/centrolegal/index.html (último acesso em 13 fev. 2012). 2 Ibidem. 3 Pesquisa realizada no âmbito do projeto Tecer Justiça (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania e Pastoral Carcerária de São Paulo). |
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