Dia de apito antes do decreto
Desocupação de museu tem 25 detidos |
Autor(es): Rafael Galdo, Maria Elisa Alves e Renata Leite |
O Globo - 17/12/2013 |
Um dia antes de o governo do estado publicar decreto criando um centro de referência da cultura indígena no antigo Museu do índio, ativistas entraram em confronto com a polícia e 25 pessoas foram detidas. Quando soube que o antigo Museu do índio teria que ser desocupado, ontem de manhã, José Urutau, que participou da invasão do local, no fim de semana, não teve dúvidas: subiu numa árvore do terreno, no Maracanã, e marcou, entre as folhas, sua posição contrária ao ato. A resistência do indígena foi tão grande quanto a habilidade dele para escalar rapidamente o tronco: ele subiu por volta das 9h30m e à noite ainda estava entre os galhos. Várias autoridades foram mobilizadas para fazê-lo descer. O Corpo de Bombeiros levou uma escada Magirus, com um negociador do Batalhão de Operações Especiais a bordo, mas foi em vão. O Batalhão de Choque da Polícia Militar e um delegado da Polícia Civil também tentaram sem sucesso. Alguns manifestantes que apoiavam Urutau acabaram sendo carregados para longe por policiais. Vinte e cinco pessoas foram detidas durante a ação de retirada dos invasores, que fechou a Avenida Radial Oeste, no sentido Centro, das 7hl0m às 9h50m, complicando o trânsito na região. Urutau alegava que não sairia do local porque o governo do estado não havia apresentado um mandado judicial que permitisse a retirada dos ativistas e indígenas. O governo afirmou, no entanto, que a desocupação estava baseada numa imissão de posse (ato judicial que garante a posse de um bem) expedida em março, pela 8a Vara Federal do Rio. Em nota, o estado disse que a liminar de reintegração de posse era "instrumento hábil para justificar a retirada de qualquer invasor, a qualquer tempo, depois de concedida". O advogado constitucionalista Leonardo Vizeu, membro da Comissão de Direito Constitucional da OAB-RJ, no entanto, defende que a imissão de posse não pode ser usada indefinidamente (ela já tinha sido executada em março). A Justiça Federal, por sua vez, informou que não tinha expedido uma nova imissão. — Nosso plano aqui é a criação da primeira universidade de ensino da cultura indígena no Brasil — disse o índio Paulo Apurinan, um dos líderes indígenas no local, que chegou a ser detido, mas foi solto em seguida. ATIVISTAS RETIRADOS VOLTARAM AO LOCAL Em março, o antigo Museu do índio já havia sido desocupado. Os manifestantes voltaram ao local no último fim de semana, porque um dos quatro prédios que ficam no terreno estaria, segundo eles, sendo derrubado. Na quinta-feira, o Consórcio Maracanã S.A., formado pela Odebrecht, pela IMX e pelo grupo americano AEG, teria começado a demolição. Por conta disso, o grupo invadiu o imóvel do Laboratório Nacional Agropecuário. Na madrugada de domingo, os ativistas foram retirados, mas voltaram e passaram a ocupar o museu vizinho. O governo informou que o prédio do laboratório será, de fato, demolido, junto com outros dois. A área será incorporada ao Complexo do Maracanã e vai abrigar o novo Museu do Futebol, previsto para ficar pronto para as Olimpíadas de 2016. Mas o prédio do antigo Museu do índio permanecerá de pé. O estado publica hoje um de-ereto garantindo que o imóvel será transformado em um Centro de Referência das Culturas Indígenas. Segundo o ato, caberá à Secretaria estadual de Cultura definir, "em conjunto com as lideranças indígenas do estado e instituições que formalmente se destinem à defesa dos direitos e interesses dos povos indígenas, o programa de uso cultural do bem". Segundo a secretária de Cultura, Adriana Rattes, as negociações para a criação do centro já estão adiantadas. Desde agosto, grupos de trabalho, formados por representantes dos indígenas, da secretaria e de instituições diversas ligadas à causa indígena, estão discutindo as questões jurídicas e estruturais do espaço, além do conteúdo cultural. Uma proposta preliminar de uso do espaço será apresentada amanhã durante o seminário "Centro de referência da cultura dos povos indígenas" que acontece na Uerj e já tem confirmada a presença de caciques de várias tribos do Brasil. O projeto de ocupação cultural que:pode ser aprovado amanhã prevê, entre outras ações, a promoção de eventos e exposições para a difusão da arte, da cultura, dos sabei res e modos de vida dos povos indígenas, espaço para a promoção de artesanato e curso de formação para novos líderes indígepas. A previsão é que ele comece a funcionár depois da Copa do Mundo, mas, em março de 2014, um espaço provisório será inaugurado, segundo Adriana. — Com uma migração cada vez maior de índios para as cidades, um espaço como esse, qud ajude a gerar renda, é fundamental. O que os ocupantes do antigo museu querem é a universidade, imas o centro é um primeiro passo — diz Paulo Ribeiro, presidente da Fundação Darcy Ribeiro. |
Nenhum comentário:
Postar um comentário