Inflação em alta, crescimento pífio
Autor(es): ROSANA HESSEL » VICTOR MARTINS |
Correio Braziliense - 29/03/2013 |
O Banco Central deixou bem claro ontem que é a presidente Dilma Rousseff quem determina o rumo da política monetária. Durante a divulgação do Relatório Trimestral de Inflação, sinalizou que vai tolerar a continuidade da alta dos preços até que a economia se recupere. Para o diretor de Política Econômica do órgão, Carlos Hamilton Araújo, porém, há um único remédio eficaz para conter a alta inflação: a taxa básica de juros (Selic). Diante das incertezas no mercado interno e externo, o BC indicou que deve esperar mais um pouco para tomar qualquer decisão. Na visão dos analistas, esse prazo pode acabar em maio, quando a maioria do mercado espera aumento de 0,25 ponto percentual na Selic, de 7,25% para 7,50% ao ano. “No momento, a nossa percepção de inflação é maior que a média. Isso, em parte, se deve a aumentos grandes, e com frequência elevada, de itens que são muito visíveis. Alimentos e combustíveis são os principais pontos. E quando os aumentos de preços estão concentrados nesses itens, a percepção da população é de que há mais inflação do que o índice de preços aponta”, justificou Hamilton. Ao explicar sobre as armas necessárias para conter a alta do custo de vida, o diretor do BC falou em “remédios ruins” que podem ser usados pelo Comitê de Política Monetária (Copom) e citou o ex-primeiro-ministro britânico Winston Churchill (1940-45 e 1951-55). “Tem várias coisas que podem ser feitas. Consta que, em certa oportunidade, Churchill disse que democracia é o pior sistema de governo com exceção de todos os outros. Para combater a inflação, a taxa de juros é o pior remédio à exclusão de todos os demais”, afirmou Carlos Hamilton. “Agora, sobre o que vai ser feito, especificamente, o Copom vai se reunir, e isso é uma decisão do Comitê”, completou. Na avaliação do economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, com essa afirmação, o BC sinalizou que vai obedecer à presidente Dilma, apesar de não concordar. “Esse comentário vai em direção oposta ao que a presidente disse. Neste momento, o melhor é focar no combate da inflação e menos na retomada do crescimento. E os juros são, realmente, a ferramenta mais eficiente para conter a alta de preços”, destacou. Na última quarta-feira, em Durban, na África do Sul, Dilma afirmou que “não concorda com políticas de combate à inflação que olhem a questão da redução do crescimento econômico”. Diante da péssima repercussão entre os investidores, a presidente disse que sua fala foi “manipulada” pela imprensa e pelo mercado. Abandono No relatório divulgado ontem, o BC elevou a projeção para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deste ano de 4,8% para 5,7%. Em 2014, prevê alta de 5,3%. Com isso, o governo Dilma Rousseff será marcado por um período de forte inflação e de crescimento pífio, com o Produto Interno Bruto (PIB) apontando média de crescimento anual de 2,55%. Nas contas do BC, o avanço do PIB em 2013 será de apenas 3,1%, depois de 2,7% em 2011 e de 0,9% no ano passado. Essa combinação nada confortável, de fraca atividade e custo de vida elevado, mostra que a autoridade monetária praticamente abandonou o compromisso de levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O IPCA acumulado em 12 meses, por sinal, baterá em 6,7% no segundo trimestre deste ano, rompendo o teto da meta, de 6,5%. Na visão do economista-chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, o relatório de 100 páginas do BC confirma parte das declarações da presidente Dilma em Durban. “O texto diz que o país tem um problema de crescimento e de choque de oferta. Enquanto tivermos esse quadro, com a economia patinando, o Banco Central não deverá tomar medidas mais firmes, como o aumento de juros”, disse. “Para que os juros não subam agora, o Ministério da Fazenda vai ajudar no controle da inflação com mais desonerações”, completou. A seu ver, a alta da Selic, se vier, começará apenas em agosto, chegando a 8,5% ao ano em dezembro. “A visão que tenho é de que há um risco inflacionário muito alto. O BC precisar agir, mas o risco de a economia não crescer é alto”, afirmou. DUAS PERGUNTAS PARA SERGIO VALE, economista-chefe da MB Associados O Banco Central vem demorando para aumentar a taxa básica de juros (Selic), mesmo com a inflação se mantendo em um nível preocupante, o que pode custar caro ao país mais à frente. É o que ressalta o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. No entender dele, isso só demonstra que a autoridade monetária está confortável em trabalhar com uma meta inflacionária informal de 5,5% e não de 4,5% ao ano, como foi definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Com esta previsão de 5,7% de inflação em 2013 de crescimento de 3,1%, o BC deixa a entender que não deverá elevar os juros como deveria? Ao anunciar projeção de inflação de 5,7% para este ano, o Banco Central deixa a percepção é de que está atrasado para subir a taxa Selic. Esse atraso apenas aumenta as expectativas não apenas para 2013, mas para os anos seguintes, pois sinaliza que a instituição está confortável com níveis próximos de 5,5%. Esse número está na cabeça de todo mundo como a verdadeira meta de inflação hoje. O perigo de atrasar ainda mais a decisão de aumentar os juros é a meta de inflação subir mais um pouco, para 6%. Qual o fator do relatório de inflação que o senhor considera mais preocupante e que poderá espantar os investidores? O fato de a expectativa de inflação ter subido quase um ponto percentual de um relatório para o outro e o BC praticamente não mudar o tom. Pelo contrário, a autoridade monetária continua insistindo que a inflação tende a passar logo, que são problemas que não vão ocorrer mais, como câmbio, aumento forte de salários e de alimentos. O problema é que os pontos relevantes foram praticamente deixados de lado. Um indicador importante, como a difusão (total de produtos e serviços com preços remarcados), que está em mais de 75%, foi praticamente relevado às traças no documento. |
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