segunda-feira, 22 de abril de 2013

A integração latino-americana

A integração latino-americana

Autor(es): Víctor Pou
Valor Econômico - 16/04/2013
 

Até pouco tempo atrás, a estrela do processo de integração na América Latina era o Mercosul, protagonizado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. Passados 21 anos, contudo, o Mercosul encontra-se em plena crise. Fala-se em decadência e deturpação do projeto original. O que aconteceu?
Houve a confluência de dois processos políticos: o declínio das instituições criadas pelos tratados de sua fundação e a "bilateralização" das relações.
As instituições do sistema tinham um caráter intergovernamental e não admitiam o princípio da supranacionalidade. Eram fracas desde o princípio, por não existirem no Mercosul instrumentos capazes de garantir o cumprimento do que fora pactuado. Em consequência das mudanças políticas nos dois maiores países do bloco - Brasil e Argentina - acentuou-se a atitude arbitrária de seus governos com os compromissos assumidos no Mercosul. Não é possível falar em união alfandegária nem de mercado interno com livre circulação dos fatores de produção. Tudo foi desvirtuado pelas várias medidas unilaterais adotadas pelos governos. Existe um sem-número de mecanismos que entorpecem o livre-comércio e a situação ficou mais grave na Argentina, com uma política protecionista que pretende evitar sua quebra internacional.
Com o Mercosul em decadência, surgem na AL outras iniciativas voltadas à liberalização do comércio
Como consequência, as instituições de caráter multilateral do Mercosul entraram em profunda crise. As relações agora são bilaterais, cada conflito é negociado governo a governo. Brasília e Buenos Aires não obedecem ao sistema de resolução de conflitos, baseado na arbitragem, quando a decisão lhes é adversa. O mesmo ocorre com as decisões políticas. O poder político e a ideologização tomaram o lugar da teoria da integração regional, disciplina internacional com mais de meio de século de desenvolvimento. O fator político com mais influência nos últimos dez anos foi a irrupção da "revolução bolivariana", ou seja, o chavismo. O governo da Argentina alinhou-se ao chavismo, enquanto o Brasil, graças a seu gigantismo, negocia habilmente cada passo, usando de sua força à sua conveniência.
A decadência do Mercosul chegou a um grave extremo em 2012. A crise mais séria surgiu quando o então presidente do Paraguai, Fernando Lugo, foi submetido a um julgamento político e posteriormente destituído pelo Parlamento, em decorrência do incidente em que morreram vários camponeses "sem-terra" que pretendiam ocupar uma propriedade rural. Outro acontecimento foi a entrada da Venezuela no Mercosul.
Na América Latina, paralelamente à decadência do Mercosul, porém, foi criada a promissora Aliança do Pacífico, reunindo Chile, Peru, Colômbia e México, os países com maior abertura comercial da região. A iniciativa demonstra que a vizinhança perdeu importância e prescinde da estrutura anterior, de instituições e procedimentos complexos que acabam não se cumprindo. Prioriza-se a comunidade de interesses concretos e busca-se instaurar uma nova maneira de ver a integração regional.
Os quatro países da Aliança do Pacífico têm um total de 200 milhões de habitantes, representam 35% do Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina e, somados, constituem a nona economia mundial. Esses países, somados ao Panamá, integram o Fórum do Arco do Pacífico Latino-Americano, completado por Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua.
O México anunciou a entrada formal nas negociações do Acordo de Livre-Comércio Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), ao qual aderiu recentemente o Japão e também fazem parte Chile, Peru, Austrália, Brunei, Estados Unidos, Malásia, Nova Zelândia, Cingapura e Vietnã.
O México considera o TPP essencial para impulsionar o comércio voltado à região com maior desenvolvimento do mundo: a da Ásia-Pacífico. O processo de negociação do TPP é uma iniciativa desenvolvida pelos países-membros do Acordo Estratégico Transpacífico de Associação Econômica (Brunei, Chile, Nova Zelândia e Cingapura) juntamente com a Austrália, EUA, Peru, Vietnã e Malásia; e, em breve, Canadá e México.
A negociação almeja construir um acordo inclusivo e de alta qualidade que sirva de suporte para o crescimento econômico, o desenvolvimento e a geração de emprego dos países-membros e de base para um futuro Área de Livre-Comércio da Ásia-Pacífico (FTAAP), aberto à entrada de outras economias do Fórum de Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico (Apec, na sigla em inglês). O TPP aspira ser o mais ambicioso e amplo processo de negociação multilateral entre países de três continentes (América, Ásia e Oceania) e converter-se no mais relevante do mundo na atualidade.
Neste conjunto de alianças não surpreende não encontrarmos o Brasil, maior economia da região, que já não joga nestas ligas enquanto desfruta de uma liderança regional indiscutível.
Conclusão: ao lado da decadência do Mercosul, nascem na América Latina iniciativas com enfoques pragmáticos voltados à liberalização do comércio entre as regiões do mundo com maior potencial econômico. Luzes e sombras na América Latina.
Víctor Pou é professor de economia na Iese Business School.

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