Selic a 9% obriga mudança da poupança
Cristiano Romero |
Valor Econômico - 07/03/2012 |
É bem provável que a economia brasileira esteja caminhando para um novo patamar de taxa de juros. Há dúvidas sobre a capacidade do país de manter os juros baixos nos próximos anos, mas poucos duvidam do espaço existente hoje para redução no curto prazo. A queda da taxa básica (Selic) cria, a exemplo do que ocorreu em 2009, um desafio imediato para as autoridades: a mudança da regra de correção da caderneta de poupança, hoje definida como a variação da TR mais juro fixo de 6,17% ao ano. A alteração na poupança é necessária porque, do contrário, com a queda da taxa Selic abaixo de um determinado patamar, os investidores migrarão em massa para as cadernetas, criando um grave problema: interrupção no financiamento da dívida pública. Numa economia em que o mercado de capitais ainda é asfixiado pela presença do Estado, os investidores aplicam maciçamente em títulos emitidos pelo governo, que, por sua vez, paga caro para se financiar no mercado. Com a queda contínua da Selic, um processo que vem ocorrendo desde 2003, o país se aproxima de uma taxa básica de juros que torna mais vantajoso investir em caderneta de poupança, em vez de na compra de um título público. Em 2009, a Selic caiu para a mínima histórica - 8,75% ao ano. Pouco depois, subiu novamente, chegando a 12,5%. Agora, está em 10,5%, mas o Banco Central (BC) já avisou que ela recuará para um dígito. É possível que, na reunião de hoje, o Comitê de Política Monetária (Copom) corte a Selic em 0,75 ponto percentual, levando-a para 9,75% ao ano. O ciclo de cortes não deve parar por aí. O Copom pretende reduzir os juros enquanto a inflação em 12 meses estiver em queda, o que pode ocorrer até meados do ano. Na opinião de especialistas, uma Selic em 9% ao ano já deveria mover o governo a mexer na regra de correção de poupança. Evitaria, assim, um aumento desnecessário da volatilidade no mercado de títulos públicos. Se a regra não mudasse, nem todos os investidores correriam para a poupança. Alguns procurariam papéis privados com rentabilidade maior que a das cadernetas ou títulos públicos de prazos mais longos. Este seria o efeito positivo de se deixar tudo como está. O problema é que o mercado se tornaria extremamente volátil, acarretando custos imprevisíveis à gestão da dívida pública. Em 2009, o governo chegou a formular proposta para a correção da poupança, baseada num gatilho - a cada queda da Selic, o rendimento da caderneta teria redução equivalente, de forma a se manter sempre menos atrativo que o de um título público atrelado à taxa básica. Agora, o Ministério da Fazenda planeja indexar a poupança a um percentual da Selic, sem mexer nos depósitos antigos. O governo estaria postergando a decisão porque, a rigor, o Copom pode não reduzir os juros abaixo de 9% neste ano (alguma dica dos próximos movimentos deve vir hoje, com o comunicado da reunião do Comitê, ou na divulgação da ata, daqui a oito dias). Há também as eleições municipais no segundo semestre. O Palácio do Planalto sabe que a mudança da poupança será explorada à exaustão pela oposição. Mudar a cultura do juro alto existente no Brasil não é, de fato, tarefa fácil. Os juros vêm caindo de forma persistente há uma década - em 2003, a Selic média foi de 23,24% ao ano; em 2011, caiu para 11,69%. Ainda assim, muitos investidores preferem se refugiar em papéis de prazo curto, atrelados à taxa Selic. O curioso é que, proporcionalmente, esse hábito é mais disseminado hoje entre instituições oficiais do que no próprio mercado. Até janeiro, os fundos extramercado (que aplicam recursos do FAT, do Funcafé e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e das estatais não-financeiras, com exceção da Petrobras) eram os maiores aplicadores em LFT, título público corrigido pela Selic. Do total da carteira desses fundos, 66% estavam em LFTs no primeiro mês do ano, proporção maior que a de aplicação do mesmo título pelos bancos (29%) (ver tabela). Em fevereiro, o governo obrigou os fundos oficiais a migrar para papéis com juros prefixados e títulos atrelados à inflação. A troca chegou a R$ 61,2 bilhões, o que permitiu ao Tesouro Nacional reduzir a participação das LFTs na composição da dívida em 3,3 pontos percentuais. Curiosamente, ao se manterem sobreaplicados nesses papéis, os fundos oficiais perderam dinheiro em 2011 porque a rentabilidade média dos títulos atrelados a preços e juros prefixados foi maior. Neste momento, o Tesouro negocia migração idêntica com os gestores das disponibilidades do Fundo de Garantia do Tempo Serviço (FGTS). O impacto pode chegar a R$ 35 bilhões ou R$ 40 bilhões, o equivalente a cerca de dois pontos percentuais da dívida em LFT. Concluída mais essa permuta, o estoque total de LFTs deve cair para 25% da dívida mobiliária federal. Trata-se de um avanço, mas ainda há muito chão pela frente. Para o Tesouro, a composição ótima de LFTs na dívida deveria variar de 10% a 20% do total. De qualquer forma, muito já foi feito nos últimos anos - em 2003, taxas flutuantes, como a Selic, corrigiam 47,8% da dívida pública. |
Professor.... esse texto é seu????
ResponderExcluirOi Ana Carmen,
ExcluirNão. Como mostra o cabeçalho da matéria pertence Cristiano Romero do Jornal Valor Econômico.