sábado, 10 de novembro de 2012

Petróleo: Dilma ainda estuda saída para royalties

Petróleo: Dilma ainda estuda saída para royalties

"Dádiva de Deus" vira problema nacional
Autor(es): JULIANA COLARES
Correio Braziliense - 08/11/2012
 

Projeto aprovado por deputados corre dois sérios riscos. Um é ser vetado pela presidente. O outro, ir parar no STF. Nos dois casos, os municípios que não produzem petróleo, mas querem um quinhão na partilha, sairiam perdendo.

Dilma estudará o projeto que regula a distribuição dos royalties do petróleo antes de decidir pela sanção ou pelo veto. Rio reclama que a Copa e as Olimpíadas serão afetadas e Planalto teme que a discussão chegue ao STF

A profecia de Lula virou realidade. Em agosto de 2009, o então presidente da República se referiu ao pré-sal como uma "dádiva de Deus", mas alertou que se o país não soubesse administrar essa riqueza, o "bilhete milionário poderia virar um problema". Virou. O projeto de partilha dos royalties do petróleo aprovado na Câmara dos Deputados na noite de terça-feira corre dois sérios riscos — o de ser parcialmente vetado pela presidente Dilma Rousseff e o de ir parar no Supremo Tribunal Federal (STF). Nas duas situações, os municípios sem produção própria de petróleo não conseguirão o que mais queriam: colocar logo a mão no dinheiro.
O autor do substitutivo ao projeto que acabou sendo aprovado, o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), e o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), disseram ontem que o resultado poderia ser diferente se tivesse havido mais tempo para analisar e discutir a proposta de Zarattini, que se aproximava mais do que o Planalto queria. Entretanto, o clima de "já ganhou" e a tímida atuação dos líderes no momento da votação podem ter sido decisivos para a derrota, avalia outro grupo de parlamentares.
Durante a apreciação, os deputados pareciam atordoados diante de uma matéria tão complexa. Há quem analise que, se houve um vencedor nessa disputa, foi a Confederação Nacional dos Municípios (CNM). Agilmente, a entidade distribuiu tabelas que mostravam que o texto do Senado previa mais recursos a curto prazo para os municípios. Enquanto a cabeça dos deputados indecisos ia sendo formada nesse sentido, pouco se via de movimentação das lideranças da base no caminho contrário. Nem Zarattini viu o início da virada do jogo. Otimista em relação ao seu substitutivo, ele dava entrevistas enquanto a CNM ganhava terreno. O projeto do Senado foi aprovado na Câmara com o placar de 286 a 124 votos. Mais: a proposta votada ontem tinha um básico e grave erro de cálculo.
Na projeção da distribuição dos royalties de 2017 a 2020, a soma do que todos os interessados vão ganhar dá 101%, e não 100%. Se essa parte do texto chegar assim ao Palácio do Planalto, sofrerá veto. Ontem, o autor do projeto, o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), disse que não havia equívoco. Uma tabela corrigida foi lida no plenário do Senado pelo presidente da sessão, Paulo Paim (PT-RS).
Partilha
Há fortes indicativos de que pelo menos uma parte da proposição não seja vetada: a que trata do sistema de partilha, muito mais rentável à União que o sistema de concessão. Dessa definição, depende um dos leilões do pré-sal marcados para 2013. "Na parte (do projeto aprovado na Câmara) que diz respeito à exploração do pré-sal no modelo de partilha, não há qualquer risco (de veto)", assegurou a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti. Se houver veto na parte que trata das concessões, continuará valendo a legislação que está em vigor. O texto aprovado pela Câmara ainda não está no Planalto. Quando chegar, o prazo de análise é de 15 dias. No início da noite, a assessoria de imprensa da Presidência informou que Dilma "fará uma exaustiva análise do projeto de royalties aprovado pela Câmara antes de concluir pela sanção, veto total ou veto parcial".
Nos principais estados produtores, o dia pós-votação foi de reclamações. O governador do Rio de Janeiro chegou a dizer que a realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas está ameaçada: "Isso gera um colapso nas finanças do Rio, com uma perda de R$ 4 bilhões no ano que vem". As bancadas dos dois estados pressionam pelo veto e ameaçam recorrer à Suprema Corte. O governo federal tenta evitar a judicialização.
Colaboraram Amanda Almeida e João Valadares
Memória
A maldição do petróleo
Em 31 de agosto de 2009, enquanto o governo ainda comemorava a descoberta de grandes jazidas de petróleo na camada pré-sal, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou as reservas do combustível fóssil como "uma dádiva de Deus", que poderia impulsionar as riquezas do Brasil. Mas Lula fez referência à "maldição do petróleo" caso o país não soubesse administrar os dividendos.
Antevendo situações que ocorreram em outras nações — como a exportação de toda a produção petrolífera, que resultou em desindustrialização e à desorganização da economia interna —, ficou decidido, ainda na gestão Lula, na época em que Dilma Rousseff era ministra da Casa Civil, que o governo seguiria três fundamentos.
O primeiro estipulava que toda a riqueza deveria pertencer ao Estado. Dessa forma, o modelo de exploração teria que assegurar que a maior parte dos dividendos fosse revertida em benefícios à população. O segundo determinava que o Brasil não se tornasse mero exportador de petróleo bruto, mas impulsionasse a transformação do insumo em gasolina e produtos petroquímicos — o que gera mais renda e empregos. Por último, que os lucros não fossem consumidos de maneira irresponsável. "Os recursos devem ir para a educação, o combate à pobreza. E vamos apostar no científico e no tecnológico", disse Lula.

Nenhum comentário:

Postar um comentário