quarta-feira, 21 de novembro de 2012

BANCOS GANHAM NA JUSTIÇA AÇÕES CONTRA OS DERIVATIVOS

BANCOS GANHAM NA JUSTIÇA AÇÕES CONTRA OS DERIVATIVOS

TRIBUNAIS DE JUSTIÇA CONSIDERAM VÁLIDOS CONTRATOS DE DERIVATIVOS
Autor(es): Por Adriana Aguiar | De São Paulo
Valor Econômico - 21/11/2012
 

Os contratos de derivativos cambiais, que durante a crise de 2008 e a disparada do dólar afetaram as finanças de grandes grupos como Sadia, Aracruz e Votorantim, causando prejuízos bilionários, têm sido reconhecidos como legítimos pelo Judiciário. As empresas que questionaram a validade dessas operações têm perdido os processos tanto na primeira quanto na segunda instância. Nas condenações, os magistrados consideram que as companhias assumiram riscos previsíveis ao apostar nesse tipo de investimento e determinam que os bancos sejam ressarcidos.
Levantamento feito para o Valor pelo escritório Wald Associados Advogados mostra que há pelo menos 27 ações sobre o tema em tramitação na Justiça. Em praticamente todas as instituições financeiras tiveram ganho de causa. Treze desses processos já chegaram aos Tribunais de Justiça com vitória também dos bancos. Entre os casos há ações de empresas como a Imcopa, processadora de soja, a catarinense Tuper, processadora de aço, a Doux Frangosul, produtora de aves e embutidos, e a varejista de móveis e decoração Tok & Stok.


Advogado e professor Arnoldo Wald: Judiciário tem dado decisões técnicas, levando em consideração a natureza peculiar dos contratos de derivativos
A Justiça tem sido implacável ao considerar válidos os contratos de derivativos, vinculados à oscilação do dólar, firmados entre companhias e bancos no início da crise financeira mundial em 2008. Um balanço realizado pelo escritório Wald Associados Advogados, que acompanha as 27 principais ações sobre o tema, aponta que praticamente todas decisões dos Tribunais de Justiça de São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul foram favoráveis à manutenção dos contratos ou ao prosseguimento da cobrança pelas instituições financeiras.
Mesmo em primeira instância, são poucas as sentenças favoráveis à anulação dos contratos. Em razão desse panorama, muitas empresas preferiram fechar acordos com os bancos (leia abaixo) a prosseguir com as ações.
Entre as empresas que sofreram revés na Justiça, está a Imcopa, maior processadora de soja não transgênica do país. A companhia chegou a obter sentença favorável à anulação contratual. Contudo, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) foi unânime ao reformar a sentença e condená-la a pagar cerca de R$ 1,5 milhão ao banco WestLB. Após a decisão, as partes fecharam acordo.
A catarinense Tuper, uma das principais processadoras de aço do país, questionou parte dos contratos negociados. A companhia alegou já ter pago R$ 4,3 milhões ao Banco Itaú (atual Itaú-Unibanco) e que nada mais seria devido, pois os demais contratos não poderiam ser considerados válidos. A 23ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), porém, manteve a condenação de primeira instância para o pagamento de cerca de R$ 3,4 milhões a mais. Com a decisão, a empresa também preferiu firmar um acordo.
Já outras companhias ainda aguardam novas decisões no Judiciário. A Doux Frangosul, produtora de aves e embutidos de Santa Catarina, recentemente arrendada pela JBS, recorreu ao TJ-SP depois de ser foi condenada pela 26ª Vara Cível de São Paulo a pagar R$ 30,5 milhões ao Banco UBS Pactual.
A Tok & Stok, varejista de móveis e decoração, ao entrar com pedido de anulação de contrato contra o Banco Itaú, não só teve seu pedido negado como foi condenada, em primeira instância, a pagar cerca de R$ 17 milhões pelas perdas nos contratos de derivativos firmados em agosto de 2011. Posteriormente, porém, a decisão foi anulada.
Com a crise financeira mundial em 2008 e a alta do dólar em setembro daquele ano, muitas companhias buscaram o Judiciário para anular esses contratos. Os negócios previam ganhos para as companhias caso o dólar ficasse abaixo de um limite estipulado no contrato, ou perdas, caso o dólar subisse.
As empresas defendem que houve desequilíbrio nos contratos. Os bancos teriam suas perdas limitadas, mas as companhias não contavam com essa proteção. Outras utilizam nos processos a teoria da imprevisão. Argumentam que a valorização do dólar, que foi de R$ 1,55 para R$ 2,40, seria um evento imprevisível, gerador de desequilíbrio, o que autorizaria a revisão dos contratos. Há processos que ainda sustentam que os bancos teriam oferecido as operações com derivativos a clientes sem o perfil adequado e não teriam alertado sobre os riscos envolvidos, o que autorizaria a anulação dos contratos por violação à boa-fé.
Esses argumentos, porém, foram rejeitados pelo Judiciário. O relator do caso da Imcopa no TJ-PR, desembargador Hayton Lee Swain Filho, também considerou a natureza do negócio "que leva em sua essência o risco da variação cambial". Para o magistrado "não se poderia considerar essas perdas como "fato imprevisível e extraordinário a causar injustificativa vantagem" ao banco.
A juíza Mariella Ferraz de Arruda Nogueira, da 39ª Vara Cível do Fórum Central de São Paulo, que condenou a Tok & Stok, entendeu que o risco do negócio foi destacado pelo banco na contratação. "O mínimo que se pode esperar de uma empresa com notória experiência no mercado, como é o caso, é que se busque informações no mercado e junto à própria instituição financeira quanto às possibilidades positivas e negativas da negociação", diz.
O advogado da empresa, Antonio Lopes Muniz, informou, porém, que, como teria havido cerceamento de defesa e as provas fornecidas pela companhia não teriam sido analisadas na primeira instância, a decisão foi revertida pelo TJ-SP. O caso será novamente avaliado pela 39ª Vara Cível. Para Muniz, não é a mesma situação dos contratos de swap, no qual as empresas tinham orientação da própria tesouraria para apostar dinheiro e correr o risco de perder. "A Tok & Stok não tem esse hábito e só firmou esse contrato por conta de um empréstimo", afirma.
Segundo os coordenadores do balanço, os advogados Arnoldo Wald e André de Luizi Correia, do escritório Wald Associados Advogados, as decisões sinalizam que há uma jurisprudência em formação favorável aos bancos.
Para Wald, a Justiça tem dado decisões técnicas, levando em consideração a natureza peculiar desses contratos. "Ganhar ou perder é um risco inerente a essas operações. Quem assumiu o risco deve suportá-lo, ainda que as perdas verificadas sejam consideráveis", diz o advogado, acrescentando que o princípio do equilíbrio entre as partes direcionado aos contratos comerciais não pode ser aplicado aos derivativos. "Esses contratos envolvem uma certa aposta." Segundo Wald, as empresas têm informações sobre o risco do negócio e, por isso, a Justiça também não poderia aplicar a teoria da imprevisibilidade.
Com os questionamentos judiciais, as operações com contratos de derivativos ficaram praticamente paralisadas no Brasil, segundo Correia. "Porém, voltaram com força em 2010 e viraram uma rotina", afirma.
O advogado Maurício Almeida Prado, sócio do escritório L.O.Baptista-SVMFA Advogados, estudioso do assunto, afirma que as decisões judiciais brasileiras se alinham com a jurisprudência da maioria dos países europeus ao não aceitar a aplicação da teoria da imprevisão. "São contratos de risco. É o mesmo que jogar em um cassino e depois reclamar pelo que se perdeu", diz. Ele acrescenta que, durante muitos anos, as companhias ganharam muito com esses contratos. Prado afirma ter recomendado a clientes com contratos dessa natureza a negociação com os bancos. "Tecnicamente seria muito difícil ganhar uma ação como essa na Justiça."
Procuradas pelo Valor, a assessoria de imprensa da JBS e a diretoria da Imcopa não deram retorno até o fechamento da edição. A Tuper informou que não se manifestará sobre o assunto.

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