Energia nuclear em desuso
Autor(es): Heitor Scalambrini Costa |
Correio Braziliense - 01/10/2012 |
Setembro de 2012 ficará marcado na história
pelos anúncios feitos pelos governos japonês e francês a respeito da
decisão de se afastarem da energia nuclear, responsável pelos piores
pesadelos da humanidade. Essa tomada de posição tem um significado
especial, visto que Japão e França, até então defensores dessa fonte
energética, têm em suas matrizes a maior participação mundial da
nucleoeletricidade. Depois da histórica decisão do governo alemão de
abandonar em definitivo a energia nuclear, agora são esses dois
governos que vão rever seus planos para o setor. O Japão anunciou que abrirá mão da energia nuclear ao longo das próximas três décadas. A decisão, tomada após encontro ministerial (14/9), indica o abandono de tal fonte energética na década de 2030. Essa posição governamental foi tomada após o desastre de Fukushima, que abalou a confiança da população na segurança dos reatores nucleares. O plano japonês apresentado é semelhante ao da Alemanha, primeira nação industrializada que se comprometeu a desligar todos os seus 17 reatores até 2022. Sem dúvida, para o Japão, a tarefa é complexa, visto que 1/3 da eletricidade gerada no país é proveniente dos 50 reatores instalados em seu território. Ainda sobre a decisão do governo japonês, existem críticas por não ter sido especificado quando exatamente a meta seria alcançada, já que a decisão agora tomada não seria obrigatória para governos futuros. O que significa, em princípio, que uma nova administração poderia reverter os planos. Todavia, analistas afirmam que dificilmente essa mudança de rumo ocorreria pelo alto engajamento e conscientização dos japoneses, demonstrada em recente pesquisa de opinião em que mais de metade da população se diz favorável ao fim do uso da energia nuclear no país. Também houve críticas sobre o porquê desse calendário ser tão dilatado, já que o país chegou a desligar 48 dos reatores depois do desastre de Fukushima e poderia, com o aumento da participação das fontes renováveis e com ambicioso programa de eficientização energética, atingir a meta num prazo menor. Todavia, mesmo com as ressalvas, a decisão anunciada aponta para um novo rumo na questão energética japonesa e mundial. Já na França, em conferência realizada em 14 e 15 de setembro sobre questões ambientais, em Paris, o presidente François Hollande, cumprindo promessa de campanha, declarou que está engajado na transição energética, baseada em dois princípios: eficiência e fontes renováveis; e que planeja reduzir a dependência do país da energia nuclear, hoje correspondendo a 75% da matriz energética, para 50% até 2025. Sem ter metas conclusivas para o abandono definitivo da energia nuclear no seu território, sem dúvida a decisão do governo francês é histórica e extremamente positiva, visto que, até então, discutir a questão nuclear na França era tabu. Para os defensores da tecnologia que sempre mencionavam o Estado francês como referência de experiência exitosa na área nuclear, fica aí uma derrota de grandes proporções. Sem dúvida, a França rever sua posição, mesmo diante das dificuldades, da complexidade do problema e das contradições existentes, é indispensável para um mundo de amanhã sem energia nuclear. Outro país europeu que após Fukushima já havia rejeitado a energia nuclear em seu território foi à Itália, em junho de 2011. Em referendo popular, cerca de 95% dos eleitores aprovaram uma alteração legal que aboliu o uso dessa fonte energética no país. A Itália, com quatro centrais nucleares construídas na década de 1960 e 1970, e que estavam desligadas desde 1987, havia anunciado pelo governo, em 2008, a intenção de iniciar a construção de novas centrais. Nos planos governamentais, em 2030, 25% da eletricidade consumida no país seria gerada pelo átomo. Somados a Itália, a Áustria, a Bélgica e a Suíça, que também reviram os planos de instalação de novas usinas, e decidiram se distanciar da energia nuclear, agora a Alemanha, o Japão e a França tomaram decisões semelhantes. Diante desse contexto internacional, fica aqui uma pergunta que não quer calar: por que, então, o governo brasileiro insiste em planejar a construção de usinas nucleares? Com a palavra, as "autoridades energéticas". |
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