sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Mensalão: relator pede condenação de petista

Mensalão: relator pede condenação de petista

Voto pela condenação
Autor(es): ANA MARIA CAMPOS, DIEGO ABREU e HELENA MADER
Correio Braziliense - 17/08/2012
 

Rigoroso no julgamento, o ministro Joaquim Barbosa, do STF, defendeu que o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) seja punido pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Ele também pediu a condenação de Marcos Valério. A decisão de Barbosa de começar o voto por Cunha provocou acalorada discussão no Supremo
Relator do processo defende que João Paulo Cunha seja considerado culpado pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Já Marcos Valério, por corrupção ativa e peculato

O relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, surpreendeu ao começar o voto pelas acusações contra o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP). Não frustrou, no entanto, expectativas de que seria rigoroso em suas posições. O ministro defendeu a condenação do parlamentar, candidato a prefeito de Osasco (PT), pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, e do empresário Marcos Valério, por corrupção ativa e peculato.
Joaquim Barbosa começou o voto pelo item III da denúncia elaborada em 2006 pelo então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza. Nesse quesito, o relator acolheu integralmente as acusações do Ministério Público. O relator, no entanto, não tratou ontem da contagem da pena, tampouco das circunstâncias dos crimes, tema essencial para o cálculo.
Deixou esse debate que deve despertar muita polêmica e discordâncias, como tudo o que tem sido discutido no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), para o fim do voto. Se houver maioria entre os ministros de que os ilícitos devem ser contados um a um, como quer o Ministério Público, as penas serão somadas por tipo de crime e multiplicadas pelo número de vezes que ocorreram. É o concurso material.
Advogados presentes na sessão ontem esperavam que Joaquim Barbosa daria início ao voto pela parte relacionada ao suposto chefe da organização criminosa, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu. É o que apostava o advogado do petista, José Luiz Oliveira Lima, que acompanhou o julgamento ontem na primeira fila dos assentos destinados aos defensores dos réus. "A lógica seria que o voto seguisse a ordem cronológica da denúncia", avaliou o advogado Márcio Thomaz Bastos, advogado de um dos réus. Alberto Zacharias Toron, representante de João Paulo, não estava em Brasília. Acompanhou a acusação contra seu cliente pela TV Justiça.
Para Joaquim Barbosa, João Paulo, então presidente da Câmara dos Deputados, e Marcos Valério praticaram crimes graves. O parlamentar teria favorecido em 2003 a SMP&B ao realizar uma licitação desnecessária apenas para contratar a empresa de Marcos Valério. Por meio do contrato, a agência que fez o marketing da campanha de João Paulo à Presidência da Câmara recebeu R$ 10,7 milhões dos cofres públicos, mas terceirizou 99% dos serviços. Tal conduta foi considerada irregular. Em retribuição ao favorecimento, João Paulo recebeu pelo menos R$ 50 mil, dinheiro sacado da conta da SMP&B pela mulher dele, Márcia Regina Cunha.
O relator considerou que João Paulo mandou a mulher por extrema confiança justamente porque o dinheiro era fruto de corrupção passiva. O fato de ela ter sacado os recursos diretamente da boca do caixa da conta da SMP&B seria a forma de lavar o dinheiro. A acusação de lavagem de dinheiro contra João Paulo deve render muitos debates.
O presidente do STF, Ayres Britto, também considerado rigoroso em seus votos, foi contrário ao recebimento da denúncia nessa parte e pode ser uma dissidência à posição de Joaquim Barbosa, caso esse ponto não seja rebatido pelo revisor, Ricardo Lewandowski.
Interesses
Em seu voto, Joaquim Barbosa sustentou que parte dos recursos do contrato da SMP&B com a Câmara foi desviada para atender a interesses de João Paulo, o que configurou o crime de peculato, caracterizado quando um funcionário público usa o cargo para se apropriar de recursos. "O crime de peculato se consumou porque o papel da SMP&B durante a execução do contrato foi em essência de mera recebedora de honorários por conta do excessivo volume de subcontratações", explicou o ministro.
A defesa de João Paulo Cunha alega no processo que não há ilegalidade nas subcontratações e que essa é uma prática recorrente no mercado publicitário. Explicou ainda que as agências precisam pagar às empresas de comunicação pela veiculação dos anúncios. Quanto ao dinheiro sacado pela mulher de João Paulo, a defesa sustenta que seria utilizado para pagamento de uma pesquisa de opinião em Osasco (SP). Joaquim Barbosa citou acórdão do recebimento da denúncia que rebate a tese de caixa dois. "A destinação dos recursos é irrelevante para efeito da tipificação da pena de corrupção", afirmou.
As alegações da defesa não convenceram o ministro-relator. Entre as irregularidades citadas por Joaquim Barbosa está a contratação de pesquisa paga pela Câmara, por meio da SMP&B, em que constou pergunta sobre a opinião dos entrevistados a respeito do impacto de escândalo ocorrido em 2003 envolvendo o então ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, o suposto líder da organização criminosa que operou o mensalão. O então subchefe de Assuntos Parlamentares, Waldomiro Diniz, deixou o governo depois da divulgação de vídeo em que aparece recebendo dinheiro do bicheiro Carlos Cachoeira, preso em 29 de fevereiro, em decorrência da Operação Monte Carlo. Joaquim Barbosa pediu também a condenação de Cristiano Paz e de Ramon Hollerbach, então sócios de Marcos Valério, pelos crimes de corrupção ativa e peculato.
"A lógica seria que o voto seguisse a ordem cronológica da denúncia"
Márcio Thomaz Bastos, advogado, sobre o fato de o relator ter começado o voto pelo item III da denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal
Saiba mais
Corrupção ativa
» Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público para que pratique, omita ou retarde ato de ofício.
Pena: dois a 12 anos de prisão
Corrupção passiva
» Solicitar ou receber por conta de sua função vantagem ou promessa de vantagem indevida para si ou para terceiros
Pena: dois a 12 anos de prisão
Peculato
» Ato de um funcionário público de apropriar-se de dinheiro, valor ou qualquer outro bem público ou particular de que tem posse por conta do cargo
Pena: dois a 12 anos de prisão
Lavagem de dinheiro
» Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, movimentação ou propriedade de bens ou valores provenientes de crime
Pena: três a 10 anos de prisão

Nenhum comentário:

Postar um comentário