quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Turquia X Síria

Parlamento autoriza Turquia a fazer operações militares na Síria

DO Uol

O Parlamento da Turquia autorizou nesta quinta-feira o Exército do país a fazer operações militares contra a Síria durante o prazo de um ano, em represália ao bombardeio em uma cidade fronteiriça na quarta (2).


A decisão foi aprovada com 320 votos a favor e 129 contra, sendo a maioria dos votos favoráveis do governista Justiça e Desenvolvimento (AKP, sigla em turco).

Bulent Kilic/AFP 
Mulheres com véus roxos, em sinal de luto, participam de velório de vítimas de bombardeio sírio na Turquia
Mulheres com véus roxos, em sinal de luto, participam de velório de vítimas de bombardeio sírio na Turquia

O pedido foi feito pelo governo do primeiro ministro Recep Tayyip Erdogan com a justificativa de que o ataque é uma séria ameaça à segurança nacional.
Após a votação, o vice-primeiro-ministro turco, Besir Atalay, descartou que a autorização do Parlamento seja uma declaração de guerra, pois ainda falta o Executivo definir se usará ou não o envio de tropas.
Ele disse que a prioridade do país é definir com instituições internacionais a resposta ao ataque à cidade de Akçakale, que deixou cinco civis turcos mortos e outros dez feridos, na quarta-feira (3). A Turquia é membro da Otan.
Durante a madrugada e a manhã desta quinta, o Exército turco fez bombardeios a bases militares na fronteira síria, matando diversos soldados leais ao ditador Bashar Assad. Ainda não há estimativas de número de mortos nas instalações sírias.
 
DESCULPAS

Atalay disse que recebeu um pedido de desculpas das autoridades sírias, que, segundo ele, assumiram a responsabilidade pelo incidente na fronteira. O regime de Bashar Assad ainda não fez nenhum comunicado oficial sobre o tema.
Mais cedo, o chanceler da Rússia, Sergei Lavrov afirmou que pediu ao governo sírio que confirme oficialmente o ataque à cidade turca como um acidente. "Eles [os sírios] garantiram que o ocorrido foi uma trágica fatalidade e tomarão todas as medidas para que isso não se repita".
Ele ainda pediu que as autoridades dos dois países mantenham um contato direto para discutir a situação dos refugiados e os confrontos da fronteira. Lavrov ainda reconheceu que o conflito sírio "começou a cruzar as fronteiras do país".

AFP
Rebeldes sírios preparam lançador de foguetes em ação na fronteira com a Turquia, nesta quinta
Rebeldes sírios preparam lançador de foguetes em ação na fronteira com a Turquia, nesta quinta
 
RESPONSÁVEL
Danilo Bandeira/Editoria de arte/Folhapress                                          
Inicialmente, o regime sírio foi apontado pelos turcos como o principal responsável ao ataque a Akçakale. A ação não foi reivindicada oficialmente nem pelo governo de Assad nem pelos rebeldes.
Ainda na quarta (3), o embaixador de Ancara nas ONU, Ertugrul Apakan, pediu ao Conselho de Segurança que adote as "medidas necessárias" para deter "este ato de agressão por parte da Síria contra a Turquia".
O episódio de quarta-feira não foi um evento isolado. Na sexta-feira passada, outra bomba danificou prédios residenciais e comerciais, também em Akçakale.
Em junho, a defesa antiaérea síria derrubou um avião de combate turco, levando a Turquia a reforçar seu dispositivo militar na fronteira.
A duração dessa guerra civil já havia desgastado as relações habitualmente amigáveis entre os dois países. Após ataques do regime de Bashar Assad à população civil, o governo turco se uniu aos críticos do regime sírio.
O país também abriga mais de 90 mil refugiados do país vizinho, mas teme muitos mais atravessem a fronteira, sem uma solução para o confronto sírio no curto prazo.

Brasil questionará medidas no FMI

Brasil questionará medidas

Wellton Máximo - Repórter da Agência Brasil

O Brasil questionará, na próxima reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI), as medidas recentes de afrouxamento monetário nos Estados Unidos e na Europa. Segundo um representante do governo, o país defenderá os estímulos ao consumo interno e aos investimentos para combater a crise econômica global, em vez de injeções de dinheiro pelos bancos centrais.

A reunião do FMI ocorrerá em Tóquio, de 9 a 14 de outubro. De acordo com o governo brasileiro, o afrouxamento monetário afeta os países emergentes porque desvaloriza artificialmente o dólar e o euro, principais moedas usadas no comércio internacional. No caso do Brasil, a cotação dessas duas moedas cai em relação ao real, o que desestimula as exportações e incentiva as importações dos países desenvolvidos.

No encontro, o Brasil defenderá a melhoria da qualidade dos gastos nos países desenvolvidos. Segundo o representante do governo, o país pode fazer desonerações que beneficiem setores essenciais para a economia, manter os investimentos públicos e, ainda assim, continuar a reduzir o endividamento público por meio de um ajuste fiscal inteligente. Essa receita, informou a fonte, é a mesma que tem sido aplicada para estimular a atividade econômica brasileira nos últimos anos.

Em relação às reformas do FMI, o governo brasileiro não espera que decisões importantes sejam tomadas na reunião da próxima semana. O Brasil pressionará para que os países ratifiquem a redistribuição das cotas definida em 2010. O problema, segundo a fonte do governo, no entanto, é que a reforma só será concluída quando for aprovada pelo Congresso norte-americano, o que poderá ser feito apenas depois das eleições presidenciais dos Estados Unidos, em novembro.

Na reforma de 2010, o Brasil aumentou de 2% para 2,3% a participação no FMI. Outro ponto de discussão será a revisão das fórmulas que servirão de ponto de partida para a negociação da segunda etapa de reforma das cotas, prevista para entrar em vigor em janeiro de 2014. O Brasil, os Estados Unidos e a maioria dos países em desenvolvimento defendem que o Produto Interno Bruto (PIB), que mede o tamanho das economias dos países, tenha maior peso no cálculo.

Diversos países da Europa, no entanto, reivindicam a manutenção ou o aumento do grau de abertura das economias na fórmula. Segundo o governo brasileiro, isso amplia a representação de países menores do continente, cujos fluxos comerciais e de rendas de investimentos têm maior peso sobre o PIB. O problema, de acordo com o representante do governo, é que as negociações não avançaram nos últimos meses e nenhuma decisão deve ser tomada. Pelo cronograma original, as fórmulas deveriam estar definidas em janeiro de 2013.

Paralelamente à reunião do FMI, os países do Brics – grupo que reúne o Brasil, a Rússia, Índia, China e África do Sul – farão uma reunião no dia 11. O encontro discutirá a formação de um banco conjunto de desenvolvimento, semelhante ao Banco Mundial e ao Banco Interamericano de Desenvolvimento, cuja criação foi anunciada em agosto, em reunião do bloco, no Rio de Janeiro. A expectativa é que a decisão final sobre a instituição financeira seja tomada na próxima reunião do Brics, em março de 2013, na África do Sul.

Os países do Brics também debaterão um mecanismo de socorro mútuo entre os bancos centrais dos membros do bloco. Em caso de crise nas contas externas, cada país teria acesso à parte das reservas internacionais dos demais parceiros do Brics. A diferença em relação aos mecanismos de socorro montados na Europa é que o dinheiro não será aplicado em um fundo internacional e permanecerá nas reservas de cada país antes de ser emprestado.

Edição: Lana Cristina

Fonte: EBC  
 
 

Publicado em: 04/10/2012

Metade de Itaipu parou à noite

Metade de Itaipu parou à noite

Itaipu perdeu metade da carga ontem à noite
O Globo - 04/10/2012
 
Desligamento súbito da usina acionou sistema de emergência. Periferias de Sudeste, Sul e Centro-Oeste ficaram sem luz
Metade da hidrelétrica de Itaipu parou de operar, subitamente, ontem à noite. Por volta das 21h, distribuidoras estaduais foram orientadas a acionar os esquemas regionais de alívio de carga (Erac). São protocolos de operação, em que áreas periféricas têm o fornecimento interrompido para que regiões prioritárias não sejam afetadas. Assim, grandes capitais, como Rio e São Paulo, não se apagaram. Hospitais e sistemas de transportes públicos nas metrópoles também foram poupados. Já se sabe que áreas do Sudeste, do Sul e do Centro-Oeste foram prejudicadas pelo desligamento de Itaipu. As regiões Norte e Nordeste não teriam sido atingidas. O Operador Nacional do Sistema (ONS) só deve saber nesta quinta-feira a causa da perda dos 5.600 MW em Itaipu, praticamente metade de toda a geração da usina nesta época do ano. Quatro transformadores da subestação de Foz do Iguaçu foram desligados. A uma distribuidora foi dito que três turbinas de Itaipu pararam de funcionar. Hermes Chipp, diretor do ONS, disse à coluna que o sistema de emergência funcionou e evitou o blecaute no país. Até 40% da carga de cada distribuidora podem ter sido cortados.

Os números da guerra

Os números da guerra

Renata Giraldi - Repórter da Agência Brasil

A Agência de Refugiados das Nações Unidas (cuja sigla em inglês é Acnur) divulgou hoje (2) que o número de sírios que deixaram o país, nos últimos 19 meses, em busca de abrigo nos países vizinhos - Jordânia, Líbano, Turquia e Iraque – ultrapassou 300 mil. Segundo as estatísticas da agência, triplicaram os refugiados sírios na região. Precisamente são 311,5 mil.

O porta-voz do Acnur, Adrian Edwards, reiterou que o aumento do número de refugiados obrigou a agência a refazer as estimativas de gastos para US$ 487,9 milhões. O cálculo é que 710 mil refugiados sírios procurem abrigo nos países vizinhos até dezembro. Ele lembrou que a situação pode se agravar devido à chegada do inverno na região.

"Estamos em uma corrida contra o tempo. Na Jordânia, por exemplo, onde milhares de pessoas estão vivendo em tendas, a temperatura média fica mais baixa entre meados de novembro e março, algo em torno de 2 graus Celsius”, disse o porta-voz.

Há 19 meses, a Síria vive sob clima de guerra devido à disputa política entre o governo do presidente sírio, Bashar Al Assad, e a oposição. A estimativa é que mais de 25 mil pessoas morreram, segundo organizações não governamentais. A oposição cobra de Assad a transição política, o fim do governo e mais liberdade de expressão.

A crise na Síria virou tema internacional e assunto mencionado em todas as discussões envolvendo líderes políticos. A presidenta Dilma Rousseff, na semana passada, em Nova York, durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, defendeu o fim da violência na região e a busca por um acordo de paz, sem interferência externa militar.

Mais informações sobre os dados da Acnur estão no site da agência http://www.unhcr.org/506ab7259.html

Edição Beto Coura

Fonte: EBC
 
 

Publicado em: 03/10/2012

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Um chavismo sem Chávez é possível?

Um chavismo sem Chávez é possível?
Economia profundamente reestruturada, apoio popular que o passar dos anos não erodiu, candidatos à sua sucessão... Uma derrota de Hugo Chávez – que não é prevista por nenhuma pesquisa – nas eleições de 7 de outubro ou sua morte conduziriam ao fim do processo político ao qual ele deu início?
por Steve Ellner
 "Um favor é sempre obtido em troca de outro”, admite Joanna Figueroa. Essa moradora de Viñedo, bairro popular da cidade costeira de Barcelona, no leste da Venezuela, prometeu trabalhar pela reeleição de Hugo Chávez desde que o Estado lhe proporcionou um teto por meio da Grande Missão Habitação, um ambicioso programa de moradia social. Ela própria construiu sua casa, em meio a uma “equipe de trabalhadores” formada por um pedreiro, um encanador e um eletricista nomeados por um conselho comunitário. Seu trabalho consistiu em misturar o cimento. “O amor que recebemos é pago pelo amor que damos de volta”, professa, retomando o lema em uso entre os partidários de Chávez. O sucesso desse refrão, ouvido em todo o país, reflete o vínculo emocional que existe entre muitos venezuelanos e seu presidente.
A eleição em 7 de outubro próximo cristaliza questões consideráveis. Embora o candidato da oposição Henrique Capriles Radonski goste de se apresentar como um renovador, sem vieses ideológicos, ele também não deixa de pertencer ao conservador Partido da Justiça (PJ), que defende os interesses dos investidores privados e vê com desconfiança qualquer intervenção do Estado na economia. A oposição amadureceu, no entanto, desde seu golpe fracassado de 2002 e de sua decisão, tomada por despeito na esteira dos acontecimentos, de boicotar as eleições nacionais. Agora, seus líderes participam do processo eleitoral e demonstram apoio fervoroso à Constituição de 1999, aprovada por uma maioria esmagadora dos votos e a qual tinham rejeitado na época. Eles chegaram até mesmo a se unir em torno de um candidato comum, investido em fevereiro depois de uma primária.
O bom balanço da Missão Habitação, que forneceu um teto para milhares de famílias de baixa renda envolvendo-as na aplicação do programa no âmbito dos bairros, provavelmente contribui para a persistente popularidade de Chávez, que continua à frente nas pesquisas. A oposição tenta inutilmente proclamar que tem a vitória, mas um certo desencorajamento emerge. Figura influente da direita e adversário ferrenho de Chávez, o empresário da comunicação Rafael Poleo recentemente desautorizou a candidatura de Capriles, considerado “incapaz de ir aonde quer que seja”. A declaração se seguiu à publicação em maio de uma pesquisa de opinião que dava 43,6% dos votos ao presidente em exercício, contra apenas 27,7% para Capriles. O balanço do governo Chávez recolheu por sua vez 62% de opiniões favoráveis − uma pílula que se torna ainda mais amarga quando se sabe que o autor da pesquisa, o Instituto Datanalisis, pertence a Vicente Leon, fiel partidário da oposição.
A popularidade que Chávez parece usufruir não deixa de surpreender, dados os seus treze anos de poder e o cansaço que tal longevidade instala necessariamente na opinião pública. Sua candidatura poderia sofrer de incertezas relacionadas ao seu câncer, tornado público em 30 de junho de 2011 (sem que tenham sido revelados o local e a gravidade da doença). A oposição também não deixou de denunciar a falta de visão do presidente, que se recusou a nomear um substituto capaz de assegurar a continuidade do poder em caso de vacância precipitada. Dentro e fora do país, os meios de comunicação próximos aos negócios exploram de bom grado os problemas de saúde do chefe de Estado venezuelano para minorar suas chances de reeleição. Como indica um estudo realizado pelo jornalista Keane Bhatt, o duelo sob os trópicos entre a “fragilidade de Chávez” e a “energia juvenil” de Capriles se impôs como um clássico na produção da Reuters, da Associated Press e do Miami Herald.1
A irrupção da doença também revive a espinhosa questão da liderança no seio do movimento de Chávez, que começa a reconhecer que a concentração do poder em suas mãos não tem só vantagens: enquanto seus ministros vêm e vão, o presidente – cujo retrato adorna quase todos os cartazes bolivarianos – reina como a única encarnação de um processo político que parece só depender dele.
Durante uma visita ao Brasil, em abril de 2010, um repórter perguntou a Chávez se ele planejava um dia dar lugar a outro dirigente: “Eu não tenho um sucessor em vista”, retrucou. É esse o caso ainda hoje? No ano passado, ele fez uma concessão a um de seus ex-assessores, o acadêmico espanhol Juan Carlos Monedero, que acabara de alertá-lo contra os perigos de um “hiperliderança” na Venezuela: “Eu preciso aprender a delegar mais poder”. Durante os períodos em que os tratamentos o afastavam dos negócios, vários políticos ocuparam o vazio e surgiram como potenciais sucessores. Notadamente, o atual ministro das Relações Exteriores, Nicolás Maduro, um ex-líder sindical que presidiu a comissão que esteve por trás da nova legislação trabalhista e que dispõe de sólidos apoios entre organizações dos trabalhadores. Ou ainda o vice-presidente executivo Elías Jaua, muito popular entre as bases militantes do movimento chavista. Sem mencionar o presidente da Assembleia Nacional, o pragmático Diosdado Cabello, um ex-tenente que tem fortes apoios no Exército. Apesar da onipresente tutela de Chávez, “alguns de nós pensamos que seria difícil continuar o processo”, explicou Monedero em maio passado. “Agora não temos mais esse medo, pois vejo dezenas de pessoas que poderiam continuar o trabalho sem o menor problema.”
 Em direção ao socialismo
No caso de um terceiro mandato, o futuro político de Chávez dependerá sem dúvida da capacidade de seu staff de aprofundar as mudanças iniciadas, desenvolver novos programas sociais, fortalecer a base popular e lutar contra a insegurança.2 O caminho já percorrido não permite prever isso. Eleito pela primeira vez em dezembro de 1998, com um programa moderado concebido para apagar a imagem beligerante que estava colada a ele desde sua tentativa de golpe em 1992, o ex-encrenqueiro da Academia Militar de Caracas ficou ansioso para votar uma nova Constituição, lançar uma ampla reforma agrária e transformar a legislação social e econômica. Em 2005, ele proclamou sua conversão ao socialismo e nacionalizou os setores estratégicos da economia, tais como telecomunicações, bancos, eletricidade e aço. A partir de 2009, a “revolução bolivariana” começou a estender seu controle às empresas menores, mas cruciais para a vida diária da população. Acompanhada por uma escalada verbal contra a “burguesia”, a “oligarquia” e o “imperialismo norte-americano”, essa política de expropriação perseguiu, no entanto, um objetivo menos controverso: garantir a soberania alimentar do país.
Por meio de uma rede de empresas públicas, bens de primeira necessidade, como arroz, café, óleo ou leite, passaram a ser produzidos no local de consumo e estão disponíveis a preços acessíveis. Em junho, a Venezuela chegou a inaugurar sua primeira linha de produção de maionese à base de óleo de girassol. O estabelecimento de novos serviços públicos reconhecidos como eficientes – alimentação, bancos, telecomunicações – sugere que um Estado não é necessariamente incompetente para gerir empresas. A demonstração é menos convincente no caso de indústrias pesadas, como a do aço, do alumínio e do cimento, ainda atormentadas por conflitos sociais e pelas falhas da rede comercial. Assegurando ele próprio a venda de materiais de construção para os bairros carentes, sem passar por intermediários preocupados com suas margens de lucro, o governo espera resolver pelo menos parte do problema.
De acordo com a Comissão Econômica da Organização das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe (Cepal), o índice de pobreza na Venezuela diminuiu 21% entre 1999 e 2010. Mas essa proposta de redistribuição em favor dos mais pobres não faz a felicidade das classes médias, que permanecem em sua maioria hostis ao presidente em fim de mandato. Se as pesquisas dão a este último um avanço de vinte pontos sobre seu rival, as proporções se invertem quando nos aproximamos dos bairros mais desenvolvidos. Entre os mais ricos, o bardo do bolivarismo muitas vezes desperta uma hostilidade visceral, em razão do medo – inteligentemente mantido pela oposição e pelos meios patronais – de que o governo acabe um dia por proibir a propriedade privada. Ao que se acrescenta em alguns casos um ressentimento em relação aos pobres, que parecem drenar para eles todas as benesses do Estado. O governo, no entanto, não economizou ações para as classes médias e altas, como a introdução de uma taxa de câmbio preferencial para viagens ao exterior.
Enquanto Chávez parece querer se destacar de certos excessos do passado, Capriles desempenha decididamente o papel de homem da renovação. Ele nunca perde a oportunidade de lembrar que tem apenas 40 anos e que, portanto, não é responsável por políticas desastrosas impostas aos venezuelanos antes de 1998 – mesmo que os partidos que estavam no comando na época o apoiem hoje. Em seus discursos, frequentemente associa a “velha maneira de fazer política” aos episódios de intolerância e de polarização que marcaram o país antes e depois da chegada ao poder de Chávez. Posando como um baluarte contra o sectarismo, ele promete não excluir programas sociais do atual governo, mas sim melhorá-los. Oferece, por exemplo, a colocação em votação de uma nova lei, chamada “Missões iguais para todos”, que garantiria aos cidadãos de todas as classes e de todos os rótulos políticos o acesso aos programas sociais. Entrevistado por um canal de TV privado em 1o de fevereiro de 2011, explicou: “O que é positivo no balanço de Chávez é que ele recolocou na ordem do dia a questão da luta contra a pobreza. Mas agora temos de ir mais longe e superar os meros discursos para acabar com esse flagelo”.
Sem dúvida alguma – os números da Cepal confirmam isso –, os programas sociais do governo venezuelano não se baseiam em “meros discursos”. Mas as propostas de Capriles (que corroboram as de Teodoro Petkoff, um ex-guerrilheiro que agora é porta-voz do establishment local) representam uma forma de vitória ideológica de Chávez. Elas também mostram que, aos olhos do candidato da oposição, o ex-tenente-coronel não seria talvez o ditador louco que os meios de comunicação privados denunciam há anos.
Se a oposição quase não contesta mais a eficácia da política social bolivariana, Chávez e Capriles assumem em contrapartida posições diametralmente opostas em matéria de política econômica. É em relação à questão das desapropriações que os dois lados combatem com mais virulência. Para os partidários de Chávez, a desapropriação é uma ferramenta para construir uma economia mista dedicada ao interesse geral, nomeadamente no que se refere à construção, aos bancos e à alimentação: abrindo uma brecha no domínio dos monopólios privados sobre esses setores vitais, o Estado pôs fim à escassez artificial que outrora os consumidores experimentavam. “Por que desta vez não se vê nenhum tipo de escassez, como as que atingiram o país durante os períodos eleitorais passados?”, perguntou recentemente o deputado Iran Aguilera, que é próximo de Chávez. “Porque as empresas do Estado preencheram o vazio que era criado com fins políticos pelo setor privado.”
 Oposição, currículo sob suspeita
A oposição, por sua vez, tem a intenção de devolver prontamente ao setor privado seus direitos inalienáveis. “Não pretendo discutir com empresários ou com mais ninguém sobre isso”, admite com franqueza Capriles. O favorito dos líderes empresariais argumenta que as empresas controladas pelo Estado têm visto sua produção cair, sem fornecer estatísticas para apoiar essa tese. Ele prefere enfatizar o retorno alardeado para os investidores estrangeiros, esperando que sua cornucópia lhe permita manter sua promessa cardeal: a criação de 3 milhões de postos de trabalho em seis anos. A ortodoxia liberal que permeia seu programa não poupa a Segurança Social, da qual o Estado perderia o controle em benefício de um sistema misto que daria ênfase à “poupança individual voluntária.” Por sua vez, a Mesa da Unidade Democrática (MUD), a coligação heteróclita formada pelos partidos que apoiam Capriles, reclama uma “flexibilização” da lei que rege o controle estatal sobre a indústria do petróleo “para promover a concorrência e a participação do setor privado”.3
Bem de acordo com seu desejo de conquistar um amplo apoio, o candidato anti-Chávez não está seguro de que conseguirá seduzir muito além das classes médias que compõem a base de seu próprio partido, o PJ. Primeiro, porque ele veio de uma família de empresários que fizeram fortuna nos mais diversos setores, do mercado imobiliário à indústria, passando pelos meios de comunicação: um perfil pouco divulgado no seio da classe política venezuelana. Além disso, Capriles é ex-prefeito de Baruta, um gueto chique da Grande Caracas. Não dá para ter certeza que a imagem modesta e jovem que ele tenta impor a si próprio seja suficiente para compensar tal currículo entre os eleitores menos favorecidos, mesmo que eles estejam cansados de Chávez.
O líder da oposição nem sempre é ajudado por suas próprias tropas. Recentemente, o MUD atacou de frente a Missão Habitação, chamando de “fraude” e “fracasso” a desapropriação de terras para a criação de hábitats sociais. Uma ofensiva arriscada, tratando-se do programa de governo mais popular dos anos Chávez. De acordo com o ministro da Informação, Andrés Izarra, os primeiros objetivos foram alcançados com a construção de 200 mil moradias desde o lançamento do plano, em 2011.
Sem nunca esquecer seu passado militar, Chávez a apresentou como uma “guerra” que deveria mobilizar o conjunto do governo e do movimento bolivariano. Em alguns distritos, estudantes recebem uma bolsa para treinar “brigadas” responsáveis pela construção de casas. Mas o papel principal está com os 30 mil conselhos comunitários criados desde 2006. Eles são os únicos que empregam trabalhadores, qualificados ou não, e selecionam os beneficiários do programa. O contrato de “substituição das favelas por moradias dignas” estipula em que lugar e de acordo com quais padrões a nova casa deve ser construída. Cada trabalhador é pago no final do projeto, na forma de um cheque emitido por um banco nacionalizado, já que os pagamentos em espécie geraram malversações de fundos no passado. Além disso, medidas são tomadas para evitar que as casas sejam revendidas de forma especulativa. “Estamos em um processo de aprendizagem no qual os erros antes cometidos por falta de controle são corrigidos progressivamente”, explica Leandro Rodríguez, da Comissão de Participação Cidadã do Congresso Nacional.
Chávez escolheu oportunamente a data de 1o de maio, em pleno coração da campanha eleitoral, para aprovar o novo Código do Trabalho, última grande iniciativa de seu mandato. Os progressos que ele traz não são nada cosméticos: a redução do tempo de trabalho para quarenta horas por semana (contra 44 anteriormente), a proibição da terceirização em benefício da estabilidade de emprego e a extensão da licença-maternidade para 26 semanas (contra 18 anteriormente). O texto também restaura o antigo sistema de indenizações de licença, abolido em 1997 pelo governo liberal da época. A partir de agora, o trabalhador demitido receberá um bônus igual ao valor de seu salário mensal multiplicado pelo número de anos na empresa – uma reivindicação antiga dos sindicatos venezuelanos. Capriles protestou contra a nova lei, argumentando que isso não resolve o problema do desemprego ou da situação dos trabalhadores sem contrato de trabalho, privados da proteção social. Em seguida, explicou a natureza da queixa: “Chávez tirou da cartola essa lei para ajudá-lo a ganhar em 7 de outubro”.
 Reaproximação com os Estados Unidos
O resultado da eleição terá um grande impacto sobre todo o continente sul-americano. Capriles já prometeu restabelecer relações amistosas com os Estados Unidos, enquanto outros membros da oposição anunciavam uma revisão completa dos programas de ajuda e de cooperação firmados entre a Venezuela e alguns de seus vizinhos. Um acordo desse tipo também está previsto com a China, que forneceria empréstimos baratos em troca de petróleo. Finalmente, durante a visita do presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad a Caracas, em junho, Capriles não deixou de denunciar a aliança incomum com Teerã, exigindo que o governo “se preocupe em vez disso com os interesses da Venezuela, criando empregos para os venezuelanos”.
O ativismo pan-americano de Chávez resultou na criação de vários organismos supranacionais: a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) – presidida por seu homem de confiança, Alí Rodríguez Araque –, a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac), fundada em Caracas, em dezembro, e, finalmente, a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América – Tratado de Comércio dos Povos (Alba-TCP), que inclui, entre outros, Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua.4 Em junho, por iniciativa de Chávez, o bloco latino-americano condenou vivamente a deposição ilegal do presidente do Paraguai – de esquerda – Fernando Lugo, apontando a inércia dos Estados Unidos e do organismo por eles controlado, a Organização dos Estados Americanos (OEA). A resposta imediata do presidente venezuelano (convocação de seu embaixador no Paraguai, suspensão do fornecimento de petróleo) lhe valeu, mais uma vez, reclamações de Capriles.
 Diante da perspectiva de uma alternância em Caracas, uma impaciência febril tomou conta de Washington. Para a Casa Branca e a classe política norte-americana em sua grande maioria, Chávez continua sendo o inimigo público número um nessa parte do mundo. Três semanas antes de deixar a presidência do Banco Mundial, em junho, Robert Zoellick, resumiu a esperança geral: “Chávez está com os dias contados”. E alegremente previu que, privados da ajuda venezuelana, países como Cuba e Nicarágua em breve enfrentariam “tempos difíceis”. Esse cenário de sonho, acrescenta Zoellick, forneceria “uma oportunidade para transformar o hemisfério ocidental no primeiro hemisfério democrático”, em oposição ao “santuário de golpes de Estado, caudilhos e cocaína” que, segundo ele, o pesadelo bolivariano encarna. No início de 2012, o ensaísta Michael Penfold alertou na revista Foreign Affairs: “Se Chávez vencer em outubro, grande parte da oposição política venezuelana será esmagada. De muitas maneiras, isso será um retorno à estaca zero”.5
Mesmo entre os especialistas em América Latina, as comparações entre o presidente venezuelano e seus colegas de mesma sensibilidade raramente ficam a favor dele. Em um livro dedicado ao impulso dos movimentos de esquerda na América do Sul, os pesquisadores Maxwell Cameron e Kenneth Sharpe retratam Chávez com os traços de um déspota fervorosamente empenhado em “desmantelar as instituições políticas do Estado” e “criar um partido oficial servil”, enquanto o presidente boliviano Evo Morales simbolizaria um “movimento político em que a função do dirigente não consiste em monopolizar o poder”.6
Apenas um punhado de intelectuais acredita que Chávez fez melhor do que seus iguais na Bolívia, no Equador ou em outros lugares. Jeffrey Webber, um universitário engajado e coautor de outro livro sobre as esquerdas sul-americanas, chama Morales de “neoliberal reconstituído”, mas aplaude Chávez por ter “revivido a crítica ao neoliberalismo e recolocado na ordem do dia o debate sobre o socialismo”.7 Não é sem razão que os políticos e observadores de todos os matizes tendem a dar um tratamento especial ao regime venezuelano. Expropriações de grande amplitude, reformas para inverter a ordem liberal das coisas, redistribuição das receitas do petróleo, programas de cooperação para beneficiar países vizinhos mais pobres: poucos governos no mundo podem se orgulhar de ter impulsionado reformas tão audaciosas – ou também espoliadoras, dependendo do ponto de vista.
 “Cinturão de esquerda” no continente
Uma nova vitória de Chávez em outubro poderia acelerar a dinâmica de transformação social em curso na Venezuela. Seu programa “Para uma administração bolivariana e socialista 2013-2019” defende a intervenção mais maciça do Estado nas áreas de comércio e transporte, por meio de “centros locais de distribuição para a venda direta de produtos”, que eliminaria intermediários e tornaria obsoleto o modelo de varejo dominante fora dali.
Outro objetivo: a extensão dos poderes democráticos exercidos pelos conselhos comunitários. Centenas de “comunas em construção” em todo o país, cada uma agrupando uma dúzia ou mais de conselhos, garantiriam serviços de utilidade pública, como a distribuição de gás ou de água. No total, as novas comunas representariam 68% da população. Elas disporiam das mesmas prerrogativas que o Estado e as prefeituras, sobretudo na elaboração dos orçamentos, no planejamento e na arrecadação dos impostos.
Em um nível mais amplo, a reeleição de Chávez consolidaria o “cinturão de esquerda” que atravessa a América Latina e restringiria assim a esfera de influência dos Estados Unidos. A ascensão das esquerdas na América do Sul nos últimos anos tem favorecido os processos de unificação no continente. Se a direita venceu a eleição no Chile, em 2009, ela não esperou muito tempo para que entrasse em colapso a popularidade do presidente Sebastián Piñera. No ano seguinte, a vitória na Colômbia do centrista Juan Manuel Santos augurava uma desventura semelhante, mas o novo presidente logo se juntou ao objetivo da união latino-americana defendido pela esquerda, chegando a se dar ao luxo de erguer o tom contra Washington em várias questões-chave.8 Apenas o Paraguai, depois da deposição do presidente Lugo, marcha atualmente na contramão de seus vizinhos.
Mas ainda é na Venezuela que a eleição de outubro assume seu significado mais decisivo. A derrota de Chávez resultaria – apesar do que diz seu rival – em levar o país para a situação de antes de 1998. Um novo mandato daria a seu reinado dezoito anos de idade; é muito, talvez demais. A transformação social de um país durante um período tão longo, sob a liderança de um chefe de Estado eleito democraticamente, representaria, no entanto, uma experiência sem equivalente na história.
Steve Ellner
Professor de História da Universidade de Oriente (Venezuela) e autor de Rethinking Venezuelen politics Class, conflict amd the Chávez phenomenon, Lynne Riemmer. Boulder (Colorado), 2008.


Ilustração: Benett
1 Keane Bhatt, “Our man in Caracas: the U.S. media and Henrique Capriles” [Nosso homem em Caracas: a mídia dos Estados Unidos e Henrique Capriles], Nacla, 18 jun. 2012. Disponível em: www.nacla.org.
2 Ler Maurice Lemoine, “Caracas em chamas”, Le Monde Diplomatique Brasil, ago. 2010.
3 VenEconomía, Caracas, v.29, n.6, mar. 2012, p.2.
4 Steve Ellner, “Latin American unity takes center stage at Cartagena summit” [Unidade latino-americana toma o lugar central na Cúpula de Cartagena], Nacla, jul.-set. 2012.
5 Michael Penfold, “Capriles Radonski and the new Venezuelan opposition” [Capriles Radonski e a nova oposição venezuelana], Foreign Affairs, 26 jan. 2012. Disponível em: www.foreignaffairs.com.
6 Maxwell Cameron e Kenneth Sharpe, “Andean left turns. Constituent power and constitution making” [Esquerda andina ativa. Poder constituinte e fazer da Constituição]. In: Latin America’s left turns. Politics, policies and trajectories of change [Esquerda latino-americana ativa. Política, políticas e trajetórias de mudança], Lynne Rienner Publishers, Boulder, 2010, p.68 e 74.
7 Jeffery Webber, “Venezuela under Chávez. The prospects and limitations of twenty-first century socialism, 1999-2009” [Venezuela sob Chávez. Perspectivas e limitações do socialismo do século XXI, 1999-2009], Socialist Studies/Études Socialistes, Victoria, 2010; J. Webber, “From left-indigenous insurrection to reconstituted neoliberalism in Bolivia” [Da insurreição de indígenas de esquerda à reconstituição do neoliberalismo na Bolívia]. In: Barry Carr e J. Webber (orgs.), The new Latin American left. Cracks in the empire [A nova esquerda latino-americana. Rachaduras no império], Rowman and Littlefield, Lanham, 2012.
8 Ler “Histoire des gauches au pouvoir” [História das esquerdas no poder], Manière de Voir, n.124, ago-set. 2012.

MENSALÃO FOI COMPRA DE APOIO POLÍTICO, CONFIRMA STF

MENSALÃO FOI COMPRA DE APOIO POLÍTICO, CONFIRMA STF

SUPREMO CONFIRMA A TESE DO MENSALÃO
O Estado de S. Paulo - 02/10/2012
 

Para Celso de Mello, "marginais do poder" formaram uma "quadrilha de assaltantes de cofres públicos"
O STF confirmou ontem a existência de compra e venda de apoio parlamentar e condenou por corrupção passiva todos os deputados que receberam dinheiro do mensalão. A tese do caixa dois de campanha, encampada pelo PT e pelo ex-presidente Lula, foi rechaçada pela maioria dos ministros do STF. Para o decano da Corte, Celso de Mello, "marginais do poder" formaram uma "quadrilha de assaltantes de cofres públicos" que praticaram atos que comprometem a "integralidade dos valores que formam a ideia de República" e frustram "a consolidação das instituições". Foram condenados por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha Pedro Corrêa (PP-PE) e Valdemar Costa Neto (PR-SP). Roberto Jefferson, Bispo Rodrigues, Romeu Queiroz e Pedro Henry (PTB-MT) foram
condenados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. José Borba (PP-PR), por corrupção passiva.

Ao condenar parlamentares que receberam dinheiro, ministros concluíram que houve compra de apoio no Congresso durante o governo Lula
O Supremo Tribunal Federal confirmou ontem a existência de um balcão de compra e venda de apoio parlamentar e condenou por corrupção passiva todos os deputados que receberam dinheiro do mensalão. A tese do caixa 2 de campanha, encampada pelo PT e pelo ex-presidente Lula, foi rechaçada pela maioria dos ministros do STF.
Para o decano da Corte, ministro Celso de Mello, "marginais do poder" formaram uma "quadrilha de assaltantes de cofres públicos" que praticaram atos que comprometem a "integralidade dos valores que formam a ideia de República" e frustram "a consolidação das instituições".
Na sessão de ontem, foram condenados por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha Pedro Corrêa (PP-PE) e Valdemar Costa Neto (PR-SP). O delator do mensalão, Roberto Jefferson, Bispo Rodrigues e Romeu Queiroz e o deputado Pedro Henry (PTB-MT) foram condenados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. E o ex-deputado José Borba (PP-PR), por corrupção passiva.
Ao condenar todos os parlamentares que receberam recursos do mensalão, ministros confirmaram que houve compra de apoio parlamentar no Congresso para aprovar projetos de interesse do governo Lula. "O que houve, a meu ver, considerada a corrupção e que o dinheiro não cai do céu, foi a busca de uma base de sustentação", afirmou o ministro Marco Aurélio Mello. "Essa corrupção não visou a cobrir simplesmente deficiências de caixa dos diversos partidos envolvidos na espécie, mas sim a base de sustentação para aprovarem-se, sofrendo com isso a própria sociedade, determinadas reformas", acrescentou.
O presidente da Corte, ministro Carlos Ayres Britto, afirmou que apelar à versão do caixa dois chegava a ser absurdo. Decano da Corte, Celso de Mello disse que o esquema do mensalão comprometeu a República e pôs em risco a legitimidade das instituições. "Esses atos significam tentativa imoral e ilícita de manipular criminosamente à margem do sistema constitucional o processo democrático."
Rechaçada. A tese de que os recursos serviram para o pagamento de despesas de campanha não contabilizadas foi rechaçada também por Celso de Mello, Gilmar Mendes, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Marco Aurélio. Rosa Weber e Dias Toffoli não chegaram a se manifestar abertamente sobre o destino dos recursos. O revisor, ministro Ricardo Lewandowski, indicou em seu voto concordar com a tese de que o mensalão foi usado para saldar um acordo entre partidos firmado em 2002.
Independentemente de divergências, todos os ministros condenaram os parlamentares que receberam o mensalão. Na sessão de ontem, os ministros precisavam apenas confirmar a condenação de Pedro Henry, decidir se deputados formaram quadrilhas para receber o dinheiro e dissimular sua origem e ainda definiriam a situação de outros réus.
Com a condenação dos réus que receberam os recursos do mensalão, o STF encerra, nesta 30.ª sessão, mais um capítulo. Amanhã, a Corte entra no capítulo mais complexo do processo: decidir sobre quem estava no comando do esquema. Serão julgados os dirigentes petistas José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. / FELIPE RECONDO, EDUARDO BRESCIANI, MARIÂNGELA GALLUCCI e DENISE MADUEÑO

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Desemprego na Eurozona bate recorde e chega a 11,4%, em agosto

Desemprego na Eurozona bate recorde e chega a 11,4%, em agosto

Fila de desempregados em agência do governo no centro de Madri. Foto: ©AFP / Dominique Faget

O desemprego na Eurozona bateu recorde em agosto, chegando a 11,4%, arrastado pela Espanha, onde o índice foi de 25,1%, anunciou a agência oficial de estatísticas Eurostat. Isso representa 18,196 milhões de pessoas. Em julho, 11,3% da força de trabalho da Zona do Euro estavam desempregados.
Depois da Espanha, a Grécia aparece com a segunda maior taxa de desemprego, de 24,4%, segundo os últimos dados disponíveis do país, de junho. Com o agravamento da crise, o índice atual de desemprego na economia grega pode ser ainda maior. Este é o 16º mês consecutivo no qual o desemprego supera 10% da população ativa no bloco, integrado por 17 países. Entre os países da Zona do Euro, a Áustria tem a menor taxa de desemprego (4,5%). Em seguida aparecem Luxemburgo (5,2%), Holanda (5,3%) e Alemanha (5,5%).


Com informações da AFP. Leia mais em AFP Móvil

Energia nuclear em desuso

Energia nuclear em desuso

Autor(es): Heitor Scalambrini Costa
Correio Braziliense - 01/10/2012
 
Setembro de 2012 ficará marcado na história pelos anúncios feitos pelos governos japonês e francês a respeito da decisão de se afastarem da energia nuclear, responsável pelos piores pesadelos da humanidade. Essa tomada de posição tem um significado especial, visto que Japão e França, até então defensores dessa fonte energética, têm em suas matrizes a maior participação mundial da nucleoeletricidade. Depois da histórica decisão do governo alemão de abandonar em definitivo a energia nuclear, agora são esses dois governos que vão rever seus planos para o setor.
O Japão anunciou que abrirá mão da energia nuclear ao longo das próximas três décadas. A decisão, tomada após encontro ministerial (14/9), indica o abandono de tal fonte energética na década de 2030. Essa posição governamental foi tomada após o desastre de Fukushima, que abalou a confiança da população na segurança dos reatores nucleares. O plano japonês apresentado é semelhante ao da Alemanha, primeira nação industrializada que se comprometeu a desligar todos os seus 17 reatores até 2022. Sem dúvida, para o Japão, a tarefa é complexa, visto que 1/3 da eletricidade gerada no país é proveniente dos 50 reatores instalados em seu território.
Ainda sobre a decisão do governo japonês, existem críticas por não ter sido especificado quando exatamente a meta seria alcançada, já que a decisão agora tomada não seria obrigatória para governos futuros. O que significa, em princípio, que uma nova administração poderia reverter os planos. Todavia, analistas afirmam que dificilmente essa mudança de rumo ocorreria pelo alto engajamento e conscientização dos japoneses, demonstrada em recente pesquisa de opinião em que mais de metade da população se diz favorável ao fim do uso da energia nuclear no país.
Também houve críticas sobre o porquê desse calendário ser tão dilatado, já que o país chegou a desligar 48 dos reatores depois do desastre de Fukushima e poderia, com o aumento da participação das fontes renováveis e com ambicioso programa de eficientização energética, atingir a meta num prazo menor. Todavia, mesmo com as ressalvas, a decisão anunciada aponta para um novo rumo na questão energética japonesa e mundial.
Já na França, em conferência realizada em 14 e 15 de setembro sobre questões ambientais, em Paris, o presidente François Hollande, cumprindo promessa de campanha, declarou que está engajado na transição energética, baseada em dois princípios: eficiência e fontes renováveis; e que planeja reduzir a dependência do país da energia nuclear, hoje correspondendo a 75% da matriz energética, para 50% até 2025.
Sem ter metas conclusivas para o abandono definitivo da energia nuclear no seu território, sem dúvida a decisão do governo francês é histórica e extremamente positiva, visto que, até então, discutir a questão nuclear na França era tabu. Para os defensores da tecnologia que sempre mencionavam o Estado francês como referência de experiência exitosa na área nuclear, fica aí uma derrota de grandes proporções. Sem dúvida, a França rever sua posição, mesmo diante das dificuldades, da complexidade do problema e das contradições existentes, é indispensável para um mundo de amanhã sem energia nuclear.
Outro país europeu que após Fukushima já havia rejeitado a energia nuclear em seu território foi à Itália, em junho de 2011. Em referendo popular, cerca de 95% dos eleitores aprovaram uma alteração legal que aboliu o uso dessa fonte energética no país. A Itália, com quatro centrais nucleares construídas na década de 1960 e 1970, e que estavam desligadas desde 1987, havia anunciado pelo governo, em 2008, a intenção de iniciar a construção de novas centrais. Nos planos governamentais, em 2030, 25% da eletricidade consumida no país seria gerada pelo átomo.
Somados a Itália, a Áustria, a Bélgica e a Suíça, que também reviram os planos de instalação de novas usinas, e decidiram se distanciar da energia nuclear, agora a Alemanha, o Japão e a França tomaram decisões semelhantes. Diante desse contexto internacional, fica aqui uma pergunta que não quer calar: por que, então, o governo brasileiro insiste em planejar a construção de usinas nucleares? Com a palavra, as "autoridades energéticas".

Miséria no país caiu só 5,5% em dois anos

Miséria no país caiu só 5,5% em dois anos

Fim da miséria ainda longe
Autor(es): agência o globo:Antonio Gois
O Globo - 01/10/2012
 
O número de miseráveis no Brasil caiu 5,5%, de 2009 a 2011, período que cobre o fim do governo Lula e os primeiros meses do mandato da presidente Dilma Rousseff. Em setembro de 2011, havia no país 8 milhões de pessoas na extrema pobreza, conforme estimativa preliminar informada ao GLOBO pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Os dados foram calculados com base na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2011), do IBGE. É a primeira pesquisa que vem a público sobre a redução da miséria durante o governo Dilma, que assumiu o cargo com a promessa de erradicar a pobreza extrema até o fim de 2014.
Como utiliza dados de setembro de 2011, a estimativa ainda não capta efeitos do Brasil sem Miséria e do Brasil Carinhoso, programas lançados pela presidente. Mas especialistas acreditam que Dilma corre o risco de terminar o mandato sem cumprir sua principal promessa de acabar com a pobreza extrema.
De acordo com o ministério, o número de miseráveis caiu de 8.520.271, em 2009, para 8.054.775, em 2011, uma diminuição de 465 mil pessoas no universo de extremamente pobres, conforme a Pnad. O governo considera miserável quem tem renda mensal familiar de até R$ 70 por pessoa.
Em números absolutos, mantido esse ritmo, seriam necessários oito anos para fazer cair pela metade o total de extremamente pobres no Brasil. Assim, para conseguir uma queda de 50% em três anos, até 2014, o governo precisaria quase que triplicar a velocidade verificada no biênio 2009-2011.
- A possibilidade existe, mas é remota - diz o administrador Ricardo Teixeira, coordenador do curso de Gestão Financeira da Fundação Getulio Vargas.
Rafael Osório, coordenador de Estudos de Previdência, Assistência Social, Desigualdade e Pobreza do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diz que a atual rede de proteção social não basta para acabar com a miséria:
- Estamos no rumo certo. O que já foi feito é muito bom, mas não suficiente. Precisamos de mais, como discutir a expansão do Brasil Carinhoso para a faixa de 7 a 14 anos - diz Osório.
Especialistas admitem que é praticamente impossível zerar a pobreza extrema. Situação semelhante ocorre com a mortalidade infantil, pois todos os países registram mortes de bebês. O governo discute a fixação de um percentual residual de miséria, isto é, um patamar "tolerável" que, uma vez atingido, permitiria ao país dar por erradicada a pobreza extrema.
país antecipou meta da onu
Dilma lançou o Brasil sem Miséria em junho do ano passado. A iniciativa ampliou o Bolsa Família, carro-chefe da política social, com o acréscimo de 1,3 milhão de beneficiados na faixa de 0 a 14 anos. O pagamento extra, porém, só começou em setembro, e o MDS avalia que pode não ter sido captado pela Pnad.
Em maio de 2012, o Brasil Carinhoso turbinou novamente o Bolsa Família, aumentando o valor dos repasses em 2 milhões de lares onde havia crianças de até 6 anos. Conforme o GLOBO revelou em junho, o Brasil Carinhoso elevou o teto do Bolsa Família para R$ 1.332, valor pago mensalmente a uma família de 19 pessoas. Em média, os repasses são de R$ 149,88.
Segundo o ministério, o orçamento do Bolsa Família é de R$ 20 bilhões, em 2012, o equivalente a 0,45% do PIB (Produto Interno Bruto, soma dos bens e serviços produzidos no país, num ano). O programa atende a 13,7 milhões de famílias ou cerca de 55 milhões de pessoas.
A Pnad é uma pesquisa por amostragem realizada anualmente. Só não ocorre uma vez por década, quando o IBGE faz o censo, com entrevistas em quase todos os domicílios do país. Os resultados do censo tendem a ser mais confiáveis, enquanto o ponto forte da Pnad são as comparações de um ano para outro ou num período mais curto do que uma década.
O censo de 2010 indicou a existência de 16,2 milhões de miseráveis ou 8,5% da população, o dobro do indicado pela Pnad. Mas, de acordo com Osório, do Ipea, não é possível comparar dados do censo e da Pnad, já que as metodologias são distintas. A Pnad indica tendências e variações ano a ano. Foi com base na Pnad de 2008 que o governo Lula anunciou que conseguiu antecipar a meta de um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, da ONU, que previa a redução pela metade, até 2015, dos índices de miséria de 1990. E será com base na Pnad que Dilma saberá se cumpriu ou não a promessa de erradicar a miséria até 2014.

CIÊNCIA MAIS PERTO DA VACINA CONTRA A AIDS

CIÊNCIA MAIS PERTO DA VACINA CONTRA A AIDS

NOVA ESTRATÉGIA CONTRA O HIV
Correio Braziliense - 01/10/2012
 
Pesquisa feita em parceria com brasileiros aponta caminho promissor no combate à Aids. Cobaias se tornaram resistentes à versão da doença que afeta macacos ao receber composto que estimula a produção de células de defesa
Roberta Machado
O sucesso de um estudo internacional realizado em parceria com o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) pode apontar novos caminhos para a produção de uma vacina contra o HIV. A pesquisa, divulgada ontem pelo site da revista científica Nature, se inspirou nas pessoas que têm uma resistência natural à Aids e fez com que cobaias se tornassem resistentes à ação do SIV, vírus que causa nos macacos uma doença muito semelhante à síndrome que afeta os humanos.
Quando o vírus da Aids infecta um organismo, ele precisa entrar no DNA dos linfócitos para se reproduzir. Depois de se multiplicar lá dentro, ele rompe a estrutura e busca outras dessas células de defesa do corpo para invadir e destruir. O processo prejudica a imunidade do paciente e o deixa suscetível a uma série de doenças. No entanto, algumas pessoas produzem uma versão particularmente eficiente de uma célula de defesa chamada T CD8. Ela identifica os linfócitos invadidos pelo vírus e os destrói, impedindo que o HIV se liberte e se espalhe pelo sangue.
Para comprovar a eficiência dessa célula, os pesquisadores deram a macacos rhesus um composto que induziu a produção dessas células de defesa especiais. As cobaias receberam uma vacina de febre amarela alterada com três fragmentos do vírus que causam a multiplicação das T CD8. Depois, os animais foram infectados com o vírus da imunodeficiência símia, o SIV. Graças às células de defesa geradas pela vacina, o vírus não se multiplicou no organismo dos macacos, que se mantiveram saudáveis apesar da infecção.
"A produção de células T CD8 foi aumentada mediante o uso dos compostos, o que resultou em maior controle da carga viral do SIV", resume Myrna Bonaldo, chefe do Laboratório Molecular de Flavivírus, do IOC/Fiocruz. Nos macacos vacinados, o vírus foi encontrado em uma concentração até mil vezes menor do que nas cobaias que não receberam o composto e também foram infectadas. "Nosso trabalho mostra claramente que somente esse tipo de resposta das células T CD8 poderia ser suficiente para o controle do vírus, impedindo a progressão da doença", assegura a pesquisadora, que participou do estudo.
Controle
Um segundo grupo de macacos usados no experimento também recebeu uma vacina com antígenos do SIV, mas esse composto não tinha os fragmentos específicos do vírus que estimulam as células protetoras. Sem o aumento das T CD8, essas cobaias não foram capazes de controlar a doença. "Descobrirmos na primeira fase do experimento que há três pequenos reagentes do vírus que são alvos para essas células. Agora, estamos tentando descobrir qual deles é mais importante. Assim que soubermos isso, poderemos usar essa informação para desenvolver uma vacina maior", esclarece o principal autor do estudo, David Watkins, da Universidade de Miami.
Como nem todas as pessoas têm o genótipo ideal para a produção da célula T CD8, o objetivo do pesquisador é entender que tipo de armas ela usa para interromper a replicação do vírus e, assim, tentar usá-la isoladamente para todos os tipos genéticos. Outro problema é que a abordagem desse experimento evita os sintomas da doença, mas não a infecção. "Com o tipo de vacina que estamos fazendo, as pessoas seriam infectadas, mas controlariam o vírus. Talvez possamos usar isso para fazer outra vacina, que libere os anticorpos e tenha resultados melhores", estima Watkins. "Temos de ser muito cuidadosos em dizer que estamos perto de uma vacina para o HIV, mas esses resultados podem ajudar projetos melhores", salienta.
As células T CD8 existem no corpo de todas as pessoas, mas a maioria não conta com versões fortes o bastante, ou em quantidade suficiente, para frear o HIV. "Normalmente, quando se contrai o vírus, a imunidade vai caindo devagar e, em um dado momento, a pessoa sofre com doenças que vêm com a baixa imunidade, como a toxoplasmose", ensina Simone Tenore, infectologista do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids de São Paulo, que não participou da pesquisa.
Apenas uma em cada 300 pessoas infectadas pelo vírus consegue produzir a célula ideal e não tem o sistema imunológico afetado pela Aids. Diferentemente dos soropositivos comuns, indivíduos assim, chamados de "controladores de elite", passam anos convivendo em harmonia com o vírus. O experimento da Fiocruz conseguiu transformar as cobaias em animais com essa mesma capacidade. "Também acredito que a chave para o combate ao HIV está mesmo no sistema imunológico e não no vírus. Vemos há muito tempo que o vírus é capaz de criar resistência ao medicamento rapidamente, por isso acho que combatê-lo diretamente não é mais eficaz", compara a especialista.